“Pela supressão dos partidos políticos.” Não, essa ideia não é de JairBolsonaro nem de nenhum dos líderes associados à direita autoritária que ganharam eleições mundo afora. Ela é da filósofa francesa SimoneWeil (1909-43), uma autora que pode ser descrita como da esquerda democrática e é defendida com paixão em um pequeno texto publicado no Brasil pela editora Âyiné.
A argumentação de Weil segue uma lógica cristalina. Para a democracia materializar-se, diz a autora, é preciso que o eleitorado faça escolhas sobre questões da vida pública (não sobre pessoas) e que esteja livre do que ela chama de “paixões coletivas”, que, numa linguagem mais contemporânea, poderíamos traduzir como “vieses cognitivos”.
Weil reconhece que o mundo real jamais produziu uma democracia plena e que não é fácil encontrar caminhos para chegar a uma. Afirma, contudo, que qualquer solução passa pela supressão dos partidos, já que eles são máquinas de produzir paixões coletivas, pressionam seus membros para seguir as deliberações da sigla (não para encontrar a verdade) e têm como finalidade sua própria sobrevivência e crescimento (não a busca do bem comum).
As objeções de Weil são respeitáveis, mas algo em seu texto, além, é claro, da conclusão de que os partidos devem ser eliminados, me incomoda. Acho que são as referências a conceitos como verdade e bem, que combinam mais com filosofias como a de Platão do que com escritos sobre política.
Eu receio que Weil, ainda que de forma não dogmática, contrabandeie ideias quase religiosas sobre o bem e a virtude para a esfera da política, o que tende a não funcionar. De qualquer modo, ela acerta em algo quando nos recrimina por confiar muito nos partidos, que, afinal, são estruturas que visam mais a introduzir vieses nas cabeças de seus membros do que a eliminá-los, como seria desejável.
Faço uma pausa de duas semanas. Bom ano!
Hélio Schwartsman
Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".
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