sexta-feira, 12 de julho de 2024

O novo rumo dos ventos e a democracia brasileira, CARLOS MELO, FSP

 

Carlos Melo

Cientista político e professor Sênior Fellow do Insper

Eleições no Reino Unido e na França frustraram mais de uma década de avanço do ultraconservadorismo reacionário europeu. Nos Estados Unidos, favorecido pela fragilidade de Joe Biden, Donald Trump lidera a corrida eleitoral, mas a rejeição ao ex-presidente é tamanha que até Kamala Harris, a pouco popular vice de Biden, o derrotaria, como dizem as pesquisas. Na Índia, com resultados aquém das expectativas, Narendra Modi manteve-se no poder, com significativo sentimento contrário ao primeiro-ministro.

Keir Starmer faz seu primeiro discurso como primeiro-ministro britânico - Li Ying - 10.jul.24/Xinhua

Na América Latina, a comunidade internacional e a sociedade boliviana frustraram a tentativa de golpe militar naquele país. No Brasil, o Datafolha indica que 65% dos eleitores paulistanos rejeitariam candidato apoiado por Jair Bolsonaro –a rejeição ao apoio de Lula é 20 pontos mais baixa.

A ultradireita ainda cresce, contudo distante da hegemonia pretendida. É de suspeitar que o extremismo da última década esteja desacelerando. Cedo para crer em "tendência", mas são sinais que exigem atenção. É eloquente que Ciro Nogueira, ex-ministro de Bolsonaro e de elevado instinto de sobrevivência, tenha alertado para os riscos de definhamento da direita radical brasileira, à qual se uniu.

Para vencer a eleição, o Partido Trabalhista inglês fez inflexões ao centro e a setores médios. Na França, o temor ao extremismo do partido Reunião Nacional forjou mobilização popular, diálogo e estratégias combinadas entre as demais forças políticas. Foi surpreendente a vitória da Nova Frente Popular, consolidada como a maior força. Mas, para poder governar —isolando Marine Le Pen e estabilizando o país—, a fragmentada esquerda terá que se ajustar e juntar forças com os centristas de Emmanuel Macron. São Paulo testará se a mudança na atmosfera política é consistente.

O processo é volátil, mas o mais provável é que a disputa se dê entre bolsonarismo e lulismo. Há pouco espaço para alternativas. Pela reeleição, Ricardo Nunes abraçou o apoio de Jair Bolsonaro, que, no velho e ineficaz apelo de "colocar a Rota na rua", lhe impôs o vice; e a linha de campanha, que deve se referenciar no ex-presidente.

Na esquerda, Guilherme Boulos é naturalmente identificado a Lula. Num gesto de força e de liderança políticas, o presidente operou a volta de Marta Suplicy ao PT e definiu a aliança entre a juventude do deputado e a experiência da ex-prefeita. A estratégia reside em ampliar o limitado campo de PSOL e PT, moderar a imagem de Boulos e, para além da feição antibolsonarista, reanimar o espírito de políticas públicas social-democratas e progressistas implantadas por Marta.

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Boulos, Lula e Marta no lançamento da Pedra Fundamental do Campus Zona Leste da Unifesp - Marlene Bergamo - 29.jun.24/Folhapress

De algum modo, um amplo arco de alianças —maior que simples coligações eleitorais— pode contribuir para ajudar a virar a página da história. Mas não bastará o surrado discurso do "enfrentamento ideológico".

Eleitoral e politicamente mais eficaz será enfrentar problemas concretos da cidade: saúde para uma sociedade em transformação etária; o SUS e os planos de saúde de grande parcela da população; considerar a complexa realidade dos evangélicos; entender o desejo de indivíduos empreenderem, independentemente do Estado; as questões da educação moderna; não se aprisionar à polêmica simplista que contrapõe os direitos humanos à segurança pública, assumindo o desafio de políticas concretas superiores à truculência.

Mais: para superar o ultraconservadorismo, a democracia brasileira deverá dar especial atenção às mulheres, pela centralidade que possuem na vida das famílias. Sobretudo as mulheres pobres, ponto mais agudo da desigualdade nacional, que cumprem múltiplas jornadas de trabalho: cuidam de filhos, maridos e pais; desesperam-se com a violência e miséria; apegam-se e são abraçadas pela religião. Melhor que os homens, sabem a dureza de condições longe de satisfatórias.

Enfim, os fenômenos recentes no mundo podem ser reproduzidos em São Paulo. O desafio será propor soluções práticas e modernas, expressando, com emoção, a luta pela democracia e pelo bem-estar.

Com o engenho e a arte de compreender, agir e se aproveitar de um provável novo rumo dos ventos.

Vale fecha acordo para desenvolver caminhões de grande porte movidos a diesel e etanol, FSP

 

Marta Nogueira
RIO DE JANEIRO | REUTERS

Vale assinou um acordo com a Komatsu que visa desenvolver e testar, em parceria com a Cummins, nos próximos dois anos, caminhões fora de estrada movidos a uma mistura de etanol e diesel, como parte das iniciativas da mineradora para cumprir metas de redução de emissões nos próximos anos.

Com o negócio, a Vale deverá ser a primeira mineradora do mundo a operar com caminhões fora de estrada movidos a etanol no tanque, disseram executivos das companhias. O objetivo é que, após os testes, seja possível promover gradualmente a conversão dos veículos hoje movidos apenas a diesel.

"Temos um grande desafio aqui, que é a substituição do diesel nas nossas operações, tanto em minas quanto em ferrovias, e aí, no caso de minas, os caminhões fora de estrada são os (equipamentos) que mais emitem (CO2)", disse a diretora de Energia e Descarbonização da Vale, Ludmila Nascimento, à Reuters.

Caminhão amarelo, com grande caçamba metálica, formato retangular
Caminhão fora de estrada movido a uma mistura de etanol e diesel, em teste pela Vale - Divulgação Komatsu

Ao longo dos próximos dois anos, o projeto chamado de Programa Dual Fuel prevê o desenvolvimento, testes e implantação dos motores movidos a etanol e diesel, fabricados pela Cummins. Apenas após esse período, os novos motores passarão a ser operados nas minas.

Atualmente, a Vale consome cerca de 1 bilhão de litros de diesel por ano, sendo metade desse volume em mina e metade em ferrovia, segundo dados da companhia.

Os caminhões adaptados utilizarão até 70% de etanol na mistura e, com isso, a perspectiva é de uma redução nas emissões diretas de CO2 de até 70% em relação aos veículos movidos somente a diesel, disse Nascimento.

Conforme o programa, os caminhões deverão receber dois tanques, um para etanol e outro para diesel, e a mistura de ambos os combustíveis se dará dentro do caminhão, durante sua operação.

As emissões de diesel das operações de mina respondem atualmente por 15% das emissões diretas de CO2 da Vale, de acordo com Nascimento. Hoje, a companhia tem um total de cerca de 450 caminhões fora de estrada —com capacidade entre 75 e 400 toneladas— em operação no Brasil.

Desses, cerca de 80 caminhões, com capacidade entre 230 e 290 toneladas, são da Komatsu e estão incluídos no projeto.

A opção pelo etanol se justifica por já ser um combustível adotado em larga escala no Brasil, com uma rede estabelecida de fornecimento, destacaram executivos.

O diretor de Engenharia de Mina e Usina da Vale, José Baltazar, disse que a conversão dos caminhões poderá se dar no momento de parada de manutenção deles, o que ocorre cerca de três vezes ao longo de sua vida útil, de aproximadamente 100 mil horas trabalhadas, ou 20 anos.

O vice-presidente da Divisão de Equipamentos de Mineração da Komatsu, Ricardo Alexandre Santos, destacou que a aplicação da tecnologia na frota já existente da Vale, sem a necessidade de aquisição de novos caminhões, é uma medida que também contribui com a eficiência no processo de descarbonização.

"Você vai fazer um retrofit no motor, você vai fazer um ajuste no motor... você não precisa trocar o caminhão, quer dizer, é algo sustentável em todos os lugares", destacou Santos.

A Vale não informou o investimento previsto com o projeto, mas ele fará parte dos aportes já anunciados de US$ 4 bilhões e US$ 6 bilhões (R$ 21,59 bilhões e R$ 32,39 bilhões) para reduzir suas emissões diretas e indiretas (escopos 1 e 2) em 33% até 2030. A empresa tem como objetivo zerar as emissões líquidas de carbono até 2050.