quinta-feira, 11 de julho de 2024

LUIZ FERNANDO BATISTA FRANKLIN DE MATOS (1950 - 2024) Mortes: Professor de filosofia explorou humor na teoria e na prática, FSP

 Uirá Machado

SÃO PAULO

Luiz Fernando Batista Franklin de Matos soube como poucos explorar o humor na teoria e na prática.

Em sua carreira como professor de filosofia da USP, conduziu diversas pesquisas acadêmicas sobre o riso na época do iluminismo; em sua relação com amigos e colegas, distribuiu apelidos impecáveis e disparou comentários espirituosos sobre os mais variados temas.

"Ele tinha um humor muito fino, muito rápido", diz Maria das Graças de Souza, professora de filosofia da USP e amiga de Franklin de Matos desde a década de 1970. "Ele era um contador de histórias engraçadas, alguém com quem você tinha o prazer da conversação. E ria muito", relembra.

O professor Luiz Fernando Batista Franklin de Matos
Luiz Fernando Batista Franklin de Matos (1950 - 2024) - Arquivo pessoal

Conhecido como Fanto, às vezes chamado de Sócrates, Franklin de Matos formou-se em filosofia na USP em 1972 e passou a dar aulas na universidade dois anos depois. Ao mesmo tempo, começou os estudos na pós-graduação, com um mestrado sobre Dom Quixote que se transformaria em doutorado, defendido em 1979 sob a orientação inicial de Gilda de Mello e Souza e, depois, de Otília Beatriz Fiori Arantes.

Na década seguinte, seu interesse se voltou para a filosofia e a literatura do século 18, com foco na estética teatral de Denis Diderot.

De acordo com Márcio Suzuki, colega de departamento na USP, veio daí uma das contribuições mais originais de Franklin de Matos, ao "perceber a correlação da figura do filósofo com a do comediante no pensamento diderotiano".

Em nota, Suzuki também enalteceu o papel decisivo de Franklin de Matos na consolidação dos estudos de estética no Brasil e no fortalecimento das reflexões sobre o iluminismo.

"A articulação entre filosofia e literatura que soube construir em seus escritos é seu legado inequívoco", escreveu Suzuki, que ressaltou o ensaísmo refinado do colega e comparou sua prosa filosófica com a de mestres como Bento Prado Jr. e Rubens Rodrigues Torres Filho.

A clareza e a elegância dos textos eram preocupações constantes de Franklin de Matos, e não só como autor. Durante vários anos, ele foi editor do Jornal de Resenhas, um convênio da Folha com a editora Discurso Editorial e a USP —mais tarde, outras universidades se somaram à iniciativa.

Criado em 1995 já com a participação do professor, o encarte circulou com essa parceria até 2004, em edições mensais (atualmente, ele é veiculado online de maneira independente). Seu intuito sempre foi o de ultrapassar os muros da academia, oferecendo resenhas aprofundadas e rigorosas, mas com uma escrita acessível para um público mais amplo.

"Apuramos essa ideia desde o princípio, mas no começo não foi fácil. Individualmente, vamos buscando e aprendendo o ponto de equilíbrio", disse Franklin de Matos em 2001.

Entre seus livros se destacam "O Filósofo e o Comediante  Ensaios sobre Literatura e Filosofia na Ilustração" (ed. UFMG, 2001) e "A Cadeia Secreta – Diderot e O Romance Filosófico" (Cosac & Naify, 2004). Em breve, será lançada mais uma obra, "A Invenção do Leitor", pela editora 34.

Vítima de uma doença degenerativa que o debilitou progressivamente, Franklin de Matos morreu no dia 7 de julho, aos 70 anos. Deixa a esposa, Yanet Aguilera, e as filhas Maia e Maria.

Estados irresponsáveis querem passar conta de bilhões para o país inteiro pagar, VTF, FSP

  EDIÇÃO IMPRESSA

Imagine a leitora que o governo federal vá doar R$ 30 bilhões por ano aos estados. Esse dinheiro inexiste. Agora mesmo, o ministério da Fazenda pensa em mágicas e milagres para tapar parte do rombo das contas, que calcula em R$ 26 bilhões neste ano. A fim de doar, teria de tomar emprestado, a taxas de juros horríveis.

Em resumo, é o que propõe projeto de lei de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado. Por falar em grandes ideias, Pacheco também é autor da proposta de que seja crime, previsto na Constituição, a posse de qualquer droguinha, um plano de incentivo ao encarceramento em massa, entre outras degradações.

Pacheco quer que a dívida dos estados com a União seja refinanciada em 30 anos e que a taxa de juros, ora em 4% ao ano, possa ser zerada.

Imagem de um homem de terno escuro e gravata, sentado em uma cadeira de couro azul, gesticulando com a mão direita. Ele está em uma mesa com papéis, um copo de água e um laptop. Ao fundo, há outra pessoa parcialmente visível.
Rodrigo Pacheco durante sessão plenária para votar o projeto de lei (PL 5.395/2023) que cria a Política Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes) - Lula Marques/Agência Brasil

Se um estado entregar ao governo federal ativos no valor de 10% da dívida, fica livre de 1 ponto percentual da taxa de juros. Se entregar 20%, 2 pontos. Deixa de pagar outro ponto percentual se investir esse dinheiro em educação, infraestrutura e segurança. Por fim, 1 ponto percentual de juros iria para um fundo a ser distribuído entre todos os estados.

A taxa de juros pode ir a zero, pois. Essa conta não desaparece. Apenas é passada adiante. Se não receber os juros dos estados, a União perderia uns R$ 30 bilhões de receita financeira por ano, o equivalente a uns 40% do investimento federal em 2023 (sem contar o custo de financiar esse rombo).

O que são esses "ativos" que estados podem repassar à União? Estatais, como Cemig e Copasa, que o governador liberal de Minas, Romeu Zema (Novo), não vendeu. Estados poderiam se livrar do fardo da privatização; quem sabe tentem superfaturar as empresas. Porém, teria de haver lei federal e estadual para autorizar tal negócio. Um rolo.

Além disso, também são ativos, dívidas e créditos quaisquer a receber. A União seria responsável por cobrar os papagaios, sabe-se lá quantos deles recuperáveis e a qual preço, débitos que até agora os estados não venderam no mercado. Por quê?

Os estados que entrarem no programa poderiam usar aquele 1% de juros sobre a dívida em investimento, mas não em gasto como pessoal, por exemplo. Como verificar? O estado seria obrigado a somar esse 1% de juros perdoados ao que já investe hoje? De outro modo, pode burlar a regra.

Investimento novo até poderia ser útil, se bem feito, o que é duvidoso em estados com finanças escabrosas. O governo federal também quer investir mais. Não pode. Não tem dinheiro.

Entre 1997 e 1999, A União assumiu as dívidas de estados quebrados por endividamento excessivo, má gestão ou bandalheira. Ficou com uma conta cara em troca de os estados pagarem seus débitos refinanciados, em prestações. Desde então, já houve outros perdões.

Estados continuam a se queixar de juros excessivos, em especial Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, os casos mais teratológicos de irresponsabilidade, além de São Paulo e Goiás. Estados maiores e mais ricos querem passar a conta para o país inteiro.

A dívida do Rio equivalia em 2023 a 188% da receita corrente líquida do estado. A do Rio Grande do Sul, a 185%. Minas, 168%. São Paulo, que paga as contas, 128%. Dois terços dos estados tinham dívida inferior a 30% da receita.

No projeto de Pacheco, prevê-se que os estados que aderirem à renegociação ficariam sujeitos a regras parecidas com as do arcabouço fiscal: o aumento da despesa poderia ser igual a, no máximo, 70% do aumento real da receita. Mesmo que tal regra sobreviva no Congresso, é pouco restritiva para governos teratológicos.

O sentido geral do projeto de Pacheco é de aumento de gasto e de privilégio para irresponsáveis. Tem grande chance de passar, pois.