Jair Bolsonaro, quando subir a rampa do Planalto na próxima terça-feira (1º) ungido por 58 milhões de votos, estará mirando o Norte como vértice de sua política externa em contraponto ao Sul-Sul dos anos Lula. À sua volta, contudo, não se sabe se haverá algum líder de peso do hemisfério mais rico.
O contraste merece atenção.
Desde que sua candidatura ganhou impulso, o novo presidente encheu de mesuras Donald Trump e Binyamin Netanyahu. Foi correspondido com acenos gentis do americano, que enviou ao país seu conselheiro John Bolton, e calorosos do israelense, que nesta sexta (28) deve chegar ao Rio para se reunir com o novo aliado.
Nesse ínterim, o Brasil fez duas inflexões importantes ao elogiar a política comercial americana quando esta era alvo de críticas na OMC e votar a favor de Israel na ONU em uma condenação ao extremista Hamas. As medidas, embora vindas da gestão atual, se inspiram mais na pretensão futura do que na posição histórica do país.
Tanta boa vontade, porém, pode ser atropelada pela mais comezinha das razões: a preocupação de Trump e de Netanyahu em salvar a própria pele.
No caso do premiê israelense, o risco ficou evidente com a hesitação diante da duração de sua viagem para o Brasil e a eventual ausência na posse.
Citando a crise em sua coalizão que o levou a antecipar as eleições gerais nas quais é favorito, Netanyahu estudava, na véspera, ficar apenas o necessário para selar a parceria.
Trump, por sua vez, nem cogitou vir. A data é inglória para compromissos, mas o americano poderia ter designado o vice, Mike Pence, para representá-lo, como fez Barack Obama em 2015 ao mandar Joe Biden à posse de Dilma Rousseff.
Em seu lugar virá o secretário de Estado, Mike Pompeo, em sinal de que o Brasil, por carecer de posição estratégica para a geopolítica americana, não está nem nunca esteve no primeiro escalão de aliados.
Com eleições em 2020, uma nova legislatura dominada pela oposição e uma investigação de conluio com russos na campanha de 2016 que pode levar a um processo de impeachment, o republicano terá pouco tempo para se dedicar ao mundo.
Com eleições em 2020, uma nova legislatura dominada pela oposição e uma investigação de conluio com russos na campanha de 2016 que pode levar a um processo de impeachment, o republicano terá pouco tempo para se dedicar ao mundo.
Não seria ruim se, no cortejo a Trump e Bibi —cuja sobrevida política pode ser menor do que se previa—, Bolsonaro não tivesse se distanciado dos europeus a ponto de trocar farpas com o governo do francês Emmanuel Macron, esquecido-se dos vizinhos (a exceção é o chileno Sebastián Piñera) e comprado briga com os árabes.
Em quatro anos, as oportunidades de melhorar o status do Brasil no mundo serão muitas. Essa, entretanto, não é a forma mais pragmática de inaugurar uma política externa que se promete desideologizada.
Luciana Coelho
Editora de Mundo, foi correspondente em Nova York, Genebra e Washington.
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