Minha prima Anne, muito inteligente, bem-intencionada e atenta, me disse um dia: "Uma economia moderna complexa precisa de regulamentação complexa".
A maioria das pessoas atentas acredita nisso. Essas pessoas acreditam que a única maneira de uma economia alcançar a ordem é a forma como uma pessoa sozinha alcança a ordem, ou uma família, ou um exército.
Você coloca leite na sua tigela de cereal para o desjejum da manhã e isso funciona (tome cuidado: não ponha demais). Mamãe organiza o que haverá no jantar e ele aparece (atenção: sempre compre os ingredientes antes). Napoleão ordena que a sua Grande Armée vire à esquerda, e ela imediatamente vira à esquerda (atenção: não tente conquistar a Rússia).
É verdade que nas nossas vidas pessoais cada uma de nós organiza a seu modo as meias em sua gaveta. No nível do grupo, às vezes alcançamos a ordem obedecendo às ordens de generais, senhores, maridos, reis, planejadores, reguladores.
Mas mesmo pessoas atentas como minha prima Anne observam a ordem do grupo sem ordens humanas em grande parte da nossa vida, mesmo na família, no exército e na economia.
O filósofo escocês Adam Ferguson observou, em 1767, que grande parte do futuro é "o resultado da ação humana, mas não a execução de algum desígnio humano".
Ninguém designa a língua portuguesa que você vai usar para construir a próxima frase. E ainda assim o português tem uma gramática e um vocabulário ordenados e efeitos práticos na utilização.
Mesmo numa família pequena, as pessoas passam umas pelas outras no corredor sem se esbarrar, mas ninguém lhes ordena que o façam.
Mesmo num grande exército, numa grande corporação ou num grande país, as ordens do topo não determinam totalmente o resultado.
O escritor russo Liev Tolstói (1828-1910), que havia sido soldado, disse-o sabiamente em "Guerra e Paz" e também sobre a própria Grande Armée de Napoleão.
As economias de mercado são organizadas espontaneamente e, como Ferguson também disse, frequentemente levam ao progresso. No entanto, ao longo do último século, cresceu a convicção de que o Estado deve assumir a responsabilidade pela solução de todos os "problemas", porque tem ordens para resolvê-los.
Mas nós, em nossas ações interativas, alcançamos resultados que não são desígnios humanos, como o infinitivo flexionado, peculiar ao português, ou o preço da feijoada, peculiar a São Paulo.
Talvez seja uma tarefa inútil o Estado regular.
Nenhum comentário:
Postar um comentário