domingo, 9 de dezembro de 2018

De Manchinha@auau para Todo Mundo, Elio Gaspari ,FSP

O segurança do Carrefour acabou com minha vida de cachorro, mas vocês devem pensar mais nos bípedes

Amigos,
Estou aqui com o “Juquinha”, ele era o cachorro do Sérgio Cabral, gostava da casa de Mangaratiba, mas morria de medo quando era posto no helicóptero do governo do Rio. “Juquinha” veio para cá em 2015, antes que seu poderoso dono fosse para a cadeia.
Eu era um cachorro de rua, vivia em Osasco e comia o que me davam num supermercado Carrefour. Um bípede me atacou com uma barra e acabei morrendo quando me levaram para uma unidade de atendimento de bichos. A empresa culpa os agentes da prefeitura e eles culpam o segurança. Não me meto, pois isso é briga de gente grande.
Em nome dos animais agradeço comovido a solidariedade que recebi. Milhares de pessoas manifestaram-se, a polícia abriu inquérito, o Ministério Público está investigando o caso e a Secretaria da Segurança lastimou a minha morte. O Carrefour informou que “repudia qualquer tipo de maus-tratos contra animais”. Cão que ladra não morde. E vocês?
O Juquinha ouvia todas as conversas de Sérgio Cabral. Ele dizia que as favelas do Rio eram fábricas de marginais, era aplaudido, eleito e reeleito. Conselho de cachorro: direcionem melhor suas indignações.
Faz tempo, os seguranças de um supermercado Carrefour do Rio entregaram a bandidos de Cidade de Deus duas senhoras flagradas roubando protetores solares. Elas foram espancadas até que uma
patrulha da PM as salvou.
Naquele episódio o Carrefour divulgou uma primeira nota informando que afastou os seguranças e abriu uma sindicância. Só. Repúdio, nem pensar. (Qualquer cão sabia que empresas recorriam a milicianos associados a bandidos para proteger seus negócios. Deu no que deu.)
Vira e mexe, vocês leem que agentes da segurança pública entraram em bairros de pessoas pobres, confrontaram-se com bandidos e mataram “suspeitos”. Nossa inteligência canina não entende o que seria um “suspeito”. De quê? Em casos extremos, dois “suspeitos” de portar armas foram abatidos. Um carregava uma furadeira e o outro, um guarda-chuva.
Cachorro não vive de atacar cachorro. Sou um vira-lata e convivi bem com os outros quadrúpedes. Nós somos amigos dos bípedes e o mundo viu o “Sully” deitado junto ao caixão do George Bush, pai.
Vocês é que atacam os outros.
Reclamem sempre que um bicho for maltratado, mas eu o “Juquinha” sugerimos que cuidem também dos bípedes. Saudações caninas.
Manchinha
Manifestantes protestam no estacionamento do supermercado Carrefour, em Osasco, onde morreu o cachorro Manchinha - Taba Benedicto/Folhapress
Frituras
Em qualquer país e em qualquer governo, as semanas que antecedem a formação de um ministério são aquelas em que acontecem as grandes frituras.
O senador Magno Malta fritou-se em óleo quente. Algum dia Bolsonaro dirá quais foram os critérios em que o seu “vice dos sonhos” não se “enquadrou”.
O advogado Gustavo Bebianno, soldado de Bolsonaro desde a primeira hora, poderia ter sido chefe da Casa Civil e ministro da Justiça, mas tornou-se Secretário-Geral da Presidência, com um general da reserva na secretaria-executiva.
O deputado Onyx Lorenzoni, outro veterano da campanha, foi para uma Casa Civil fatiada, com outro general da reserva na Secretaria de Governo.
Caos trumpesco
Donald Trump usa sua conta numa rede social para centralizar a voz do seu governo. A turma de Jair Bolsonaro usa as suas para articular o caos.
Falta menos de um mês para a posse e os bate-bocas do pessoalsuperam, de muito, os ataques da oposição.
Nem o PT com suas facções fazia tanto barulho com o fogo amigo.
Gatilho rápido
Jair Bolsonaro precisa ser rápido no gatilho no caso do PM que foi motorista de seu filho e movimentou R$ 1,2 milhão em 12 meses (R$ 100 mil por mês). Um cheque de R$ 24 mil foi para Michelle, sua mulher.
Mão de Moro
Tem gente convencida de que o futuro ministro Sergio Moro tentará colocar o procurador Deltan Dallagnol na Procuradoria-Geral da República quando terminar o mandato de Raquel Dodge.
Um mestre
Sergio Moro deveria dar uma olhada na atuação do procurador Robert Mueller, que está infernizando a vida de Donald Trump.
Ele dirigiu a Polícia Federal americana por 12 anos. Excedeu o prazo permitido por lei e foi mantido por decisão especial e unânime do Congresso.
Como Moro, ele gosta de botar delinquentes na cadeia, mas enquanto esteve no FBI só abriu a boca para louvar seus agentes. Agora, não diz nem bom dia à imprensa.
Essa conduta tem uma explicação: o FBI foi criado e dirigido por 48 anos por J. Edgar Hoover, um mastim que emparedava presidentes e manipulava a imprensa com a destreza de um bailarino.
Eremildo, o idiota
Eremildo é um idiota e pediram-lhe para julgar a atitude do ministro Ricardo Lewandowski ameaçando prender um cidadão que lhe disse ter vergonha do Supremo Tribunal Federal.
Foi carteirada ou defesa da instituição? O cretino refletiu, analisou os últimos julgamentos do Supremo e decidiu pedir vista.
Eremildo acredita que se aquele projeto de maio de 1888 fosse mandado ao STF, algum ministro teria pedido vista.
Sábio
De um parlamentar que conhece o chão do Congresso e os salões do governo, ao ouvir falar das virtudes e consistência da “bancadas temáticas”:
“Não adianta você oferecer remédio para quem acha que não está doente”.
Parlamentares experientes ficam na arquibancada durante os primeiros meses de novos governos e de novas legislaturas. Dali estudam as equipes em campo.
Delírio
Antes da instalação de um novo governo os poderosos da ocasião podem tudo, inclusive delirar.
Do entorno de Jair Bolsonaro saiu a informação de que o juiz Marcelo Bretas poderia ser nomeado para o Superior Tribunal de Justiça. Podem até querer que ele voe, mas para o STJ não podem mandá-lo.
Bretas é um juiz federal da primeira instância. A Constituição prevê que o STJ seja composto por desembargadores federais, estaduais, procuradores e advogados de militância privada.
Todos precisam entrar em listas tríplices saídas do próprio STJ. Só então é que o caso se resolve com a caneta do presidente.
Às vezes, é mais fácil nomear um desembargador para o Supremo do que para o STJ. Foi o que ocorreu com Ricardo Lewandowski e Ellen Gracie.
Mais uma tunga
Enquanto alguns livreiros e editores tentam tabelar o preço dos livros, proibindo descontos superiores a 10% no primeiro ano das vendas, apareceu uma nova tunga, desta vez vinda da Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados. Foi aprovado um projeto obrigando as editoras a oferecer de graça as versões eletrônicas dos livros aos compradores das obras impressas.
Uma coisa nada tem a ver com a outra. Os ebooks geralmente são mais baratos, mas suas edições implicam em custos adicionais. São dois mercados diferentes e a proposta serviria apenas para encarecer os livros.
O que parece uma ideia que favorece o consumidor acaba sendo o oposto. Quem quer um livro de papel acaba obrigado a pagar mais, para receber uma coisa que não quer. E quem quer só ebook acaba pagando pelo volume de papel, que não lhe interessava.
Elio Gaspari
Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

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