quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Musk é um golpista, mas..., Elio Gaspari, FSP (definitivo)

O bilionário Elon Musk definiu-se em 2020, depois que foi acusado de ter colaborado com um golpe na Bolívia e respondeu, por escrito: "Nós daremos golpes contra quem quisermos. Lidem com isso!"

O dono do X desobedece ordem da Justiça brasileira, debocha do Supremo Tribunal Federal e insulta o ministro Alexandre de Moraes. Faz tudo cobrindo-se na pele de cordeiro de um defensor da liberdade de expressão. Não o é. É um golpista ao estilo dos americanos que derrubavam governos na América Central no início do século 20.

Elon Musk, dono do X, e Alexandre de Moraes, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) - Etienne Laurent e Evaristo Sá/AFP

A liberdade de expressão defendida por Musk é a manutenção na rede de mentiras e difamações. O juiz americano Oliver Wendell Holmes já ensinou que ela não protege quem, falsamente, grita fogo num teatro cheio.

Desde que o X foi tirado do ar, o ministro Alexandre de Moraes tomou uma série de outras medidas. Pode-se discordar de todas e de cada uma, mas elas poderão ser revogadas pelo Judiciário que Musk desrespeita.

Multar em R$ 50 mil um brasileiro que recorre à gambiarra do VPN é um exagero. Bloquear as contas do Starlink, um bendito provedor de internet em regiões remotas, porque pertence ao grupo empresarial de Musk, contaminou o debate. Ex-promotor e ex-secretário de Segurança de São Paulo, Moraes nunca foi juiz, nem precisava sê-lo, mas sua formação valoriza reações impetuosas.

Quem conhece o Supremo acha que, se ele precisasse tomar todas essas providências, poderia fazê-lo aos poucos.

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A cereja desse bolo queimado foi colocada quando anunciou-se que sua decisão seria submetida ao Supremo Tribunal.

Imagine-se uma conversa entre um juiz americano e um brasileiro:
— A decisão foi homologada pelo Supremo Tribunal?
— Foi, por unanimidade.
— Votaram os 11 ministros?
— Não. Só quatro.
— Mas eles não são 11?
— A votação deu-se na Primeira Turma do Tribunal.
— As turmas foram criadas pela Constituição?
— Não.
— E quem decidiu mandar o caso para a Primeira Turma?
— O ministro Alexandre de Moraes.
— Quem a preside?
— O ministro Alexandre de Moraes.

Se for bem educado, o juiz americano muda de assunto, como fazem seus colegas quando os brasileiros explicam que um precatório é uma dívida do governo, reconhecida pelo Judiciário, que não é paga.

Se o litígio fosse levado ao plenário, o mundo não acabaria. Na pior das hipóteses, votariam contra Moraes os ministros Nunes Marques e André Mendonça, nomeados por Bolsonaro. Mesmo que não se queira conhecer a opinião de Nunes Marques, ouvir André Mendonça não é perda de tempo.

A posição de Elon Musk é indefensável por si mesma. A partir do momento em que o ministro Alexandre de Moraes resolveu comandar sua carga da cavalaria ligeira, Musk foi ganhando simpatias.

Primeiro, a do sujeito que por algum motivo precisava recorrer ao VPN. Depois, a do cidadão que só liga o seu trator conectando-se pela Starlink. Finalmente, o litígio atingiu o incauto que esperava uma decisão do Supremo e foi obrigado a conformar-se com a da Primeira Turma.

O Judiciário brasileiro já não vive um de seus melhores momentos. Não precisa piorar.

 

Lula é contrário ao livre discurso, Deirdre Nansen McCloskey, FSP

 Esta é mais uma expressão proverbial em inglês que provavelmente tem um paralelo em português: "Da frigideira para o fogo" [significa algo como "de mal a pior"].

Quando Lula estava enfrentando Bolsonaro, na eleição de 2022, eu disse que ele, Lula, era a melhor opção. Eu estava preocupada na época, e ainda estou, com a ameaça antiliberal da direita no meu país —e, ao que parecia, havia essa ameaça no país de vocês também.

Talvez tenha sido, acidentalmente, uma visão correta se supusermos que num segundo mandato Bolsonaro teria sido ainda pior para a liberdade brasileira. É concebível ter pensado assim. Ele e seus amigos de direita certamente fazem um jogo autoritário.

É claro que a América Latina tem passado recentemente por ameaças parecidas e mais alarmantes vindas da esquerda, que se somam aos antiliberalismos socialistas mais antigos de Cuba, Venezuela e Nicarágua: depois de 2018, rapidamente vimos isso no México, na Bolívia, no Peru, em Honduras, no Chile e, finalmente, na Colômbia.

Devemos admitir que o "fascismo", que significa o oposto direto do liberalismo, se aplica à esquerda também e está sendo implementado diariamente, por exemplo, por um bom amigo de Lula, Nicolás Maduro.

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Eu ingenuamente pensei que Lula, embora um criminoso, fosse, politicamente falando, apenas um social-democrata —um pouco como Kamala Harris aqui nos Estados Unidos— para ser colocado ao lado do fascismo aberto do criminoso Donald Trump e seus teóricos.

Estes encorajam a pura violência política no estilo do 6 de Janeiro nos EUA e do 8 de Janeiro no Brasil.
Eles querem colocar 11 milhões de não cidadãos em campos de concentração. Eles prometem usar o Departamento de Justiça e a nomeação de juízes fascistas para a Suprema Corte para prender seus inimigos políticos.

Mas Lula e seu aliado, o juiz do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, em seus planos e ações antiliberais, estão dando aos fascistas de direita, para usar outra expressão em inglês, "uma corrida pelo seu dinheiro" [algo como "não vender barato"].

O ataque de Alexandre de Moraes ao X —anteriormente conhecido como Twitter— de Elon Musk é vergonhoso. Os outros países que fizeram tais coisas são Rússia, China, Irã, Mianmar, Coreia do Norte, Venezuela, Cuba e Turcomenistão. Você viu aqui um padrão?

Elon Musk não é um homem de opiniões sóbrias. Ele acha que sabe tudo. Em contraste, a humildade caracteriza os verdadeiros liberais. Não sabemos tudo sobre o futuro, por exemplo. Esquerda, direita e centro, todos pensam que sabem e estão muito dispostos a usar a coerção para impor as suas opiniões.
Mas Musk tem uma coisa correta —e liberal.

Liberdade de expressão absoluta.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves