quarta-feira, 25 de outubro de 2023

ARNALDO NISKIER - Machado de Assis e a educação, FSP

 

Arnaldo Niskier

Doutor em educação, é professor, jornalista e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL); presidente do Centro de Integração Empresa-Escola do Rio de Janeiro (Ciee/RJ)

Nascido no morro do Livramento, no Rio de Janeiro, Machado de Assis (1839-1908) foi o que chamamos de autodidata. Não chegou a completar sequer o ensino primário. Hoje, é considerado o maior escritor brasileiro de todos os tempos. Foi presidente da Academia Brasileira de Letras por dez anos.

Movido pela natural curiosidade de educador, procurei pesquisar mais a fundo as ligações do "Bruxo do Cosme Velho" com as questões ligadas ao ensino. E assim foi possível alcançar resultados surpreendentes, prova da genialidade do autor de "Memórias Póstumas de Brás Cubas".

Machado de Assis aos 25 anos
Machado de Assis aos 25 anos - Domínio público

Como pude registrar no livro "O Olhar Pedagógico em Machado de Assis" (ed. Expressão e Cultura), em 1999, Machado foi autor de frases emblemáticas, como a que se refere à gramática: "É um alto serviço a uma língua e a um país".

Seus textos tratavam do relacionamento entre professores e alunos. Eram relações escolares difíceis e perigosas, deixando as conclusões para o próprio leitor.

O curioso é que os seus personagens infantis não apreciavam muito a escola. Em "Umas Férias", José Martins afirma que "gostava de folgar, não gostava de aprender". Mais adiante, diz que "era ocasião de deitar à fogueira o livro da escola", para concluir que "aprender é muito aborrecido". Sempre que podia, fustigava a escola e a pedagogia do seu tempo. Depois, chama a escola de "enfadonha". E, em "Brás Cubas", cita a "benta palmatória", tão criticada pelos autores modernos.

Numa seleção de frases, num dado momento, afirmou que "tudo morre, até a esperança". Já no clássico "Quincas Borba", deixou a ideia de que "em política, a primeira coisa que se perde é a liberdade". Está no mesmo livro. Em seguida, outro pensamento: "Toda a sabedoria humana não vale um par de botas curtas".

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Há fagulhas pedagógicas em todos os seus trabalhos. Tem sempre uma lição, mesmo que não fosse essa a sua intenção. Elas demonstravam grande entendimento do que seja a nossa alma. Citava a existência de castigos, a valorização das línguas estrangeiras e o pouco prestígio à educação feminina. Tudo com estilo irônico e cuidadosa estrutura vocabular.

Junto com suas afirmações, há espanto e encantamento com o mundo. Como fazem os bons mestres, com o objetivo de não apenas ensinar, mas para servir de inspiração, Machado se referia ao prazer de ler, numa obra verdadeiramente universal e, na verdade, atemporal. Essa é a magia do universo machadiano, ainda hoje muito apreciado.

Machado nasceu em 1839, ano em que também nasceram Casimiro de Abreu e Tobias Barreto. Foi funcionário público (Imprensa Nacional), contista, poeta, cronista e autor teatral. Autor de mais de 200 contos, ao lado de 600 crônicas, traçou de forma competente os conflitos da nossa alma. Ocupou-se da miséria do ser, com a visão moral presente em sua obra: "Não inventei nada; é a realidade pura". Machado é uma glória da cultura brasileira.

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