Brasília e São Paulo – Hyago Santos, de 31 anos, terminou a graduação de ciências contábeis em junho. Mas o diploma do ensino superior ainda não representou um emprego na sua área de formação. “Falei com três escritórios de contabilidade grandes da minha cidade, mas nenhum topou”, afirma ele, morador de Tanhaçu, no interior da Bahia.
Nesses meses de formado, até recebeu proposta de trabalho, mas nenhuma condizente com a sua formação. “Tive uma proposta de emprego de uma loja em Vitória da Conquista. Estavam procurando um gerente, mas queriam pagar pouco.” Agora, sem emprego formal, a meta é se dedicar para as provas de concursos públicos. Em dezembro, deve fazer a avaliação para o Tribunal de Contas do Estado da Bahia.
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Desde que a fase mais aguda da pandemia foi superada, o mercado de trabalho tem rendido boas notícias para a economia brasileira. Mas a história de Hyago se repete em outras partes do País. Isso porque a melhora do emprego formal nos últimos anos está concentrada em trabalhadores de mais baixa qualificação – uma tendência que vem se acentuando.
Levantamento realizado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) mostra que 96% das vagas formais criadas no País foram para trabalhadores com ensino médio incompleto ou completo. O estudo levou em conta os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, apurados nos 12 meses até agosto.
No período, a economia brasileira criou 1,5 milhão de vagas de trabalho com carteira assinada, de acordo com o Caged. Desse total, os trabalhadores com ensino médio incompleto preencheram 123,6 mil postos e os com médio completo responderam por 1,3 milhão. Já no topo das vagas, houve fechamento de postos para profissionais com mestrado e doutorado, de 511 e 655, respectivamente.
“Desde o início da recuperação da pandemia, a gente tem observado uma geração consistente do emprego formal do Brasil. A gente pode dizer que o começo dessa recuperação foi no segundo semestre de 2020″, afirma Fabio Bentes, economista da CNC e responsável pelo levantamento.
“O que chama a atenção, porém, é o crescimento acima da média de vagas para trabalhadores com ensino médio completo e incompleto, enquanto que, para trabalhadores mais qualificados, esse ritmo ainda é fraco ou até apresenta uma pequena retração”, destaca Bentes.
Historicamente, a abertura de postos para trabalhadores com ensino médio sempre predominou no mercado de trabalho brasileiro, mas a questão é que ela tem se aprofundado nos últimos anos. Em 2021, essa relação era de 81%. Em 2022, subiu a 87%. E, agora, está em 96%.
A criação de vagas destinadas ao ensino médio pode ser lida de duas maneiras, segundo economistas. Numa avaliação de curto prazo, a geração de empregos para esse nível educacional pode ser explicada pela recuperação dos estragos provocados pela pandemia de covid-19 no mercado de trabalho, que afetou mais os brasileiros menos escolarizados. Já de forma mais estrutural, evidencia a dificuldade do Brasil de abrir postos para uma mão de obra mais qualificada.
“Justamente os grupos que mais sofreram na pandemia foram aqueles menos escolarizados, que também foram os últimos a voltar para o mercado de trabalho ao longo dos últimos dois anos”, afirma Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador sênior do FGV Ibre.
Vagas de baixa especialização
O dado do emprego concentrado no nível médio se dá num contexto em que a economia brasileira tem conseguido aumentar o grau de instrução da população.
Em 1992, 34% da população ocupada tinha entre zero e quatro anos de estudo, mostra um levantamento do Ibre com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 2022, recuou para 7%.
Na outra ponta, há 30 anos, 14% entravam na faculdade, mas não necessariamente completavam o curso. No ano passado, 44% estavam no ensino superior.
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