terça-feira, 18 de julho de 2023

Por que devemos politizar o clima, Paul Krugman. FSP

 THE NEW YORK TIMES

Depois de iniciar oficialmente sua campanha presidencial, Ron DeSantis foi questionado sobre a mudança climática. Ele afastou o assunto: "Sempre rejeitei a politização do clima".

Mas nós devemos absolutamente politizar o clima. Na prática, a política ambiental provavelmente não será um tema central na campanha de 2024, que irá girar principalmente em torno da economia e de questões sociais. Ainda assim, estamos vivendo uma época de aceleração dos desastres relacionados ao clima, e o extremismo ambiental do Partido Republicano –ele é mais hostil à ação climática do que qualquer outro grande partido político no mundo avançado– seria, num debate político mais racional, a principal questão eleitoral.

Primeiro, o pano de fundo ambiental: estamos apenas na metade de 2023, mas já vimos vários eventos climáticos que teriam sido chocantes não muito tempo atrás. Globalmente, o mês passado foi o junho mais quente já registrado. Ondas de calor sem precedentes têm atingido uma região do mundo após a outra: o sul da Ásia e o Oriente Médio experimentaram uma onda de calor com risco de vida em maio; a Europa agora está passando por sua segunda onda de calor catastrófica em um curto período de tempo; a China experimenta as temperaturas mais altas já registradas; e grande parte do sul dos Estados Unidos sofre com níveis perigosos de calor há semanas, sem fim à vista.

Imagem mostra área de vegetação devastada por fogo
Área da floresta amazônica que foi queimada para limpar a terra para pastagens de gado, em Novo Progresso (PA) - Nacho Doce - 11.nov.13/Reuters

Os moradores da Flórida podem ficar tentados a dar um mergulho refrescante no mar –mas as temperaturas do oceano no sul da Flórida chegaram perto de 38 ºC, não muito abaixo da de uma banheira de hidromassagem.

Embora o resto dos Estados Unidos não tenha ficado tão quente, todos no Nordeste se lembram da fumaça dos incêndios florestais canadenses, que causaram dias com qualidade do ar perigosamente baixa e céus alaranjados.

Mas os eventos climáticos extremos sempre existiram. Podemos provar que a mudança climática causou algum desastre em particular? Não exatamente. Mas o campo incipiente de "atribuição de eventos extremos" chega perto. Os modelos climáticos dizem que certos tipos de eventos extremos se tornam mais prováveis em um planeta em aquecimento –por exemplo, o que costumava ser uma onda de calor que experimentávamos em média uma vez a cada poucas décadas torna-se uma ocorrência quase anual. A atribuição de eventos compara a probabilidade de experimentarmos um evento extremo devido ao aquecimento global com a probabilidade de que o mesmo evento teria acontecido sem a mudança climática.

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Aliás, eu diria que a atribuição de eventos extremos ganha credibilidade pelo fato de que nem sempre conta a mesma história, que às vezes diz que a mudança climática não foi a culpada. Por exemplo, análises preliminares sugerem que a mudança climática desempenhou um papel limitado nas inundações extremas que atingiram recentemente o nordeste da Itália.

Essa foi, no entanto, a exceção que confirma a regra. Em geral, a análise de atribuição mostra que o aquecimento global tornou os desastres dos últimos anos muito mais prováveis. Ainda não temos estimativas para as últimas séries de desastres ainda em curso, mas parece seguro dizer que esta concatenação global de eventos climáticos extremos teria sido virtualmente impossível sem a mudança climática. E isso é quase certamente apenas a ponta da crise, uma pequena amostra dos muitos desastres que virão.

O que me traz de volta à "politização do clima". Preocupar-se com a crise climática não deveria ser uma questão partidária. Mas é, pelo menos neste país. No ano passado, apenas 22% dos americanos que se diziam de direita em política consideravam a mudança climática uma grande ameaça; a lacuna esquerda-direita aqui era muito maior do que em outros países. E apenas nos EUA você vê coisas como os republicanos do Texas tentando ativamente minar o crescente setor de energia renovável de seu próprio estado.

O notável sobre a negação do clima é que os argumentos não mudaram ao longo dos anos: a mudança climática não está acontecendo; OK, está acontecendo, mas não é uma coisa tão ruim; além disso, fazer qualquer coisa a respeito seria um desastre econômico.

E nenhum desses argumentos é abandonado diante das evidências. Da próxima vez que houver um período de frio em algum lugar dos EUA, os suspeitos de sempre afirmarão mais uma vez que a mudança climática é uma farsa. O espetacular progresso tecnológico em energia renovável, que agora faz com que o caminho para emissões bastante reduzidas pareça mais fácil do que imaginavam os otimistas, não impediu as afirmações de que os custos da política climática do governo Biden serão insustentáveis.

Portanto, não devemos esperar ondas de calor recorde em todo o mundo para acabar com as alegações de que a mudança climática, mesmo que esteja acontecendo, não é grande coisa. Também não devemos esperar que os republicanos reduzam sua oposição à ação climática, não importa o que aconteça no mundo.

O que isso significa é que, se o Partido Republicano ganhar o controle da Casa Branca e do Congresso no próximo ano, quase certamente tentará desmantelar a série de subsídios à energia verde promulgada pelo governo Biden, que os especialistas acreditam que levará a uma grande redução nas emissões.

Portanto, queiram ou não, o clima é uma questão política. E os americanos devem estar cientes de que é uma das questões mais importantes sobre a qual eles votarão em novembro próximo.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves


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