Guilherme Seto
SÃO PAULO
A gestão Bruno Covas (PSDB) quer autorização da Câmara Municipal para utilizar recursos da privatização ou da concessão de equipamentos públicos para cobrir o rombo da previdência da cidade de São Paulo. A proposta consta de nova versão do projeto de reforma da previdência local, enviada aos vereadores com a perspectiva de que votem nesta sexta-feira (21).
O texto prevê a possibilidade de utilização do dinheiro levantado por meio da venda ou da concessão de bens, como o estádio do Pacaembu ou o parque Ibirapuera, para pagar a parte da prefeitura nas aposentadorias dos servidores (contribuição patronal) ou para cobrir a "insuficiência financeira" do regime previdenciário.
Quando concebido no início da gestão tucana, com João Doria (PSDB)como prefeito e Covas seu vice, o projeto de desestatização previa que todos os recursos levantados seriam destinados a investimentos nas áreas de saúde, educação, habitação, assistência social, segurança, transporte e mobilidade urbana.
O então prefeito, agora governador eleito do estado, defendia a desestatização com o argumento de que a gestão abriria mão de ativos para fazer investimentos sociais.
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O fundo de desestatização, que, segundo Covas, deve chegar a US$ 1,5 bilhão (R$ 5,8 bilhões em valores atuais), já foi parcialmente desfigurado em maio, quando vereadores abriram a possibilidade de que o dinheiro fosse utilizado em prefeituras regionais, locais em que os membros do Legislativo têm forte poder de influência.
Na ocasião, o então secretário de Desestatização, Wilson Poit, colocou o cargo à disposição, mas foi convencido por Covas a permanecer no cargo até o final deste ano.
Durante sua passagem pela prefeitura, Doria repetiu inúmeras vezes que o dinheiro das desestatizações iria para investimento, e não para custeio. Mas agora o próprio texto do substitutivo fala em "destinar até 100% dos recursos obtidos com alienação de bens e direitos de qualquer natureza, inclusive os mencionados pelo art. 7º, da Lei nº 16.651, de 16 de maio de 2017, para o custeio da contribuição patronal ou da insuficiência financeira do regime próprio de previdência dos servidores municipais".
Atualmente, os equipamentos públicos mais próximos de serem passados à iniciativa privada são o Anhembi (leilão marcado para 30 de janeiro), o primeiro pacote de parques (incluindo o Ibirapuera), o estádio do Pacaembu e o mercado de Santo Amaro.
Como adiantado pela Folha, a nova versão do projeto de reforma da previdência municipal mantém a alta da alíquota dos servidores de 11% para 14%, assim como a implementação de um sistema de previdência complementar para quem ganha acima do teto de aposentadoria (R$ 5.645,80) do INSS.
Por outro lado, a gestão Covas abrirá mão de um dos pilares da reforma da previdência paulistana: a mudança estrutural no modelo de financiamento dos benefícios. No sistema atual, de repartição simples, os trabalhadores da ativa custeiam os benefícios de aposentados atuais.
O plano original do governo Covas era adotar um sistema de capitalização para os novos funcionários públicos, no qual cada um teria uma conta individual, para que a previdência fosse autossustentável no futuro, sem depender da contribuição de outros servidores.
Na prática, a mudança evitaria a necessidade de complementação de verba do poder público no futuro, mas a gestão Covas avaliou que o custo de transição de um regime para outro seria muito alto, e que os efeitos seriam incertos.
Principais responsáveis pelo debate da previdência em âmbito municipal, os ex-secretários Paulo Uebel (Gestão) e Caio Megale (Fazenda) rejeitaram diversas vezes a retirada do sistema de capitalização do projeto. Com a saída de ambos da prefeitura e a chegada de Mauro Ricardo (Governo) e Philippe Duchateau (Fazenda), a manutenção do regime de repartição simples foi consolidada.
Segundo cálculos preliminares da prefeitura, a elevação da alíquota e a adoção de um sistema de previdência complementar, que continuam no projeto, já gerariam R$ 370 milhões a mais de recursos anualmente. O déficit hoje é estimado em R$ 6 bilhões, crescendo perto de R$ 700 milhões a cada ano.
Pelo projeto original, ele pararia de crescer em 2025, atingindo um ponto de equilíbrio —e só acabaria em 2092, quando não haveria mais funcionários nesse sistema.
Com a proposta mais branda, no entanto, sem a reestruturação do sistema, não haverá equacionamento natural do déficit.
Diferentes organizações de representação de servidores convocaram manifestação contra a reforma para esta sexta-feira (21), a partir das 13h, em frente ao prédio da Câmara, no centro de São Paulo. Em março, quando mobilizações do tipo e greve fizeram com que o projeto fosse retirado da pauta, cerca de 30 mil manifestantes cercaram a sede do Legislativo municipal.
Por meio de nota da assessoria de imprensa, a Prefeitura de São Paulo afirma que "o artigo 44 da Lei de Responsabilidade Fiscal permite que a receita de alienação de bens seja destinada às despesas com o regime próprio de previdência, desde que autorizado por lei. A Prefeitura está, portanto, fazendo uso das possibilidades que a LRF oferece."
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