Um homem conhecido como paciente de Genebra mostrou sinais de remissão do HIV a longo prazo depois de receber um transplante de medula óssea.
A novidade é que a medula óssea que ele recebeu não tem uma mutação, já detectada por cientistas, que consegue bloquear o vírus.
Seu caso foi apresentado nesta quinta-feira (20) em Brisbane, antes da Conferência da Sociedade Internacional da Aids que começa no próximo domingo (23) na Austrália.
Antes dele, outras cinco pessoas já foram consideradas como provavelmente curadas após terem recebido um transplante de medula óssea.
Todos os pacientes anteriores tinham uma situação muito particular em comum: sofriam de câncer de sangue e se beneficiaram de um transplante de células-tronco que renovaram profundamente seu sistema imunológico.
Porém, em todos esses casos, os doadores apresentavam uma rara mutação, de um gene conhecido como CCR5 delta 32, que previne a entrada do HIV nas células.
Com o paciente de Genebra, a situação é diferente: em 2018, para tratar uma forma de leucemia especialmente agressiva, fez um transplante de células-tronco. No entanto, desta vez, o transplante veio de um doador que não portava a famosa mutação CCR5.
SEM RASTRO DO VÍRUS
Vinte meses depois de ter interrompido o tratamento antirretroviral, o vírus continua sem ser detectado em seu corpo.
O paciente é acompanhado pelos Hospitais Universitários de Genebra, em colaboração com o Instituto Pasteur, o Instituto Cochin e o consórcio internacional IciStem.
Seu tratamento antirretroviral foi reduzido lentamente e suspenso em definitivo em novembro de 2021.
As equipes científicas não descartam que o vírus ainda persista, mas consideram que se trata de uma nova remissão da infecção pelo HIV.
Dois casos anteriores, conhecidos como os pacientes de Boston, também receberam células-tronco normais durante seus transplantes. Entretanto, em ambos os casos, o HIV retornou nesses pacientes alguns meses depois de pararem de tomar antirretrovirais.
Asier Saez-Cirion, cientista espanhol do Instituto Pasteur da França, que apresentou o caso do paciente de Genebra em Brisbane, disse à AFP que, se não há sinais do vírus depois de 12 meses, "a probabilidade de que seja indetectável no futuro aumenta significativamente".
Há algumas possíveis explicações por que o paciente de Genebra permanece livre do HIV, disse Saez-Cirion. "Neste caso específico, talvez o transplante eliminou todas as células infectadas sem necessidade da famosa mutação", disse. "Ou talvez seu tratamento imunossupressor, solicitado depois do transplante, teve um papel."
Sharon Lewin, presidente da Sociedade Internacional de Aids, que celebrou a conferência científica sobre o HIV em Brisbane, disse que o caso era promissor.
"Porém aprendemos com os pacientes de Boston que apenas uma partícula do vírus pode provocar um rebote do HIV", advertiu. "Esse indivíduo em particular deverá ser monitorado rigorosamente durante os próximos meses e anos."
Apesar desses casos de remissão a longo prazo gerarem esperanças de uma cura para o HIV um dia, o agressivo e arriscado procedimento de transplante de medula óssea não é uma opção para milhões de pessoas que vivem com o vírus em todo o mundo.
Existem casos de transplante em que ocorre algo chamado de "doença do enxerto contra o hospedeiro". Ele consiste no ataque a órgãos do transplantado por parte das células da medula óssea do doador.
No entanto, o paciente de Genebra traz esperanças de que os casos de remissão possam indicar novas vias de pesquisa, como o papel potencial dos tratamentos imunossupressores.
Saez-Cirion disse que o caso também motivou os cientistas a continuarem estudando as células imunes inatas, que atuam na linha de frente da defesa contra vários patógenos.
CASOS SEMELHANTES
A primeira pessoa com HIV curada foi Timothy Ray Brown, também conhecido como "paciente de Berlim". Nascido nos Estados Unidos, ele foi diagnosticado com HIV em 1995, quando vivia na Alemanha, e em 2006 recebeu o diagnóstico de leucemia.
O segundo homem curado, Adam Castillejo, ficou conhecido como "paciente de Londres". Ele tinha linfoma de Hodgkin e passou pelo transplante de medula com material de um doador com a mutação no gene em maio de 2016. Em setembro de 2017, Castillejo deixou de tomar drogas anti-HIV e seus exames de sangue não apresentaram mais sinais do vírus.
Em fevereiro de 2022, pesquisadores anunciaram o terceiro caso de cura, dessa vez envolvendo uma mulher submetida a um tratamento diferente. A paciente, que como Brown tinha leucemia, foi atendida no Weill Medical College, em Nova York, e recebeu sangue do cordão umbilical de um doador com a mutação no CCR5 e células-tronco sanguíneas parcialmente compatíveis de um parente de primeiro grau.
Pouco tempo depois, em julho, foi divulgado o quarto caso de cura do HIV. O homem de 66 anos, que não quis revelar sua identidade, recebeu o apelido de "paciente de City of Hope" (em tradução livre, cidade da esperança) em referência à unidade de saúde da Califórnia em que foi tratado.
E o quinto curado foi divulgado em fevereiro deste ano: um homem de 53 anos que passou por um transplante de células-tronco em 2013, como parte do tratamento para leucemia. Após o procedimento, no qual recebeu material de um doador com uma mutação no gene CCR5, o "paciente de Düsseldorf" conseguiu interromper o tratamento que fazia contra o HIV. Nas análises que fizeram, os pesquisadores não encontraram vestígio de partículas virais, reservas virais ou resposta imune contra o vírus no corpo dele.
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