O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) estuda enviar à Assembleia Legislativa uma série de medidas para mudar a administração do estado, após 30 anos de gestões do PSDB. A ideia é aproveitar o início da legislatura para tentar aprovar iniciativas como a criação de uma MP (medida provisória) estadual –algo que já enfrenta resistência entre os deputados.
Como mostrou o Painel, o governo pretende enviar para a Alesp uma PEC (proposta de emenda à Constituição) criando um equivalente estadual das medidas provisórias, inclusive com os mesmos prazos da MP nacional.
A medida provisória federal, que vale por 120 dias e perde a eficácia se não for aprovada pelo Congresso nesse período, depende apenas da caneta do Executivo –ao contrário dos projetos de lei, que seguem um rito de tramitação mais demorado.
Outra PEC que o Palácio dos Bandeirantes quer aprovar na Assembleia é uma mudança no percentual mínimo que a Constituição do estado define para gastos com educação (30% da receita) e saúde (12,5%).
O governo argumenta que as despesas com a educação no estado não chegam a exceder 25% da receita, que é o piso definido pela Constituição Federal –mas que há a obrigação de gastar 30%.
Em compensação, os gastos com saúde são crescentes. Por isso, Tarcísio quer propor aos deputados que o mínimo com educação seja de 25%, como nos demais estados, e que os 5% excedentes sejam destinados à saúde.
Como mostrou a Folha, governos tucanos faziam uma manobra para cumprir os 30% da educação, incluindo até o pagamento de servidores aposentados nessa conta.
As duas medidas, a criação de MPs e a mudança nos gastos obrigatórios com saúde e educação, necessitam do apoio de três quintos dos deputados –57 de 94— e devem representar um teste para Tarcísio na Assembleia.
Hoje os partidos da base de Tarcísio somam 53 deputados, há 26 no bloco de oposição e outros 15 cujos partidos se declaram independentes, mas que tendem a votar a favor do governo.
A nova legislatura da Assembleia teve início no último dia 15, com a posse de 55 deputados reeleitos e 39 que não tinham mandato. O novo presidente da Assembleia, André do Prado (PL), é aliado de Tarcísio, o que deve facilitar a aprovação das matérias importantes para o governo.
Nos corredores da Assembleia, porém, há resistência às medidas do governo, mesmo por parte da base. A criação de uma medida provisória estadual, por exemplo, é vista como uma forma de ampliar o poder do Executivo em detrimento do Legislativo.
Aliados do governador, por sua vez, afirmam que a medida provisória é um instituto saudável e que dá plenos poderes ao Parlamento, que pode não aprová-las.
A proposta surgiu a partir da avaliação do governo de que era necessário um instrumento legislativo mais ágil para lidar com a tragédia da chuva em São Sebastião (SP). A gestão de Tarcísio gostaria de ter a medida provisória à mão para conseguir ampliar rapidamente o gasto direcionado à Defesa Civil ou contratar serviços emergenciais, por exemplo.
Auxiliares de Tarcísio argumentam ainda que a MP é uma ferramenta necessária para redesenhar o Executivo, ou seja, criar e extinguir secretarias, após a posse de um novo governador, o que costuma acontecer no âmbito federal.
Por enquanto, o governo não definiu quais medidas provisórias seriam editadas caso a PEC seja aprovada na Alesp. A intenção é usá-las para temas de relevância e urgentes, como desastres climáticos.
Tarcísio tampouco indicou aos deputados estaduais qual deve ser seu primeiro projeto a ser enviado para votação na Casa. Na reunião entre o presidente André do Prado e os líderes dos partidos, nesta terça-feira (21), os líderes do governo ainda não apresentaram as propostas prioritárias.
As duas PECs em gestação no Palácio dos Bandeirantes fazem parte de um conjunto de projetos de Tarcísio no sentido de reestruturar o Executivo. Aliados do governador dizem haver cobrança por uma gestão mais eficiente e que realize entregas.
Embora o governador e seus secretários evitem falar em planos eleitorais, nos bastidores há o entendimento de que Tarcísio deve concorrer à reeleição em 2026, embora seu nome ainda não seja descartado como um presidenciável da direita.
No pacote, também está prevista uma reforma administrativa, que também precisaria passar pelo crivo da Assembleia, mas com maioria simples. O governo argumenta que é possível acabar com parte dos cargos e mudar as hierarquias para que haja uma economia de gastos.
Segundo noticiou o Painel, a reforma administrativa mira sobretudo os servidores comissionados. O governo identificou a existência de cerca de cem diferentes níveis hierárquicos na máquina estadual, o que levaria a uma série de distorções. A intenção é reduzir drasticamente essa quantidade de rubricas administrativas.
Nessa mesma seara, mas considerando os servidores de carreira, a equipe de Tarcísio prevê um novo Estatuto do Servidor Público, já que o atual é de 1968.
Para o deputado Luiz Claudio Marcolino (PT), as medidas estudadas pelo governo Tarcísio "tiram o espaço de construção de diálogo do Legislativo" e são temas polêmicos, que "exigem muito debate e muita discussão".
"É o governo estadual tentando interferir na dinâmica do Legislativo", afirma a respeito da proposta das medidas provisórias.
"Nesta terça, no colégio de líderes, discutimos que queremos um Legislativo forte, com votação de projetos de deputados e derrubada de vetos. O que o governador propõe vai na contramão", resume.
A questão do gasto com educação e a reforma do estatuto dos servidores são temas caros ao PT, que questiona a necessidade de uma nova reforma administrativa (houve uma lei aprovada nesse sentido em 2020) e vê brecha para que direitos do funcionalismo público sejam suprimidos.
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