Bolsonaro quer reduzir peso do Estado, mas corre risco de cortar serviços importantes
BRASÍLIA
O futuro governo promete aplicar um tratamento de choque à burocracia. Seria um avanço reformar estruturas que gastam bilhões, abrem portas para a corrupção e dificultam a atividade econômica. Tudo indica, porém, que Jair Bolsonaro quer começar pelo lugar errado.
Ao anunciar que uma de suas prioridades será revogar rapidamente "inúmeras regulamentações em todos os setores", o presidente eleito só acerta pela metade. A pregação geral contra normas e fiscalizações escorrega na surrada metáfora que alerta contra o risco de se jogar o bebê fora junto com a água do banho.
Bolsonaro afirma desde a campanha que os órgãos de controle aplicam multas em excesso e que as exigências burocráticas atrapalham o desenvolvimento. A ira contra a ineficiência do Estado pode fazer sucesso, mas deixar de aplicar as regras não vai resolver o problema.
O futuro presidente do Ibama disse na semana passada ao jornal O Estado de S. Paulo que o licenciamento ambiental no Brasil é precário. Dada a lentidão do processo, é justo afirmar que ele tem razão.
Mas Eduardo Bim sugere um sistema de licença automática aos agricultores. Eles mesmos preencheriam um cadastro declarando estarem em dia com a preservação de suas propriedades. "Devemos acreditar na palavra do cidadão", disse.
Essa confiança exagerada nos produtores também move a futura ministra da Agricultura. Tereza Cristina declarou que o governo não deveria fiscalizar diariamente os frigoríficos, e que as próprias empresas podem inspecionar suas unidades.
Em uma economia madura, a autorregulação poderia funcionar, mas algumas normas são importantes para garantir a proteção do meio ambiente e a saúde dos cidadãos, por exemplo. Cabe estudar com cautela o que pode ser aprimorado.
A flexibilização das regras pode facilitar a vida do produtor que já cumpre a lei, mas o governo eleito sob o signo do combate à corrupção corre o risco de também aliviar a barra até de alguns frigoríficos picaretas.
Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).
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