sábado, 6 de junho de 2020

Mario Sergio Conti Chamada a atacar os que se manifestarem pela democracia, a PM baixará o pau?, FSP

Nos EUA e no Brasil, a violência vem para o primeiro plano da política

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A peste não valorizou enfermeiros e médicos. Nos países onde hoje a pandemia mata mais, as pessoas anônimas que salvam vidas foram para o segundo plano. Quem se sobressai são os profissionais da violência, aqueles que infundem medo e dor para manter a ordem. Os policiais.

Ilustração de policial vestindo máscara e ajoelhado
Bruna Barros/Folhapress

Em Minneapolis, a reviravolta na percepção pública se deu por obra e graça de Derek Chauvin, um tira de olhar vidrado. Com a mão no bolso, impassível, sereno até, ele calcou o joelho e pôs o peso do corpo sobre o pescoço de George Floyd. Fez isso até matá-lo. Uma cena que não se esquece.

Já quem estava nas ruas americanas por certo não se esquecerá das noites seguintes. Multidões, jovens de todas as classes e cores, tiveram em dez dias uma vivência política equivalente a décadas de modorra parlamentar —a dúzias de eleições entorpecidas.

Quase uma centena de cidades foi tomada por passeatas, saques, correrias, sirenes e prisões.

Espontânea e radical, fruto da injustiça repisada cotidianamente, a revolta não teve pauta de reivindicações. Mas seu alvo foi cristalino: a polícia.

A polícia não existe para elucidar crimes. Em nenhum lugar do mundo. No Brasil, ela descobre apenas 8% dos autores de crimes de morte. Sob o tacão de Bolsonaro, contudo, o número de pessoas que a
polícia mata aumentou. Chegou a 5.804 no ano passado.

A polícia existe para patrulhar, exigir documentos, promover blitze, supor gente ameaçadora e detê-la,
intimar e intimidar. Exerce a força para garantir a ordem —seja no dia a dia, seja no lato sensu social e histórico. Pandemia ou não, a polícia é um pilar da sociedade.

Por isso, um signo maior da crise americana foi o fato de policiais terem se ajoelhado diante dos revoltosos. Tanto pareciam pedir perdão pela genuflexão assassina de Chauvin como imitavam astros negros que não se perfilam para o hino nacional. O signo alude à dissidência.

Nos Estados Unidos, a polícia é agente do racismo institucional. As estatísticas convergem: lá, quem é negro vê decuplicada a chance de ser assediado, humilhado e fichado por hienas fardadas. O esculacho meganha serve de antecâmara para a política do encarceramento em massa.

A polícia é uma forma histórica. Seu desenvolvimento desigual e combinado faz com que adquira contornos específicos em diferentes lugares. A globalização fez com que pipocassem protestos em Paris, Londres e Amsterdã. Contra o racismo e a polícia.

Houve nas últimas décadas a militarização da polícia. Porque a guerra agora é perpétua: guerra contra as drogas, contra o terror, contra imigrantes, contra perifas e favelas, contra fanáticos e insurgentes. A guerra hobbesiana de todos contra todos.

Os uniformes mostram que a polícia virou a vanguarda das Forças Armadas. Ela não usa máscaras para se proteger da peste. Blindados das botas aos capacetes, os policiais parecem cavaleiros medievais ou samurais. São guerreiros em defesa do status quo.

Os armamentos também testemunham o belicismo policial. Produto da Primeira Grande Guerra, a Convenção de Genebra proibiu há um século as armas químicas e a gás. Mas, com o orwelliano rótulo de “não letais”, o gás pimenta e o lacrimogêneo são usados à larga pela tigrada.

O mesmo ocorreu com os choques elétricos, instrumentos da predileção dos torturadores enaltecidos por Bolsonaro. Eles foram banidos das delegacias, mas se autoriza o uso de pistolas de “incapacitação neuromuscular”.

O arsenal pesado é atributo no Brasil da Polícia Militar. Cada vez mais, a PM parece uma tropa de choque monstruosa. Na teoria, ela é uma força federalizada de quase meio milhão de policiais, que responde aos governadores. Na prática, não é assim nem de longe.

Em 2016, PMs de diversos estados fizeram proteção ostensiva das manifestações pela destituição de Dilma Rousseff. E, há apenas três meses, policiais militares do Ceará, bolsonaristas de raiz, ocuparam quartéis e obrigaram o governador petista a fazer o que queriam.

Bolsonaro disse que, com todo mundo em casa devido à pandemia, é “facílimo” dar um golpe. Sua conversa sobre golpe de Estado não diz respeito a jogar a Constituição no lixo, não é papo de advogados, ainda que passe por isso.

A “manu militari” implica a mobilização da PM. Especificamente, pressupõe o uso de bombas, cassetetes, fuzis semiautomáticos, lança-granadas e caveirões. Para ferir, prender, quiçá matar.

Chamada a atacar os que se manifestarem pela democracia, a PM baixará o pau? Haverá policiais que se ajoelhem?

Mario Sergio Conti

Jornalista, é autor de "Notícias do Planalto".

'Manifestantes que atacaram Congresso e STF não foram considerados terroristas, mas oposição ao governo é', diz delegado, FSP

SÃO PAULO

O Brasil vive a institucionalização de um projeto fascista. Ele envolve não só o avanço no país de milícias e grupos paramilitares mas também a transformação em política de Estado de mecanismos de repressão violenta, racismo, LGBTfobia, misoginia, exploração do trabalho e criminalização de movimentos sociais.

É assim que o delegado da Polícia Civil Orlando Zaccone, 56, um dos fundadores do Movimento dos Policiais Antifascismo )organização criada por policiais do Rio e da Bahia em 2017 e depois prolongada para outros estados) entende a nova arquitetura política que vê sendo construída no Brasil hoje. Segundo ele, sua função é reprimir qualquer tipo de oposição.

Exemplos recentes seriam declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de que são "marginais" e "terroristas" os manifestantes antifascistas que tomaram as ruas de algumas cidades do país na última semana de maio em atos pró-democracia. E também o projeto de lei apresentado à Câmara por deputados governistas que propõe tipificar esses grupos como terroristas.

"Manifestantes que defenderam o AI-5 e atacaram o Congresso e o Supremo Tribunal Federal não foram considerados como terroristas, mas como livre pensamento", pontua Zaccone, que é doutor em ciência política pela Universidade Federal Fluminense e membro da Leap (Law Enforcement Against Prohibition), organização internacional que reúne policiais, promotores e juízes na busca de alternativas à guerra às drogas.

"Fica claro que a jogada é essa: quem estiver nas ruas defendendo a pauta do governo, mesmo armado ou com um taco de beisebol, vai ser tratado com respeito; quem estiver nas ruas fazendo oposição, vai ser construído como terrorista. E a gente chama isso de fascismo não é à toa."

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Zaccone e outros 500 agentes de segurança pública, entre policiais civis, militares e federais, bombeiros, agentes penitenciários e guardas municipais, subscreveram um manifesto do Movimento dos Policiais Antifascismo lançado nesta sexta (5).

O texto denuncia perseguições a policiais antifascistas no Rio Grande do Norte e no Rio Grande do Sul e urge pela criação de uma Frente Única Antifascismo com partidos, artistas e movimentos de classe e da sociedade civil.

"Não é a toa que o presidente Jair Bolsonaro quer se apropriar da Polícia Federal. Não é à toa que ele indicou o atual procurador geral da República fora da lista tríplice", avalia.

"Ele está dominando toda a estrutura institucional para operar uma perseguição política. E isso talvez seja tão grave e pouco perceptível quanto milícias e grupos paramilitares."

Para Zaccone, que foi o responsável pela investigação do caso da morte do pedreiro Amarildo em 2013 na Rocinha, que apontou para uma ação criminosa de policiais, os policiais estão cada vez mais conscientes de que estão numa posição ruim no atual modelo. Os crescentes índices de suicídio entre membros das corporações seriam apenas o sintoma mais visível.

"Os policiais militares, por exemplo, não têm direito a sindicalização, greve, filiação partidária ou livre manifestação do pensamento. São, neste sentido, subcidadãos", afirma. "Como esperar que alguém que teve direitos fundamentais retirados respeite e proteja os direitos de cidadania dos outros?"

De acordo com o delegado, uma das banedeiras do Movimento dos Policiais Antifascismo é construir a identidade do policial como trabalhador, "interessado em prestar um serviço à população e não a quem está no comando das polícias".

Como avalia a fala do presidente de que antifascistas são "terroristas" e o projeto de lei apresentado que pretende enquadrá-los desta maneira? O fascismo quer impor seu projeto político sem ter de enfrentar oposição. A desqualificação de oponentes é sua estratégia, e o gabinete do ódio é o maior exemplo disso. Agora que grupos antifas vão para as ruas dizer que não aceitam a imposição de certo modelo econômico e da intolerância às diferenças, o governo fica acuado no seu projeto.

A jogada é essa: quem estiver nas ruas defendendo a pauta do governo, mesmo armado ou com um taco de beisebol, vai ser tratado com respeito; quem estiver nas ruas fazendo oposição, vai ser construído como terrorista. E a gente chama isso de fascismo não é à toa.

Qual é o papel da polícia nesta dinâmica? A polícia infelizmente foi cooptada pelo discurso fascista, que diz que os policiais são mal recebidos pela esquerda e pelos movimentos sociais. O discurso é: "eles não gostam da polícia, mas nós gostamos. Policiais são nossos heróis".

Com esse discurso, se entrega uma carta branca à polícia. E isso vai se refletir não apenas na forma como policiais vão reprimir o exercício de direitos políticos nas ruas, mas principalmente no avanço daquilo que a polícia tem de pior: as arrecadações ilícitas e o domínio territorial perpetrados pelas milícias.

Por isso o crescimento do fascismo no Brasil é concomitante ao crescimento das milícias. E não por menos existe uma relação estreita, em especial no Rio de Janeiro, entre milícias e o poder político que chamamos de fascismo.

Sempre foi assim? Não. Eu me lembro do comício da Candelária [em abril de 1984, no Rio de Janeiro], no contexto das Diretas Já. O governador era o Leonel Brizola, e o policiamento feito no metrô e nas ruas foi impressionante. Os policiais tratavam os manifestantes com tanta cortesia... Naquele momento, eu pensei: o Brasil mudou.

É muito difícil que a polícia agrida uma manifestação se houver um governador e um secretário de Segurança colocados omo garantidores dos direitos dos manifestantes, como no caso de Brizola na Candelária.

Como explicar a diferença no comportamento das polícias nas manifestações à direita e à esquerda? Existem dois estereótipos de quem é o policial no ambiente social. Um, construído à esquerda, é o da banda podre, corrupta e violenta. Ao ponto de grupos antifascistas usaram o slogan "all cops are bastards" (todos os policiais são bastardos). Esse ódio afasta o reconhecimento do policial como trabalhador para que ele possa se juntar à luta de seus pares. Como essa aliança é rompida, a direita se aproveita e cria uma fantasia mítica, heróica, que consegue cooptar os policiais.

Hoje, o poder político federal dialoga de perto com as forças policiais, que ganharam muito espaço no governo Bolsonaro. Isso repercute na instituição ao ponto de seus membros enxergarem quem está contra o governo como inimigo.

Existe receio de que as manifestações contra o governo marcadas para este domingo (7) sejam alvo da ação de pessoas infiltradas. Infiltrados fazem parte da história. Eles vão lá promover desordem para legitimar a ação direta e violenta da polícia. As lideranças dessas manifestações terão de se organizar para tentar impedir o sucesso deste tipo de ação.

Mas a violência não decorre apenas de elementos infiltrados, mas também de alguns manifestantes. E precisamos melhorar a leitura deste fenômeno.

Diante da revolta causada pela morte de George Floyd nos EUA, um mesmo telejornal brasileiro chama de manifestante quem está colocando fogo nas delegacias americanas enquanto chama de vândalos os brasileiros que entraram em confronto com grupos neofascistas e com a polícia.

Qual é o limite entre manifestação política e vandalismo? Qual é o olhar que o Estado teve para um fotojornalista [Sérgio Silva] que ficou cego ao levar um tiro de bala de borracha da polícia durante uma manifestação em junho de 2013? O Estado disse: quem está na chuva é pra se molhar. E por que isso não vale para a vidraça de um banco?

Não estou fazendo um discurso pela violência. Mas a vidraça do banco quebrada gera uma reação do aparato policial capaz de provocar algo muito pior, como a cegueira em quem está trabalhando no protesto.

A gente naturaliza os altos índices de letalidade da polícia, a gente naturaliza a morte de policiais, e, de repente, uma vidraça quebrada vira um grande escândalo da violência. Precisamos questionar isso.

Como avalia a reação dos americanos à morte de George Floyd sendo o Brasil um país em que policiais matam mais e pessoas negras são mais mortas por eles? No Brasil, o que se discute ainda na violência policial é se a pessoa que morreu merecia ou não morrer, como se tivéssemos autorização para que criminosos fossem executados. Quando as vítimas são identificadas como criminosos, sua morte não causa comoção.

A morte de Floyd causou essa reação porque a cena filmada foi a de um homem indefeso sendo asfixiado por um policial branco enquanto implorava pela vida. Agora, vamos supor que ele tivesse acabado de cometer um assalto a mão armada, registrado por câmeras de segurança. Tenho minhas dúvidas se teria gerado a mesma escala de revolta.

No Brasil, isso virou um discurso político porque o fascismo contempla que essas execuções virem política de Estado. E a grande tragédia é que as famílias das vítimas da violência policial ficam o tempo todo querendo provar que os filhos não eram bandidos.

Por que um manifesto agora? Para denunciar que nós já somos alvos de um poder fascista institucionalizado. Que o fascismo não é formado só por grupos paramilitares e milícias, mas está sendo operado dentro das instituições.

Não é a toa que o Bolsonaro quer se apropriar da Polícia Federal, não é à toa que ele indicou o atual procurador geral da República fora da lista tríplice. Eles estão dominando toda a estrutura institucional para operar uma perseguição política. E isso talvez seja tão grave e pouco perceptível quanto milícias e grupos paramilitares. Os próprios policiais antifascismo vem sendo atacados.

Como? No Rio Grande do Norte, um integrante do movimento postou um vídeo dizendo que iria monitorar as chamadas carreatas da morte, em apoio ao governo, para identificar os cidadãos que estivessem desobedecendo o decreto da governadora que determinava o isolamento social.

Ele se tornou alvo de uma investigação do Ministério Público, cujo procedimento preparatório tem 600 páginas, nos acusa de ser um grupo paramilitar e traz foto, endereço e telefones de dezenas de policiais antifascismo. Isso lembra os piores momentos dos anos de chumbo e de sua polícia política.

No Rio Grande do Sul, um deputado do PSL representou contra um policial antifascismo porque ele fez postagens de apoio aos movimentos antifascistas locais.

Como surgiu o Movimento dos Policiais Antifascismo? Eu era membro da Leap [Law Enforcement Against Prohibition, organização internacional anti-proibicionista] e volta e meia era convidado para participar de debates com estudantes. E fui, pela primeira vez, convidado por um grupo de policiais da Bahia. Lá, descobri um tesouro: um coletivo sindical de policiais formado por pessoas com história no movimento negro e no movimento estudantil. Quis levar eles pra Leap, mas nosso diálogo se tornou muito mais amplo, que envolvia problemas com as estruturas arcaicas dos operadores da segurança.

Temos duas instituições, as polícia civil e militar, uma trabalhando com um modelo de investigação cartorial, outra que para gente na rua com arma na cara. Pensamos em um movimento de policiais progressistas, mas não queríamos usar democracia porque todos os problemas que a gente enxergava tinham sido mantidos com a redemocratização. Então ser a favor da democracia não nos dizia nada.

Escolhemos policiais antifascismo. E é curioso o impacto que nossa presença gera em atos e encontros. As pessoas fazem fila para tirar fotos conosco. Eu brinco que me sinto como as princesas da Disney (risos). Mas é porque existe um anseio de que os policiais consigam se libertar das amarras de reprodução de um modelo que não interessa a ninguém, apenas ao poder político corrompido.

RAIO-X

Orlando Zaccone D'Elia Filho
Nascido em 1964, no Rio de Janeiro, tem formação em jornalismo e em direito. Doutor em ciência política pela Universidade Federal Fluminense, é delegado da Polícia Civil, membro da Leap (Law Enforcement Against Prohibition), cofundador do Movimento dos Policiais Antifascismo. Harekrishna. Autor dos livros "Acionistas do Nada" (2007) e "Indignos de Vida" (2014). Ex-filiado ao PSOL. Filiado ao PSB.

O grande avanço do comércio eletrônico, Celso Ming, OESP

Celso Ming, O Estado de S.Paulo

06 de junho de 2020 | 11h13

Em meio a tanta notícia ruim para o setor do varejo, as últimas semanas ofereceram alguns fatos marcantes. Confira:

  • O patrimônio pessoal do presidente da grande campeã mundial do comércio online, Jeff Bezos, da Amazondeve alcançar US$ 1 trilhão em 2026, conforme avaliação publicada pela consultoria americana Comparison. 
  • Aqui no Brasil, em pouco mais de dois meses de pandemia, foram criadas mais de 107 mil lojas virtuais, um jeito de compensar as perdas do varejo convencional, informa a manchete do Estadão da sexta-feira passada.
  • Graças a seu pioneirismo no segmento de comércio digital, no dia 26 de maio, o valor de mercado do Magazine Luiza ultrapassou os R$ 100 bilhões. A Via Varejo, que segue na mesma trilha, também passou a ser um dos papéis mais atrativos da Bolsa.

Ou seja, não é só prostração que se vê no comércio.

O isolamento social compulsório empurrou o consumidor para as compras online e os lojistas acordaram não só para a necessidade de abrir essa janela para seus negócios, mas também para a possibilidade de redução drástica de custos fixos: o comércio online permite a centralização dos estoques em poucas unidades, na medida em que transforma as lojas em showrooms; diminui a necessidade de vendedores; e possibilita a redução da área de vendas, o que, por sua vez, deve baixar os aluguéis, o consumo de energia, o custo com segurança e por aí vai.

Maurício Salvador, presidente da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm), observa que, antes da pandemia, a média de pedidos de comerciantes para fazer parte da entidade era de 10 por dia. Hoje, já são 30 por dia.

O consumidor, que antes demonstrava certa resistência à modalidade, seja por simples falta de hábito, seja por temer fraudes com seu cartão, parece ter entendido que não precisa bater perna para pesquisar preço e que tudo pode ficar mais fácil com alguns cliques no computador ou mesmo no celular.

Na correria para entrar no mundo digital, lojistas também recorreram a soluções mais rápidas, como a de vendas por WhatsApp. “Aplicativos de mensagens são a forma mais simplificada de e-commerce, embora não tenham o mesmo alcance, porque o vendedor se restringe à própria base de clientes e não explora o que o e-commerce tem de melhor pra oferecer, que é catálogo”, diz Maurício Salvador.

Marcos Gouvêa, diretor-geral do Grupo GS& Gouvêa de Souza, prevê que, uma vez suspenso o confinamento, o consumidor ficará mais exigente porque aprendeu a comparar preços online e, como passa por grande aperto de orçamento, ficará mais cauteloso com situações em que antes se deixava levar por impulso. Os produtores, por sua vez, parecem ter entendido que não precisam abrir lojas físicas para atrair o consumidor final. “Têm apenas de fazer bom uso dos canais digitais”, explica Gouvêa.

E-commerce
O isolamento social compulsório, causado pela covid-19, forçou o consumidor e lojistas para as compras online  Foto: Paulo Whitaker/Reuters - 24/4/2018

O modelo phygital

As as coisas não caminham apenas para modalidades comerciais polarizadas, tipo puro-sangue, digamos assim. Ganha corpo também a modalidade de mestiçagem. Trata-se do phygital, construção vocabular do inglês que designa a mistura entre os mundos físico e digital. No phygital, o cliente pode realizar uma compra online e buscar o produto na loja ou vice-versa.

Esse hibridismo mostra que é um erro apostar no desaparecimento das lojas físicas. O comércio convencional ainda mantém sua força porque, observa Gouvêa, quando saem às compras, muitos consumidores ainda valorizam o “olho no olho”. Nesse contato mais próximo, as lojas continuarão a oferecer vantagens sobre vendas “commoditizadas”, como aulas de culinária em supermercados ou combinação de tecnologias de realidade virtual ou aumentada para simular cenários. 

O comércio tradicional deve, também, acelerar a tendência de operar a partir de minicentros de distribuição, afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), Eduardo Terra. “Teremos menos lojas nas ruas, menor adensamento comercial e maior capilaridade, com mais distribuição de pontos físicos”.

Nesse sentido, o setor deverá encontrar um ponto de equilíbrio que concilie os dois tipos de comércio. “Existe hoje exagero no número de lojas físicas, mas o varejo digital também precisa contar com doses adequadas de lojas físicas para existir.” / COM GUILHERME GUERRA