Gente trabalhadora e dinheiro não faltam em Barueri. De acordo com o último levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o município paulista tem a segunda melhor taxa de população ocupada (111,9% —tem mais gente trabalhando do que morando por lá) e está ranqueado como o 14º maior PIB do país (R$ 51,2 bilhões).
Com tamanha fortuna, o que se espera é um cenário de motivação para ir trabalhar. Mas quando o barueriense pisa na rua, encontra uma realidade dura e perigosa. Apesar do sucesso nas finanças, seu município é o penúltimo colocado em qualidade de mobilidade no estado de São Paulo, segundo um estudo publicado em abril pelo NEC (Núcleo de Estudos das Cidades, da USP).
Para quem escolhe a bicicleta como meio de transporte, Barueri é exemplo de precariedade, e está muito longe de refletir o slogan "cidade inteligente e sustentável", escolhido pela administração do prefeito Rubens Furlan, que está em seu sexto mandato no cargo.
Em comparação com outras grandes cidades do mesmo estado, Barueri não tem uma taxa de motorização tão alta (a quantidade de carros por cada 100 habitantes está em 67,2), mas até hoje a administração municipal preferiu priorizar os investimentos em viadutos e transporte motorizado, incentivando o fluxo intermunicipal de automóveis por áreas centrais da cidade, do que investir em mobilidade ativa.
CICLOVIAS DESCONECTADAS, PEQUENAS E PERIGOSAS
Com 462 anos de existência e apenas 11,3 km de ciclovias, a cidade ainda não conseguiu criar uma rede cicloviária conectada, deixando a maioria dos seus ciclistas sem proteção em meio a um trânsito caótico, classificado pelo NEC como um dos 5 mais letais entre as grandes cidades de São Paulo.
Beirando o trecho mais poluído de todo o rio Tietê, fica a maior das três estruturas cicloviárias da cidade. Com 7 km e formato bidirecional, a ciclovia do Parque Linear liga os bairros Aldeia e Chácara Marcos por um caminho que desafia os padrões definidos pelo Manual Brasileiro de Sinalização de Trânsito. Em algumas partes é tão estreita (1,5 m de largura), que ciclistas em sentidos opostos são obrigados a invadir a calçada para não trombarem de frente.
Na extremidade sul, no bairro Aldeia, a falta de uma ciclopassarela sobre a movimentada Linha-8 do trem, na altura da estação Antônio João, impossibilita a conexão com o segundo trecho de ciclovia do município, que tem mais 4 km até o bairro Parque Viana. "Parece que aquela estação parou no tempo, no século 18. As pessoas são obrigadas a se arriscar cruzando o trilho a pé para ir de uma plataforma à outra ou chegar na outra parte da ciclovia", disse o agrônomo e cicloativista Renato Afonso, morador de Barueri há 30 anos.
O agrônomo reclama a falta de um estacionamento de bicicletas na estação: "É a segunda estação mais movimentada da região, muita gente chega de bicicleta ali e não tem coragem de usar os paraciclos, não tem segurança nenhuma. O pessoal acaba usando o estacionamento do shopping".
Indignado com a falta de zelo da prefeitura com os espaços de lazer, Renato chegou a convocar a população nas redes sociais para isolar com cones o canteiro central da avenida Guilherme Perereca Guglielmo, utilizado pelos moradores "para caminhar e andar de patins enquanto carros trafegam a mais de 70 km/h". No local não há nenhuma proteção divisória.
A vendedora Sandra Assis de Oliveira é moradora de Barueri há 7 anos, e também reclama da estrutura precária que a cidade oferece aos ciclistas. "Vou de bicicleta para o trabalho, mas me sinto muito insegura nos trechos sem ciclovia. Tem também o problema que a ciclovia fica muito lisa na chuva, todo mundo cai por causa da tinta inadequada".
A vendedora, que faz parte de um grupo de pedaladas, diz que a administração municipal desperdiça a oportunidade de atender um grande número de ciclistas que circulam pela cidade, e sugere interligar hospitais e repartições públicas com estruturas cicloviárias e estacionamentos para bicicletas. "Não tem bicicletário na Secretaria de Esportes, é um absurdo".
A menor de todas as ciclovias tem cerca de 300 metros e ocupa o canteiro central da avenida João Vila-Lobos Quero. Em formato oval, ela liga nada a lugar nenhum.
PLANO DE MOBILIDADE URBANA ATRASADO
No ano passado, a cidade perdeu o prazo para se adequar à Política Nacional de Mobilidade Urbana, que dava como limite o dia 12 de abril de 2022 para cidades com mais de 250 mil habitantes aprovarem seus planos de mobilidade urbana. Barueri começou a pensar na ideia poucos meses antes e, segundo a agenda pública do município, deixou o processo estagnar em julho do ano passado.
Por sorte da administração municipal (e azar do munícipe), o governo federal anistiou o atraso com uma medida provisória publicada em 7 de julho. Com isso, a Prefeitura de Barueri ganhou mais 2 anos para se ajustar à lei.
Segundo o escritório Risco Arquitetura Urbana, contratado para assessorar a prefeitura na elaboração do Plano de Mobilidade Urbana de Barueri, "o primeiro [dos sete objetivos do plano] é promover os deslocamentos ativos, ou seja, o transporte não motorizado, a pé e por bicicleta". O escritório diz que na época dos estudos identificou "uma grande demanda reprimida pelo uso de bicicletas" e estabeleceu um plano de metas para ampliação da rede cicloviária, chegando a 89,3 km em 2037, ao custo estimado de R$ 16,6 milhões.
OUTRO LADO
Por nota, a Prefeitura de Barueri disse estar construindo um trecho cicloviário no Boulevard Central, entre a avenida Santa Úrsula e a rua Campos Sales, que interligará futuramente com o Parque Linear, passando pela avenida Guilherme Perereca Guglielmo, e mencionou estar em estudo um estacionamento de bicicletas que complementará o projeto de ciclovias.
A ViaMobilidade, responsável pela estação de trem Antônio João, disse por nota que há um projeto de revitalização da estação e que "prevê melhorias que vão além do que estava originalmente estabelecido no contrato de concessão". A companhia ressaltou que os investimentos incluem a requalificação completa da estação, contemplando a instalação de 4 escadas rolantes, 4 elevadores, novo mezanino, cobertura em toda área útil das plataformas de embarque e desembarque, piso de granito, novos sanitários públicos, bicicletário e paraciclo.
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