terça-feira, 14 de janeiro de 2025

“500 Dias Com Ela” teoriza sobre a rotina desesperada que envolve duas pessoas em um relacionamento 09/11/2009Marcelo Costa Scream & Yell

 Alain de Botton nasceu em Zurique, na Suíça, mas se naturalizou britânico. Em 1993, aos 24 anos, lançou seu primeiro romance, “Ensaios de Amor”, um livro que narra o círculo vicioso dos relacionamentos, de como as pessoas se apaixonam e depois se desiludem. No livro, um homem conhece uma mulher em um vôo entre Paris e Londres e se apaixona por ela em algum momento entre o controle de passaportes e a alfândega. Tudo o que acontece em seguida, se você não quiser ler “Ensaios de Amor”, pode ver nos cinemas com bastante propriedade: “500 Dias Com Ela” (“500 Days of Summer”).

“500 Dias Com Ela”, longa de estréia do experiente diretor de videoclipes Mark Webb (Santana, Green Day, Snow Patrol, Evanescence e Lenny Kravitz), não é uma adaptação do livro de Botton, mas soa exatamente como se fosse. E méritos e créditos à parte, pouco importa: “500 Dias Com Ela” é o filme indie de 2009 e um dos grandes filmes do gênero na década. No cartaz vemos a seguinte frase: “Está não é uma história de amor. É uma história sobre o amor”. Já o narrador em off, após apresentar os dois personagens principais desta fábula dos novos tempos, faz questão de avisar: “Esta é a história do garoto que conhece a garota. Mas você deve saber que não é uma comédia romântica”.

O garoto se chama Tom. Ele se formou em arquitetura, mas ganha a vida escrevendo textos de cartões de felicitações. Ele cresceu acreditando que nunca seria uma pessoa realmente feliz, e a culpa, segundo o narrador, “vem de uma exposição precoce à triste música pop britânica, e à má compreensão do filme ‘A Primeira Noite de um Homem’”. Você já deve ter lido isso antes mais ou menos dessa forma: “Eu sou triste porque ouço música pop ou ouço música pop porque estou triste?”.

No caso de Tom, ele veste camisetas do Joy Division e ouve desesperadamente Smiths, Clash e Pixies, mas podemos deixar isso em segundo plano, ao menos agora, pois Tom acaba de se apaixonar. O nome dela é Summer, uma garota que começou a trabalhar no mesmo lugar que ele. Porém, em se tratando de histórias sobre o amor, Summer ficou traumatizada com a separação de seus pais, e desde então só consegue amar duas coisas na vida: a primeira era seu longo cabelo escuro. A segunda era a facilidade para cortá-lo, sem sentir nada. Ela não acredita no amor assim como em Papai Noel.

Tom se apaixonou por Summer à primeira vista, e ela, bem, ela conseguiu perceber que o som que saiu dos fones de ouvido dele era uma canção familiar. Ela até canta um pedaço para ele, os dois lado a lado no elevador: “To die by your side is such a heavenly way to die”. Um cara chamado Bill Callahan, de uma banda chamada Smog, certa vez prescreveu uma receita para saber se um relacionamento tem futuro logo no primeiro encontro: “Coloque Smiths para tocar. Se ela ficar, será sua. Se ela for embora, não era pra ser mesmo”.

O que acontece a partir do momento em que Summer beija Tom é algo que, no Simpósio de Platão, Aristófanes defende como a “cara metade” (e Fábio Jr, como “as metades da laranja”). Para Aristófanes, os seres humanos eram hermafroditas tão poderosos e arrogantes que Zeus foi forçado a cortá-los em dois, numa metade masculina e numa metade feminina. E desde esse dia cada um deseja se reunir à metade da qual foi separado. Tom acredita sinceramente que Summer seja a sua metade. Já Summer acredita que os relacionamentos são confusos e que as pessoas sempre acabam ferindo umas as outras.”Ela é homem”, crava um amigo comum dos dois.

“500 Dias Com Ela”, assim como o livro “Ensaios de Amor”, é uma bela teorização sobre a rotina desesperada que envolve duas pessoas em um relacionamento. Se você prestar atenção com cuidado conseguirá perceber o momento exato em que as coisas começaram a dar errado. Na vida de Summer e Tom assim como em alguma de suas histórias de amor. No livro, é quando ela deixa de comprar o cereal para ele, um ato tão imperceptível, mas alguém já escreveu que a verdade reina nas pequenas coisas. No filme, ela vira Sid Vicious e ele Nancy Spungen. Não tem jeito: sabemos quando nos apaixonamos (embora tentemos disfarçar) assim como quando tudo está indo para o buraco (embota tentemos adiar).

Voltando ao segundo plano, para uma comédia não romântica indie, a trilha sonora é um deleite pop: Regina Spektor, Smiths, Pixies, Doves, Belle and Sebastian, Carla Bruni, Feist, Black Lips, Wolfmother, The Clash e Spoon são a trilha, além claro de She & Him, banda fofa da atriz mais fofa ainda Zooey Deschanel, que interpreta Summer de forma contida e perfeita. Joseph Gordon-Levitt dá vida a Tom, e está ótimo no papel, embora exagere nos traquejos em algumas passagens. E Alain de Botton também participa do filme tendo seu livro “A Arquitetura da Felicidade” (2006) emoldurando duas ou três cenas.

Tanto Alain Botton quanto Mark Webb destrincham o movimento romântico buscando mostrar a rotina que marca os relacionamentos no exato momento em que uma pessoa entra neles. Há, claro, uma pequena parcela que faz valer o “felizes para sempre”, porém a grande maioria (ainda mais em um mundo povoado por jovens emos que passam a vida cantando canções de pé na bunda) ainda está procurando algo que não conseguiu encontrar. Botton e Webb acertam no tom de tragicidade realista e fatalista de suas obras, embora façam questão de deixar claro que o mundo não acaba quando um relacionamento acaba: após o verão, vem o outono. A vida segue. Acredite, mas veja o filme.

Cartunista se demite após Washington Post recusar sátira sobre Jeff Bezos, FSP

 A cartunista Ann Telnaes, do The Washington Post, se demitiu na última sexta (3) após o jornal americano não publicar uma charge sua em que retratava Jeff Bezos, dono do veículo e fundador da Amazon, ajoelhando-se e oferecendo um saco de dinheiro ao presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.

Homens ricos seguram sacos de dinheiro para Donald Trump
Charge da cartunista Ann Telnaes, rejeitada pelo The Washington Post - Ann Telnaes/Arquivo pessoal

Em um post na plataforma Substack, Telnaes afirmou que durante os anos de trabalho no Post sempre recebeu comentários sobre divergências a respeito de cartuns, mas nunca teve um desenho rejeitado por causa de quem escolheu como alvo. "Até agora", disse a cartunista, que já venceu o Pulitzer de charge editorial em 2001.

"Houve casos em que esboços foram recusados ou revisões solicitadas, mas nunca por causa do ponto de vista inerente ao comentário do cartum. Isso muda o jogo. É perigoso para uma imprensa livre", declarou.

Na charge negada, além de Bezos, estão retratados o fundador da Meta, Mark Zuckerberg; Sam Altman, diretor-executivo da OpenAI; Patrick Soon-Shiong, dono do The Los Angeles Times; e Mickey, o mascote da Disney, controladora da ABC News.

Segundo Telnaes, o desenho era uma crítica aos executivos bilionários de tecnologia e mídia que têm feito o possível para conquistar a simpatia de Trump.

Durante a corrida eleitoral americana, o Washington Post chegou a escrever um editorial apoiando a candidatura da democrata Kamala Harris, mas Bezos barrou a publicação e decidiu que não haveria manifestação de endosso.

Decisão similar teve o LA Times, de Soon-Shiong. Ele afirmou à época que a decisão era a menos polarizada em "meio a uma eleição tumultuosa".

Em nota ao The New York Times, David Shipley, editor de opinião do Post, disse que respeitava Telnaes, mas discordava da sua interpretação dos fatos.

"Nem todo julgamento editorial é um reflexo de uma força maligna", disse Shipley no comunicado. "Minha decisão foi guiada pelo fato de que acabávamos de publicar uma coluna sobre o mesmo tema do cartum e já tínhamos programado outra coluna —esta uma sátira— para publicação. O único viés foi contra a repetição."

Contra a sensação de impunidade, editorial OESP

 

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Alvo de críticas do governador Tarcísio de Freitas, os casos de abuso policial parecem ainda não ter sensibilizado na mesma medida o sistema de Justiça paulista. Ao menos é isso que se pode inferir de dados sobre denúncias e condenações de agentes de segurança envolvidos em ações suspeitas.

Reportagem do Estadão mostrou que até o dia 10 de dezembro de 2024 apenas 120 denúncias contra policiais militares (PMs) foram oferecidas pelo Ministério Público (MP), de um total de 2.308 inquéritos. Significa dizer que somente 1 a cada 19 casos de condutas questionáveis chegou à Justiça. E, quando vai à análise de um juiz, a violência policial tem índice de 2% de condenação, segundo pesquisa de mestrado da advogada Debora Nachmanowicz apresentada à USP.

De acordo com especialistas em segurança pública ouvidos pela reportagem, estão por trás desses números a má qualidade das investigações – não raro com provas apresentadas apenas pelos PMs –, a dificuldade de obtenção de evidências e de coleta de depoimentos de testemunhas e um controle externo insuficiente da atividade policial pelo MP.

E tudo isso vem à luz justamente em meio a reações da sociedade e do governo estadual à escalada da letalidade policial e a uma série de ações truculentas flagradas em vídeo. São cenas como a de um policial que arremessa um motociclista de uma ponte e a de jovem estudante de medicina desarmado morto à queima-roupa após desferir um tapa contra o retrovisor de uma viatura – neste caso, dois PMs foram denunciados por homicídio.

Tarcísio ajustou o discurso, admitiu que errou ao criticar as câmeras corporais, disse que abusos não serão tolerados e aventou a necessidade até de revisão dos protocolos da PM. É um recado contra os malfeitos daqueles que são pagos para proteger os cidadãos, mas insuficiente enquanto mantiver um ex-agente da Rota entusiasta da violência policial como Guilherme Derrite no cargo de secretário de Segurança Pública.

Mas não cabe cobrar apenas o governador. O MP e a Justiça também devem fazer sua parte, a começar com a demonstração de total repúdio à violência policial. O MP precisa se mostrar mais atuante, enquanto a Justiça deve agir com rigor no cumprimento de suas funções. E absolvições sumárias sob o argumento da legítima defesa, como no caso dos primeiros PMs denunciados por suspeita de excessos na Operação Escudo, no início do segundo semestre de 2024, que deixou rastro de sangue na Baixada Santista, não parecem um bom sinal.

Nesse contexto, não à toa a Defensoria Pública tem se mostrado bastante atuante. É desse órgão uma série de questionamentos feitos ao Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o uso de câmeras corporais por PMs paulistas.

Assim como o chefe do Executivo envia uma mensagem dura de rejeição às más condutas dos poucos e maus policiais da corporação, também se espera mais protagonismo e, sobretudo, mais ação enérgica das demais instituições de Estado. Caso contrário, a sensação de impunidade alimentará um círculo vicioso de violência no qual as instituições não fazem seu trabalho a contento e em que os inocentes sempre serão as maiores vítimas.