Lojistas de centros populares relatam alta de venda passada a eleição que debateu direito à posse
Camilla FeltrinClayton Castelani
SÃO PAULO
Vai ter tiroteio —de brincadeira— no Natal dos sobrinhos da contadora Patrícia Silva de Carvalho, 34. Na quinta-feira (6), a tia foi às compras na rua 25 de Março, no centro de São Paulo, e garantiu sete pistolas de jato d’água para os garotos, que têm entre 5 e 10 anos.
“Eles não pediram, mas eu resolvi comprar porque eles já brincam com as [armas] dos vizinhos”, afirma Carvalho, enquanto equilibrava o arsenal em um corredor lotado
de consumidores.
“Eles não pediram, mas eu resolvi comprar porque eles já brincam com as [armas] dos vizinhos”, afirma Carvalho, enquanto equilibrava o arsenal em um corredor lotado
de consumidores.
Não é de hoje que as armas de brinquedo fazem sucesso entre crianças, mas a busca pelos produtos neste ano tem impressionado lojistas do principal centro de comércio popular do país.
“Faz anos que eu tenho essas armas, mas neste ano a procura está demais”, diz o gerente da matriz da Armarinhos Fernando, Ondamar Ferreira. “Estamos vendendo cerca de 15% mais.”
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A demanda pelos itens está em alta na principal varejista do setor, a Ri Happy, que colocou modelos que disparam dardos esponjosos na lista de produtos mais desejados.
O sucesso das armas de brinquedo nas lojas da capital paulista coincide com o momento em que o debate sobre o direito de ter armas de fogo voltou à tona, com o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).
Contrária à brincadeira, a operadora de caixa Ana Karoliny de Oliveira Lima, 31, cedeu à vontade do filho de cinco anos. “Acho que o Bolsonaro é igual criança: gosta de armas. Então, tenho esperança de que o meu filho ainda vai ser presidente do Brasil.”
A batalha dos vendedores de armas de brinquedo é pelo bolso do consumidor.
Para atrair clientes, seja no comércio ambulante do central, seja em shoppings, eles oferecem opções dos mais variados calibres e munições por preços a partir de R$ 9,90.
Para o motorista Luciano de Jesus, 37, e a empresária Nívea de Jesus, 42, valeu a pena sair de Guarujá para buscar na rua 25 de Março o presente do filho do casal.
A pistola Super Gun, da Pica-Pau, saiu por menos de R$ 10. “Lá em Guarujá está por R$ 40.”
Referência na modalidade disparo de dardos de esponja, os itens da linha Nerf, da Hasbro, duram pouco nas prateleiras, segundo a promotora da fabricante Rita de Cássia Lima da Silva, 21.
“Aqui na loja, vendemos mais de 200 armas por dia”, diz a profissional que trabalha na Armarinhos Fernando, onde os modelos mais vendidos custam entre R$ 45,90 e R$ 99,90. “O estoque fica quase vazio”, diz.
Armamentos de plástico também chegaram ao comércio da rua Teodoro Sampaio, em Pinheiros, na zona oeste.
Em uma loja de presentes, pistolas fabricadas na China, que custam entre R$ 19,90 e R$ 30, passaram a dividir espaço com bijuterias. “É o que mais vendemos, mas há mães que se recusam a comprar”, diz a gerente Amanda Batista.
O Instituto Sou da Paz afirma que “seria especulação dizer que o sucesso dos brinquedos é reflexo do cenário político”, pois havia crescimento na demanda por armas mesmo antes da eleição.
Em 2017, as vendas subiram 16% em relação a 2016, segundo dados do instituto.
“O sucesso desses produtos entre as crianças é sintoma de uma sociedade violenta. Brinquedos simulam objetos do mundo dos adultos, no qual as armas sempre estiveram presentes”, diz Maria Angela Barbato Carneiro, coordenadora do Núcleo de Pesquisas do Brincar da PUC-SP.
A Abrinq (associação de fabricantes) informou que o setor espera crescimento de 8% nas vendas de todas as categorias de brinquedos.
A associação não tem levantamento específico sobre produtos, cujo ranking de vendas é classificado por grupos. Armas estão entre os esportivos.
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