RIO – As importações de diesel russo voltaram a bater recorde em junho. A Rússia é, desde abril, a maior fonte de diesel do Brasil no mercado mundial, superando a liderança histórica dos Estados Unidos.
No mês passado, 64,1% de todo o diesel importado pelo Brasil veio da Rússia, ante a fatia de 12,4% dos EUA.
Ao todo, os russos forneceram 697 milhões de litros para o mercado brasileiro em junho – 6,7% a mais que o recorde anterior, de maio, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).
No acumulado do ano, a Rússia representa 33,8% de todo o diesel importado pelo Brasil – acima dos 30% dos Estados Unidos.
Historicamente pouco relevantes, as importações do diesel de origem russa dispararam nos últimos meses, em meio a mudanças no fluxo do comércio global de combustíveis desde o início da guerra na Ucrânia, em 2022.
Estrangulada por sanções das potências ocidentais, a Rússia tem buscado novos mercados e oferecido descontos aos compradores.
Um novo desenho no mercado global
Desde o início da invasão russa à Ucrânia, em fevereiro de 2022, as potências ocidentais reagiram com uma série de pacotes de sanções econômicas a Moscou.
A resposta da União Europeia definiu uma curva gradual para interrupção das importações de petróleo e derivados da Rússia. Desde fevereiro, os países do bloco estão proibidos de comprar combustíveis russos.
A Rússia perdeu, então, seu principal mercado consumidor – a Europa – e passou a buscar novos destinos para suas cargas. Para isso, no entanto, os refinadores russos tiveram que baixar seus preços.
Os descontos sobre o petróleo e derivados russos atraíram o interesse de países como Índia e China, na Ásia.
A guerra da Ucrânia redesenhou por completo a dinâmica do mercado e na América Latina não foi diferente.
Atraído pelo aquecimento da demanda europeia – e pelos prêmios pagos por lá pelos produtos alternativos aos russos – os EUA deslocaram parte de sua produção (e estoques) de derivados para a UE.
O Brasil passou, então, a concorrer com a Europa na atração dos barris americanos. E teve de recorrer a supridores alternativos – como a Rússia.
Veja, a seguir, como os russos se tornaram cada vez mais relevantes para o abastecimento do mercado brasileiro, substituindo um papel historicamente desempenhado pelos Estados Unidos.
Brasil não adota sanções contra Rússia
Apesar das sanções impostas pelas potências ocidentais, o Brasil não seguiu o mesmo caminho e não existe, portanto, um impeditivo, do ponto de vista legal, para o comércio com os russos.
Empresas interessadas em importar diesel da Rússia, contudo, podem esbarrar em retaliações no mercado financeiro – seja no processamento de pagamentos e acesso a crédito, seja por pressão de investidores institucionais.
É o que fez alguns importadores tradicionais do Brasil se manterem distantes dos barris russos, num primeiro momento.
As importações de diesel russo têm sido destinadas, sobretudo, a distribuidoras regionais – que têm conseguido, com isso, ganhos de competitividade em relação às líderes de mercado.
A Raízen, uma das três líderes do mercado de distribuição no país, contudo, já sinalizou que poderia mudar de posição para se manter bastante competitiva.
De acordo com a S&P Global Commodity Insights, os grandes players do setor começaram a comprar barris russos com desconto. E cita que, em julho, a Rússia vem se mantendo como principal supridora do mercado brasileiro.
A especialista em combustíveis da Argus, Amance Boutin, comenta que a presença do diesel da Rússia no mercado brasileiro aumentou, em junho, justamente porque o número de agentes que estão comprando o produto de origem russa está aumentando.
O aumento das importações russas reflete, em certa medida, o pragmatismo da política externa brasileira na questão da guerra da Ucrânia.
As conversas para compra de diesel russo foram desenhadas ainda no governo de Jair Bolsonaro, em 2022.
Em sua busca por maior protagonismo na política internacional, Lula tem mantido a relação aberta com as grandes potências ocidentais e, ao mesmo tempo, faz acenos ao Oriente – chegando a gerar ruídos na relação diplomática com os EUA.
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