O PSD, partido dirigido por Gilberto Kassab, secretário de Governo da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), multiplicou por sete o número de prefeitos no estado de São Paulo desde dezembro de 2022 —de 46 para 329.
Isso significa que Kassab, que também tem boa relação com o governo Lula (PT), domina atualmente 51% das 645 prefeituras do estado. Considerado homem forte da gestão Tarcísio, o presidente do PSD é responsável pela relação do Palácio dos Bandeirantes com prefeitos e deputados, além de controlar o repasse de emendas e convênios.
A movimentação em massa de prefeitos a partir de dezembro reflete a principal mudança na política paulista desde então —o fim dos quase 30 anos de poder do PSDB com a derrota do tucano Rodrigo Garcia. Em seu lugar, ascenderam PSD, Republicanos, PP e PL.
Nesse período, o PSDB minguou de 238 prefeitos para 43. O partido atravessa uma nova crise com a decisão da executiva nacional, comandada por Eduardo Leite (PSDB), de suspender a convenção estadual e interferir no comando do diretório paulista. O clima de conflagração se repete em nível nacional e na capital paulista.
A Folha questionou outros partidos, além de PSD e PSDB, sobre seu número atual de prefeitos. Já a quantidade de prefeituras de cada sigla em dezembro de 2022 foi obtida por meio do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo.
Desde dezembro passado, o Republicanos, partido de Tarcísio, também cresceu, mas não na proporção do PSD —foi de 25 para 54 prefeitos, ou seja, praticamente dobrou.
A segunda maior legenda em número de prefeitos em São Paulo é o MDB, que passou de 58 para 73. O PL, de Jair Bolsonaro, saiu de 39 para 56. Já o PP tinha 32 e agora tem 42.
Além do PSDB, a União Brasil, que foi o principal partido aliado dos tucanos no estado, também perdeu prefeitos: tinha 75 e agora, 27.
No campo da oposição, PT e PSB mantiveram estabilidade. O partido dos ex-governadores Márcio França (PSB) e Geraldo Alckmin (PSB) tem 10 prefeitos —eram 9 em dezembro.
Os petistas, por sua vez, têm uma dificuldade histórica entre os eleitores do interior de São Paulo. Em 2020, elegeram apenas quatro prefeitos —número que não se alterou.
Para dirigentes partidários ouvidos pela reportagem, a eleição municipal de 2024 deve alterar o quadro, mas a dominação de legendas do centrão em detrimento do PSDB é um cenário que deve se consolidar.
Ao contrário de vereadores e deputados, os prefeitos não precisam esperar a janela partidária que antecede cada eleição para mudar de sigla. Por isso, é comum que eles busquem aderir às legendas governistas da ocasião.
O fluxo de prefeitos rumo ao PSD tem gerado reclamação na cúpula de outros partidos da base de Tarcísio, que veem chantagem e intimidação por parte de Kassab. Nos bastidores, eles afirmam que seus filiados mudam para o PSD com a promessa de receberem mais recursos para seus municípios.
Entre os prefeitos que Kassab filiou nos últimos meses estão os de cidades como Bauru, Barretos, Mairiporã e Bertioga.
O secretário afirma que não faz política partidária no Palácio dos Bandeirantes e nega haver qualquer promessa ou benefício para os prefeitos que entram no PSD.
"O atendimento do governo é republicano, sem distinção de partidos. Esse aumento de prefeitos do PSD reflete uma nova circunstância política no estado de São Paulo. Foi uma mudança não de cooptação, mas de sintonização dos novos ventos da política. Ventos que têm Tarcísio como líder", diz Kassab.
Políticos ouvidos pela reportagem apontam ainda um crescimento artificial do PSDB nos anos finais da gestão de João Doria e Rodrigo Garcia. Em 2020, o partido elegeu 172 nomes, mas o governo buscou novas filiações. PSD e PTB foram as siglas que mais perderem prefeitos para a máquina tucana entre 2020 e 2022.
O presidente do PSDB paulista, Marco Vinholi, era o secretário de Desenvolvimento Regional na época, exercendo uma função parecida com a de Kassab hoje, isto é, controlando o fluxo de verba para os municípios.
Em 2021, Doria precisava do voto de prefeitos tucanos no estado para derrotar Eduardo Leite nas prévias presidenciais, o que ensejou a corrida por filiados. A campanha do gaúcho chegou a denunciar 51 filiações de prefeitos irregulares.
Procurado pela Folha, o presidente da federação PSDB-Cidadania no estado, Paulo Serra, diz que o momento é de transição, que há perspectiva positiva no futuro e que a perda de prefeitos era esperada.
"Lógico que numericamente fica clara a diminuição. Talvez tenha sido uma queda muito grande porque também o partido de alguma forma cresceu de maneira artificial. A gente tem trabalhado para, a partir de 2024, com bons quadros e candidatos, começar a reverter essa curva", afirma.
Depois da derrota de Rodrigo Garcia, que não chegou ao segundo turno mesmo com o apoio da maioria dos prefeitos, líderes partidários têm pontuado que a quantidade de mandatários não é necessariamente uma vantagem.
Dirigentes de siglas como Republicanos, PP e mesmo PSDB dizem que seu objetivo não é acumular cada vez mais prefeituras, mas sim manter os prefeitos que se identifiquem com as propostas e a identidade das respectivas legendas.
Bruno Silva, pesquisador do Laboratório de Política e Governo da Unesp Araraquara, diz que um dos fatores que explica o crescimento do PSDB nos anos anteriores é a relação de proximidade do então vice Rodrigo Garcia com prefeitos no interior do estado —vácuo que foi ocupado por Kassab.
Para ele, o aumento de prefeitos do PSD está ligado ao projeto político expansionista do partido e ao controle de Kassab sobre o cofre do estado.
Lara Mesquita, cientista política e professora da FGV, afirma que o crescimento variado dos partidos tem relação com suas diferentes estratégias.
Ela aponta que o PL é o partido mais atrativo para os prefeitos que vão disputar a eleição municipal por deter a maior parte do fundo eleitoral, mas, apesar disso, o PSD pode ter sido mais eficiente na mobilização, oferecendo acesso aos recursos do estado. Já o Republicanos, diz, é um partido que opta pelo crescimento orgânico, que prefere filiar apenas aqueles que queiram permanecer ali.
Silva aponta ainda que, para alguns prefeitos, o PSD pode ser mais atrativo do que outros partidos da base, como PL e Republicanos, "por estar dentro do governo do estado, mas não estar associado ao bolsonarismo".
"O PSD é um aliado de primeira hora no Governo de São Paulo, mas tem todas as portas abertas em Brasília, junto ao governo federal. É o caso também do MDB, que tem vocação municipalista e capilaridade", completa.
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