quarta-feira, 8 de abril de 2020

Antonio Delfim Netto Delegação de poderes, FSP

Em momentos de crise, exige-se ação expedita do Executivo

  • 9
Agora —diante da pandemia— creio que todos compreenderam que nos momentos de grave crise se exige uma ação centralizada e expedita do Executivo e que lhe seja concedido um "fast-track" para tarefas específicas —por tempo determinado e sob vigilância parlamentar permanente. É exatamente isso o que dispõe o Art. 68 da Constituição Federal, que cria as "leis delegadas" que o Congresso tenta abolir porque o considera "autoritário", apesar de comum em constituições de países seguramente "democráticos".
Houve uma enorme evolução do Congresso: a proposta de acrescentar às disposições transitórias da Constituição o Art. 115. Trata-se de uma super delegação ao Executivo das condições para agir com coordenação e rapidez no combate à Covid-19. Por tempo determinado, libera-o das dificuldades burocráticas e autoriza os gastos necessários. Há dúvidas de como funcionará diante das diferenças entre as ações propostas pelo presidente (avesso a todo conhecimento empírico e preso a preconceitos ideológicos) e as dos ministros, que insistem, corretamente, em seguir as recomendações científicas da OMS e as evidências colhidas na devastação produzida pela Covid-19 no mundo.
Como disse em minha coluna de 1º/4, ninguém pode saber qual será o custo monetário do enfrentamento da pandemia no Brasil, diante das incertezas das ações humanas somadas aos caprichos da dinâmica da evolução epidemiológica. Mas isso agora é irrelevante. O Art. 115 é uma resposta à absoluta responsabilidade moral do governo de reduzir, ao mínimo, o número de óbitos.
Quem vai pagá-los? Não é o governo, mas todos nós, a sociedade organizada, que criou o Estado (que não gera recursos, apenas pode transferi-los) exatamente com esse objetivo: coordenar as ações de todos no enfrentamento de tragédias como a que estamos vivendo.
Todos pagaremos pelo empobrecimento geral proporcionalmente à nossa situação de vulnerabilidade, exatamente como numa guerra. E, como aconteceu dezenas de vezes na história do homem, haverá vida depois dela.
Para enfrentar com mais tranquilidade a Covid-19, talvez seja bom lembrar que ela é apenas a mais recente das dezenas de pandemias (muito mais mortais) que habitaram a história do homem desde que patógenos (bactérias e vírus) de animais que ele domesticou transferiram-se para ele, transformando-o em portador e transmissor das pandemias. Não são "filhos de Satanás", como querem alguns evangélicos, mas o preço da civilização que aumentou o bem-estar do homem. Em todos os casos, foi sempre o avanço do conhecimento científico que mudou os hábitos de higiene que mitigaram seus efeitos.
Antonio Delfim Netto
Economista, ex-ministro da Fazenda (1967-1974). É autor de “O Problema do Café no Brasil”.

Ruy Castro Um governo de amadores, FSP


Jair Bolsonaro foi educado em quartéis. Como não se conhecem trabalhos de sua autoria sobre história do Brasil, matemática e balística, disciplinas de interesse dos militares, o mais perto que desempenhou de uma atividade científica pode ter sido esfregar cavalos. Isso não o impediu de, como presidente da República, dar palpite sobre o coronavírus, minimizando-o ("Uma gripezinha! Um resfriadinho!"), estimulando as pessoas a correr o risco de contraí-lo e jogando com a saúde da população.
A audácia de Bolsonaro ao desafiar a comunidade científica mundial, ofender os já milhares de mortos e tentar esvaziar o seu próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta —que ele só não demitiu na segunda-feira porque foi peitado por gente ainda sã no governo— não tem equivalente nos anais.
Para piorar, seu estilo de governar, arrogante, despótico e indiferente às consequências, tem sido replicado por vários de seus auxiliares, não por coincidência também autorizados a pontificar sobre assuntos além das respectivas solas.
Com sua vocação para a chanchada, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, por exemplo, criou um problema internacional com uma piada em que comparou os chineses ao Cebolinha. A secretária de Cultura, Regina Duarte, postou um vídeo falso em que o ministro da Saúde parecia autorizar o uso da cloroquina como um elixir mágico contra o vírus —o que Regina Duarte tem a ver com saúde? Em que ciência se basearam tantos ministros para pregar que só os maiores de 60 anos devem se confinar? E, nesse caso, quem autorizou o general Augusto Heleno, macróbio e portador do vírus, a desafiar as autoridades sanitárias e quebrar a quarentena que milhões de brasileiros prudentes estão cumprindo?
É um governo basicamente de amadores. Por isso essas pessoas foram escolhidas para integrá-lo. As exceções um dia se envergonharão de ter participado dele.
Tuíte do ministro Weintraub provocando a China
Tuíte do ministro Weintraub em desrespeito à China - Reprodução
Ruy Castro