segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Lygia Maria Precisamos falar sobre sexo, FSP

 Num dos seus shows de comédia, Ricky Gervais disse que "A pior coisa que você pode dizer no Twitter hoje, que vai lhe causar cancelamento e ameaças, é que mulheres não têm pênis". O humorista alerta para o fato de como uma platitude tornou-se fala polêmica que pode ser interditada por acusações de transfobia. Se o fenômeno fosse restrito às redes sociais, já seria ruim, mas, quando ele invade o meio acadêmico, torna-se nefasto.


A Associação Americana de Antropologia, a maior da área no mundo, cancelou o painel "Vamos falar sobre sexo: por que o sexo biológico continua sendo uma categoria analítica necessária em antropologia" (em tradução livre do inglês) na conferência anual da entidade que será realizada em novembro.

Uma estátua clássica de mármore de uma mulher cobrindo os órgãos genitais com as mãos
Estátua clássica de mármore de uma mulher cobrindo os órgãos genitais com as mãos - Bede/Adobe Stock

O trabalho já havia passado por avaliação científica e aprovado em julho, mas, no final de setembro, as seis pesquisadoras de instituições renomadas —como as Universidades de Barcelona e de Harvard— responsáveis pelo painel foram surpreendidas com o cancelamento. Segundo a AAA, a apresentação "causa danos aos membros representados pelas pessoas trans e LGBTQI da comunidade antropológica, bem como à comunidade em geral".

Ora, mas a descrição do painel sequer assume positivismo biológico, só afirma a necessidade de se analisar melhor o uso de conceitos: "nem todo antropólogo precisa diferenciar sexo de gênero (...) mas existem múltiplos domínios de pesquisa nos quais o sexo biológico permanece insubstituivelmente relevante para análise antropológica".

Não à toa, 216 pesquisadores de diversas áreas, incluindo humanidades, assinaram uma carta na qual afirmam que a proibição passa a mensagem de que o complexo debate acadêmico sobre sexo e gênero não é livre e pedem para que o painel seja apresentado.

Academia não é lugar para dogmas e censura baseada em afetos, ainda mais em relação a hipóteses que nem de longe alcançaram unanimidade no campo científico.

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