segunda-feira, 13 de abril de 2020

Claudio Bernardes Laboratórios urbanos e uma nova abordagem a serviço da vida nas cidades, FSP

Um dos exemplos, o Sydney Science Park, deve se transformar num dos maiores centros de pesquisa da Austrália

Imaginem toda uma cidade constituída em um laboratório vivo, onde os espaços e as pessoas são, de forma ativa, envolvidos no processo de projetar, desenvolver, implementar, testar e avaliar inovações que podem melhorar a vida nas cidades.
A cidade de Sidney, na Austrália, que vai receber o Sydney Science Park, que deve se transformar num dos maiores centros de pesquisa do país
A cidade de Sidney, na Austrália, que vai receber o Sydney Science Park, que deve se transformar num dos maiores centros de pesquisa do país - Bai Xuefei/Xinhua
Essa pode ser uma das respostas para o equacionamento da crescente complexidade urbana e dos enormes desafios sociais que se acumulam nos locais em que vivemos.

À medida que aumenta a complexidade dos sistemas urbanos, cresce a necessidade de a ciência informar e ajudar a transformar o processo de desenvolvimento das cidades.

Os laboratórios urbanos, operando como locais de inovação, podem trazer para as comunidades locais a expertise científica necessária para a fundamentação de ações voltadas à produção de dados, tecnologias e processos que melhorem a qualidade de vida nas cidades e as tornem mais resilientes.

O recente aumento de interesse na cidade experimental como uma arena dentro e por meio da qual a sustentabilidade urbana pode ser testada, marca o surgimento de revolucionárias formas para a experimentação de novos métodos, modelos, arranjos de governança, projetos de demonstração e gerenciamento de inovações.

Mostra também a crescente sensibilidade da comunidade científica, no sentido de que intervenções urbanas podem ser consideradas em termos experimentais.

Laboratórios urbanos vêm sendo implementados em várias partes do mundo. Experiências que podem ser de grande valia para aperfeiçoar essa importante ferramenta de auxílio à melhoria da vida urbana.
Na Austrália, surgem alguns exemplos interessantes.
O Sydney Science Park, com área de 280 hectares a oeste de Sidney, deve se transformar num dos maiores centros de pesquisa do país, onde serão experimentadas ideias e invenções voltadas ao desenvolvimento urbano.
Atualmente, estão sendo testados modelos que exploram o desenvolvimento e a aplicação de diferentes tipos de sistemas inteligentes de distribuição de água e energia, que possam se adaptar às mudanças climáticas.
O Darwin Living Lab, na cidade de Darwin, está testando a efetividade das medidas de mitigação de ilhas de calor em áreas urbanas.
Dessa forma, produz conhecimento e experiência em cidades tropicais, com potencial para traduzi-las em produtos e serviços a serem utilizados em cidades com características semelhantes em todo o mundo.
Localizado numa área de 700 hectares ao norte da capital australiana (Camberra), por meio da colaboração entre governo, indústria e comunidade, Ginninderra, uma antiga estação de pesquisa agrícola, está se transformando num laboratório para testar cientificamente inovações urbanas sustentáveis e soluções técnicas para as cidades do futuro.
Pesquisadoras da Luleå University of Technology, na Suécia, estudaram os laboratórios urbanos e concluíram que eles podem ser utilizados com muito êxito para a avaliação de soluções inovadoras, que visam resolver os desafios urbanos e contribuir para a sustentabilidade a longo prazo, construindo ativa e abertamente alternativas factíveis com cidadãos e outras partes interessadas.
A base para instalação e gerenciamento dos laboratórios urbanos está vinculada à perfeita compreensão de seus componentes principais.
As experiências em andamento podem servir de base para as cidades saberem como configurar, governar e gerenciar seus laboratórios de vida urbana e conhecerem os fatores que influenciam o teste de inovações e processos de desenvolvimento.
Dessa forma, será possível responder a perguntas como: quem deve se engajar e de que maneira?
Quais métodos devem ser aplicados para envolver os cidadãos? Quem inicia o processo, quem é responsável por executar o processo de experimentação, e como o modelo de governança de um laboratório de vida urbana deve ser estruturado para aumentar sua probabilidade de sucesso?
Está mais do que na hora de as cidades brasileiras começarem a pensar seriamente na implantação desses laboratórios.
Claudio Bernardes
Engenheiro civil e presidente do Conselho Consultivo do Sindicato da Habitação de São Paulo. Presidiu a entidade de 2012 a 2015.

Ronaldo Lemos Desacelerar para progredir?, FSP


A pausa permite pensar sobre os comportamentos que vamos querer manter após a crise



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Mesmo com o mundo andando em velocidade frenética antes da Covid-19, já se falava em “estagnação” e até em “estagnação secular”. De um lado, a economia dos EUA fervendo; de outro, países adotando juros negativos para forçar o dinheiro a circular ainda mais depressa, como se o mundo precisasse de ainda mais velocidade.

Esse paradoxo em que se vivia ao mesmo tempo aceleração e estagnação nunca pode ser bom sinal. Mesmo que profissionais do otimismo como Steven Pinker continuassem a pregar que vivíamos o “melhor dos mundos”, o fato é que já havia uma sensação (e números) mostrando que as condições de vida no planeta estavam se deteriorando. Podia até haver consumo, mas não havia progresso.

Um exemplo é que, quando se olha para inovação, mesmo com um mundo conectado em polvorosa, nunca mais houve um grande avanço tecnológico disruptivo com impacto econômico e social profundo, como a descoberta dos antibióticos ou a invenção do vaso sanitário.

Mesmo com o surgimento da internet, seu impacto na produtividade econômica continuou negligenciável. “A era do computador está em toda parte, menos nas estatísticas sobre produtividade”, já dizia Robert Solow em 1987. Além disso, apesar de toda a conectividade, nunca o distanciamento de visões entre as pessoas foi tão grande.
Com a Covid-19, estamos sendo obrigados a reduzir subitamente a velocidade. Essa frenagem, diferentemente do que se imagina, em vez de gerar só mais estagnação, permite também alguns poucos progressos impensáveis em tempos “normais”.
Por exemplo, em bancarização. Até a semana passada, 1 de cada 3 brasileiros adultos não tinha conta bancária. Diferentemente da Índia, da China, do Quênia e de outros países em desenvolvimento, o Brasil não incluiu seus segmentos mais pobres no setor bancário nos últimos anos.

Com a necessidade de transferir renda para os mais vulneráveis, é possível que de 10 milhões a 15 milhões de pessoas sejam incluídas no sistema bancário em três semanas. Em face disso, cabe perguntar: por que não fizemos isso antes?

Recuperamos até alguma capacidade de produzir consenso. O distanciamento social é um exemplo. Apesar dos seus detratores, um contingente enorme de pessoas no planeta hoje sabe que ele é a única medida eficaz agora para evitar o avanço da doença e está agindo de acordo com esse consenso.
Esse tipo de ato mostra que, quando somos capazes de concordar, podemos realizar ações extraordinárias como humanidade.
A Covid-19 aguça também a visão. A pausa permite pensar sobre os comportamentos com os quais vamos querer continuar e quais vamos descartar quando a crise regredir.
É claro que o risco de tragédias políticas se arma também no horizonte. Traumas, individuais ou sociais, podem gerar distúrbios. Se não tratados desde logo, esses distúrbios deitam raízes e se tornam longevos.
Ao mesmo tempo, há a possibilidade de surgirem modos de vida mais satisfatórios e solidários. O desafio da Covid-19 pode ajudar a curar outras doenças profundas que se acumulavam aos montes sem percebermos.
Em “Um Fogo sobre as Profundezas”, o escritor de ficção científica Vernor Vinge fala sobre uma doença que se alastra pelo universo. A única forma de interrompê-la é reduzir o curso do próprio tempo. Pode ser exatamente disso que precisamos. Desacelerar talvez seja a única forma de voltar a progredir.
Reader
Já era Reuniões deliberativas apenas presencialmente
Já é Congresso e STF decidindo e votando virtualmente
Já vem Reuniões de condomínio virtuais
Ronaldo Lemos
Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.