terça-feira, 14 de janeiro de 2025

São Paulo não está na direção certa, senhor governador! ,FSP

 Professora Bebel

Deputada estadual (PT-SP), segunda presidenta da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo)

Paulo Fiorilo

Deputado estadual, líder da federação PT, PC do B e PV na Assembleia Legislativa de São Paulo

No artigo-propaganda denominado "São Paulo avança na direção certa", publicado nesta Folha, o governador Tarcísio de Freitas apresenta uma visão fantástica de seu governo, recheada de autoelogios e desvinculada da realidade. A suposta "direção certa" esconde uma gestão marcada por retrocessos na educação e na segurança e pelo uso indevido do aparelho estatal para beneficiar apadrinhados políticos.

Indague-se: qual é o projeto do governador Tarcísio de Freitas para São Paulo?

Na educação, Tarcísio demonstra total falta de compromisso com a rede pública. Entre as propostas de seu plano de governo, passados dois anos, a recomposição e o aumento da aprendizagem não se concretizaram. São Paulo, o estado mais rico do país, viu seu desempenho educacional cair para níveis anteriores à pandemia, enquanto a média nacional subiu. Esse retrocesso reflete escolhas equivocadas, como o uso excessivo de plataformas digitais, que desconectou alunos e professores, e o veto ao projeto que visava contratar psicólogos e assistentes sociais para escolas, contradizendo suas promessas de apoio à saúde emocional da comunidade escolar.

Além disso, o governador extinguiu programa de transferência de renda que combatia a evasão escolar e priorizou escolas cívico-militares, uma bandeira ideológica sem comprovação de eficácia, que agrada sua base bolsonarista mas ignora soluções estruturais para os desafios da educação.

Não fosse o Pé-de-Meia, programa do governo Lula, os estudantes estariam à deriva. Na contramão da melhoria da educação, Tarcísio destruiu uma conquista histórica do estado ao aprovar uma emenda constitucional que corta R$ 11 bilhões anuais da área, condenando a rede estadual a problemas crônicos, como escolas precárias, falta de equipamentos e professores desvalorizados.

escola pública
Escola estadual no parque D. Pedro 2° ainda deteriorada mesmo após reforma realizada em 2019 - Douglas Nascimento - 23.mai.24/Folhapress

Na segurança pública, a situação é ainda mais alarmante. Tarcísio não apenas retrocedeu como institucionalizou uma política de truculência e autoritarismo.

Entre janeiro e novembro de 2024, 702 pessoas foram mortas por policiais, um aumento de 98% em relação ao mesmo período de 2022, último ano da gestão anterior. Essa tragédia não é resultado de ações isoladas, mas de um modelo que legitima abusos. Enquanto o crime organizado expande sua atuação, o governo mantém uma retórica vazia de "cancelar CPF", que nada resolve, mas amplia o medo e o distanciamento entre polícia e população.

Guilherme Derrite, secretário de Segurança, intensificou a politização da tropa, afastando críticos e promovendo aliados, ao mesmo tempo em que enfraqueceu controles essenciais, como o uso de câmeras corporais. Não fossem as correções de rumo propostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na obrigatoriedade de uso das câmeras corporais e o decreto federal, assinado pelo presidente Lula, que estabelece diretrizes para a atuação dos agentes de segurança, com foco na eficiência nas ações, valorização dos profissionais e respeito aos direitos humanos, a segurança pública de São Paulo continuaria sob risco.

No republicanismo, o cenário é igualmente preocupante. Embora pregue austeridade, Tarcísio destina milhões em "jetons" para conselhos e comitês estaduais, beneficiando aliados políticos, incluindo seu próprio cunhado e figuras controversas, como o coronel Aleksander Toaldo Lacerda, afastado da PM por incitar atos antidemocráticos.

O "rumo certo" a que o governador se refere não é aquele que favorece os trabalhadores, seus filhos e filhas e a população das periferias. É um rumo que beneficia o "ambiente de negócios" e entrega patrimônio público a interesses privados, como ocorreu na privatização da Sabesp. O governador parece mais preocupado em atender a interesses privados do que em oferecer segurança, educação e qualidade de vida à população.

Não é esse o rumo de que São Paulo precisa. É necessário um governo que priorize o povo, que invista em políticas públicas para todos e que enfrente desigualdades com coragem e competência, senhor governador.

Seguiremos atentos.

Claudia Leitte comete crime ao levar Jesus para a folia?, FSP

 A cantora Claudia Leitte deverá se manifestar até o fim do mês sobre a acusação de cometer racismo. Durante uma apresentação em dezembro, ela substituiu o nome "Iemanjá" por "Yeshua" (Jesus) ao cantar "Caranguejo". Houve ofensa? A resposta não é, digamos, "preto no branco".


O cantor Carlinhos Brown, adepto do candomblé, saiu em defesa da artista. "Claudia Leitte não é uma pessoa racista", afirmou, preferindo uma visão sincrética das religiões. "Nós (do candomblé) seguimos os caminhos de Jesus Cristo. Você não entra em um terreiro que não tenha uma imagem do coração sagrado de Jesus."

A cantora Claudia Leitte - Eder Lima/Secretaria Municipal de Cultura de SP/Divulgação

O pastor Alexandre Gonçalves, da Igreja de Deus, bacharel em direito, também não vê crime. "O Ministério Público não pode tutelar a nossa consciência. Ela alterou a letra por ser de outra religião e não se sentir bem em celebrar uma fé que não é a dela", disse. Para ele, trata-se de uma questão de direito autoral, algo entre a cantora e os compositores.

Fã dos gêneros death metal e trash metal, o pastor Alexandre lembra como os satanistas do black metal se sentiram ofendidos pela banda Antidemon, que faz música pesada com letras cristãs. "Deixa o povo cantar como quiser, meninada!", defende.

O preconceito religioso e a censura são temas sensíveis para evangélicos, que frequentemente se sentem perseguidos pelo Judiciário e pelo pensamento progressista. No entanto, muitos preferiram adotar o silêncio nesse caso ou criticar a atitude da cantora, que se apresenta como evangélica.

Um argumento recorrente é que "Caranguejo" não é uma música secular, mas religiosa por ser consagrada à orixá, o que torna a mudança uma provocação ou, no mínimo, insensibilidade da cantora.

A pregadora assembleiana Cremilda Falcão, por exemplo, condenou a mudança na letra. "Se um cantor pegasse uma música gospel e trocasse Jesus por Exu, ninguém ia gostar. Se é uma entidade deles, tem que respeitar."

O pastor Kaká Menezes, da Igreja das Estações, concorda: "Se pegarem uma música famosa do (grupo gospel) Diante do Trono e colocarem um orixá, a galera vai se ofender. Se ela não quer cantar uma música que fala sobre Iemanjá, é só ela não cantar a música."

Outro ponto de crítica, destacado pelo pastor pentecostal Nilson Gomes, é pelo caso ter acontecido em um show de Carnaval. "Muitos se perguntam: se ela se converteu, por que estava no Carnaval?" Ao mesmo tempo, ele se pergunta: "Mas não seria o Carnaval justamente o lugar para se falar de Jesus? E ela não seria a pessoa com prestígio para fazer isso para aquela audiência?"

No fim, esse caso evidencia duas visões de mundo em disputa: de um lado, uma perspectiva sincrética, que vê positivamente a mistura entre tradições religiosas; de outro, uma lógica de separação, em que protestantismo e religiosidade de matriz afro se respeitam, mas a distância.

Mais importante, no entanto, é perceber como a polarização de opiniões, tão destacada na forma como o caso vem sendo noticiado, despreza as nuances das percepções de evangélicos e candomblecistas.

O que a Folha pensa -O bonde da maconha no Brasil, FSP

 O conservadorismo do Congresso Nacional e de parte da população condena o debate a respeito da maconha medicinal ao maniqueísmo ideológico, dificultando acesso ao remédio. Decisão recente do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema representou algum avanço, ainda que persistam dúvidas sobre os seus resultados.

A manifestação do STJ nem sequer trata da Cannabis sativa, mas da Cannabis ruderalis, conhecida como cânhamo, que tem baixo teor do componente psicoativo THC, responsável pelos efeitos alucinógenos A permissão para importar e germinar sementes dessa variedade da planta favorece a produção de canabidiol (CBD) e de fibras para a indústria.

A medida pode contribuir para reduzir preços do CBD, que tem sido prescrito para tratar epilepsia, dor crônica, depressão, esclerose múltipla, autismo, náusea por quimioterapia, doença de Parkinson e insônia.

Não se garante, contudo, que haverá impacto significativo no acesso ao medicamento. Em artigo na Folha, Martim Mattos, empresário do setor, argumenta que a matéria-prima hoje importada no país representa apenas 10% dos custos de produção e que a maior barreira está na escala, vale dizer, na baixa demanda criada pelos médicos ao raramente prescreverem o canabidiol.

No Brasil, órgãos da classe erguem obstáculo à inovação. O Conselho Federal de Medicina, movido mais por preconceito, só chancela a prescrição de CBD para raras epilepsias, como síndromes de Dravet e Lennox-Gastaut.

Já o Judiciário tende a seguir países menos refratários. Foi assim com a tardia decisão do Supremo Tribunal Federal, em junho, que estipulou limite de 40 gramas de maconha para diferenciar usuários de traficantes —invadindo, assim, a seara de Congresso. Este, por sua vez, ameaça com o disparate de incluir a criminalização das drogas na Constituição.

Trata-se de questão de princípio. Dificultar a oferta de medicamentos com benefícios comprovados é descabido.

E mesmo o uso da planta por adultos para fins psicotrópicos sem recomendação médica deveria ser regulamentado com base na liberdade individual. Não é papel do Estado decidir sobre o que cada um faz com o próprio corpo.

De todo modo, produzir estudos científicos sobre aplicações clínicas da cannabis e sobre seu potencial agronômico, como planeja a Embrapa, fornecerá base ainda mais sólida para descarrilar o bonde de preconceitos que ainda atravanca no país os benefícios para a saúde e a economia que a maconha possa trazer.

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