segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

Alvaro Costa e Silva - Cláudio Castro, um bolsonarista raiz, FSP

 Você lê a notícia, não acredita e descobre que políticos já estão em pré-campanha. O metrô da Gávea, cujas obras começaram em 2010 e estão paralisadas desde 2015, é uma das mais longas novelas em exibição no Rio, só comparável à da climatização nos ônibus e a da recuperação da estação ferroviária da Leopoldina. Cláudio Castro anunciou um acordo para que a concessionária invista R$ 600 milhões no projeto, em troca do controle do transporte até 2048. Com a esperança de conclusão da Linha 4 sabe-se lá quando, a população pode dar adeus à Linha 3 (Rio-Niterói-São Gonçalo), promessa de Castro na última eleição.

Mas a principal jogada do governador está dirigida à violência, tema que será o combustível das eleições no ano que vem. Ele decidiu recriar a Secretaria de Segurança, extinta em 2019 por Wilson Witzel, e convidou para comandá-la um delegado da PF exonerado após os atos golpistas de 8 de janeiro.

Victor César dos Santos –ligado à família Bolsonaro, em especial ao filho 01, e aliado do ex-ministro da Justiça Anderson Torres e do ex-chefe da Abin Alexandre Ramagem– será o encarregado da interlocução com o governo Lula para ações integradas de segurança. Resta saber em que língua eles falarão.

Santos —que foi homenageado com a medalha Pedro Ernesto pelo vereador Jerominho, fundador da maior milícia do Rio— declarou que dará prioridade aos crimes de latrocínio e feminicídio. Subentende-se que a atividade de traficantes e milicianos, a lavagem de dinheiro e a corrupção interna façam parte de seus planos.

Desde que o poder lhe caiu no colo, com a defenestração de Witzel, Cláudio Castro sofre pressão de Flávio Bolsonaro. Enfim resolveu capitular, apoiando a candidatura de Ramagem a prefeito. Assumiu o que sempre quis esconder e virou um bolsonarista raiz. De olho no Senado em 2026, o que ele propõe é fazer do Rio um puxadinho do capitão.

Renault anuncia investimento de R$ 2 bi para produzir SUV médio no Paraná, FSP

 SÃO JOSÉ DOS PINHAIS (PR)

A Renault anunciou nesta segunda-feira (4) um investimento de R$ 2 bilhões para produzir um novo SUV de porte médio no Paraná. O carro terá versões "flex hybrid", cuja motorização irá conciliar etanol, gasolina e eletricidade.

A divulgação do aporte foi feita na fábrica da montadora, em São José dos Pinhais (PR), durante cerimônia que celebrou os 25 anos da unidade. Geraldo Alckmin (PSB), vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, esteve presente no evento.

Renault apresenta carros elétricos em evento em Paris em 15 de novembro
Renault apresenta carros elétricos em evento em Paris em 15 de novembro; no Brasil, fábrica investirá R$ 2 bilhões para produzir SUV médio - Gonzalo Fuentes - 15.nov.2023 / Reuters

Luiz Fernando Pedrucci, CEO da Renault na América Latina, disse que toda aprovação de investimento equivale a vencer uma batalha. Contudo, o executivo ressaltou que espera a manutenção de um cenário competitivo saudável, sem regulamentações que ajudem apenas a alguns fabricantes.

"O que anunciamos até agora tem por base as regras vigentes. Não podemos ter no mercado empresas beneficiadas por regras diferentes", disse o executivo.

Em entrevista concedida pouco antes da cerimônia com Alckmin, Pedrucci afirmou que Ricardo Gondo, presidente da Renault do Brasil, tem a missão de lutar pela manutenção da igualdade de condições no mercado nacional. Sem isso, os planos de investimento poderiam ser revistos.

A fala do CEO na América Latina remete à recente prorrogação dos incentivos fiscais para empresas que produzem nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Os principais beneficiados são o grupo Stellantis, que tem fábrica em Pernambuco, e a chinesa BYD, que vai montar seus veículos híbridos e elétricos na Bahia.

Já o presidente da Renault do Brasil afirmou que o total de aportes entre 2021 e 2025 chegam a R$ 5,1 bilhões no país. O valor inclui o compacto Kardian, que chegará ao mercado em março de 2024. O preço deve partir de, aproximadamente, R$ 100 mil.

O modelo terá motor 1.0 turbo flex e câmbio automático. Sua base é a plataforma modular da geração atual do Sandero, vendido em mercados europeus.

Localizado em São José dos Pinhais (PR), o Complexo Industrial Ayrton Senna tem quatro fábricas distribuídas em 2,5 milhões de metros quadrados. Há capacidade para produzir 320 mil automóveis por ano, com 5.300 funcionários diretos da Renault.

Hoje, as linhas de montagem trabalham em dois turnos incompletos, segundo Gondo, sendo possível produzir em até três turnos. O executivo acredita que os futuros lançamentos irão reduzir a ociosidade.

A planta completa 25 anos de atividades neste ano, e o novo SUV médio será o carro nacional mais caro da marca francesa. Os valores iniciais devem ficar acima de R$ 150 mil.

Os investimentos em novos produtos buscam recuperar a rentabilidade e o prestígio conquistado no início da produção nacional. O primeiro modelo feito no Paraná foi a minivan Scénic, lançada em março de 1999 —a produção teve início no fim de 1998.

O modelo conquistou muitos clientes que, até então, compravam sedãs e peruas de porte médio. No primeiro ano de mercado, foram vendidas 33 mil unidades.

Logo em seguida veio o Renault Clio nacional, que, inicialmente, trazia airbags frontais em todas as versões. As opções mais caras vinham com forração aveludada nos bancos e sistema de som com comandos junto ao volante, algo raro entre os compactos da época.

Mas a marca francesa passou por maus momentos ao nacionalizar a linha Mégane, que chegou em 2006 como segunda geração.

Os modelos médios estrearam com motorização 1.6 flex e câmbio manual, mas o mercado já havia se voltado para sedãs médios com caixa automática. Honda Civic e a Toyota Corolla já estavam consolidados e o novo Renault, embora mais equipado, não fez o sucesso esperado.

A virada da marca teve início no ano seguinte, quando o sedã popular Logan entrou em produção. Simples e espaçoso, adotava soluções como retrovisores externos que poderiam ser instalados em qualquer lado da carroceria, o que reduzia custos de produção.

O hatch compacto Sandero estreou seis meses depois, em dezembro de 2007, com a mesma proposta de cabine ampla por preço mais acessível. Fez sucesso por anos, mas a retração do mercado registrada a partir de 2013 fez a rentabilidade cair.

Agora a marca pretende recuperar as perdas com uma estratégia focada em menor volume de vendas, mas concentrada em produtos de maior valor agregado.

Apenas o Kwid vai permanecer como modelo de apelo popular na montadora, com vendas cada vez mais voltadas para frotas, principalmente de locadoras.

Luiz Fernando Pedrucci, CEO da Renault na América Latina, disse que os investimentos também estão mantidos na Argentina, independentemente dos caminhos que serão tomados pelo presidente eleito, Javier Milei, que toma posse neste domingo (10).

Pedrucci afirmou que a empresa enxerga a região como uma terra de oportunidades, estando acostumada às turbulências políticas e econômicas.

"Comemos turbulência no café da manhã desde criança", disse o executivo.

Dois lados atacam regra australiana pioneira para psicodélicos, Marcelo Leite, FSP

 

Meia dúzia de cogumelos do gênero Psilocybe
A psilocibina, psicoativo de 'cogumelos mágicos', pode ser receitada na Austrália - Getty Images/BBC News Brasil

A Austrália surpreendeu o mundo ao anunciar, em fevereiro, regulamentação pioneira permitindo a psiquiatras administrar psicodélicos a pacientes. Surpreendeu também os próprios psiquiatras e psicoterapeutas, tanto os mais conservadores quanto os mais libertários, que passaram a questionar a decisão.

A partir de 1º de julho deste ano, psiquiatras com registro específico podem usar na clínica apenas duas substâncias, MDMA (ecstasy, bala) para transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e psilocibina (psicoativo dos cogumelos "mágicos") para depressão resistente a tratamento.

Tal passo resultou de processo iniciado pela TGA, sigla em inglês de Administração de Bens Terapêuticos, o equivalente da Anvisa. A agência havia encomendado uma revisão da literatura sobre esses tratamentos experimentais a três especialistas: Steve Kisely, do sistema de saúde pública em Brisbane, Mark Connor (Universidade Macquarie) e Andrew Somogyi (Universidade de Adelaide).

Seu parecer concluiu que havia boa evidência estatística de benefícios, embora os testes clínicos ainda fossem preliminares (raramente de fase 3). Com base nele, a TGA deslocou MDMA e psilocibina para uma classe de substâncias menos controladas, possibilitando as duas indicações.

De cara a decisão foi questionada por outros especialistas. Entre eles, pesquisadores das universidades de Melbourne, Tasmânia e Swinburne à frente do único teste clínico com psicodélicos então registrado no país, que se queixaram no Australia & New Zealand Journal of Psychiatry por não terem sido consultados:

"Nós teríamos sugerido, definitivamente, mais cautela do que está implícita no presente anúncio. Há muitas questões a respeito dos detalhes precisos dessa mudança que permanecem sem resposta. Até que sejam adequadamente considerados, não podemos, em sã consciência, apoiar esse movimento."

Colégio Real de Psiquiatras da Austrália e Nova Zelândia (RANZCP, em inglês) publicou em junho um memorando dizendo que havia evidências, porém limitadas, em apoio ao benefício terapêutico dos dois psicodélicos, e que mais pesquisa era necessária. Em especial, testes clínicos aleatorizados e controlados de maior porte, incluindo o componente psicoterápico do novo modelo de tratamento.

Há quem considere esse um calcanhar-de-aquiles da nova modalidade: a maioria dos ensaios clínicos com essas substâncias modificadoras da consciência utiliza-as em psicoterapia assistida por psicodélicos (PAP), mas os estudos são desenhados para testar a substância, não a técnica de atendimento psicológico, que pode variar.

O RANZCP está longe de ser tão conservador quanto a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), que se pronunciou contra até o plantio de cannabis para produzir remédios autorizados pela Anvisa. Manifestou-se, porém, contra a decisão da TGA:

"O uso clínico de substâncias psicodélicas só deveria ocorrer sob condições de teste em pesquisa que incluam supervisão por comitê institucional de ética em pesquisa e cuidadosos monitoramento e comunicação de resultados de eficácia e segurança".

No outro extremo do espectro médico-ideológico, por assim dizer, o afrouxamento da regulamentação pela TGA também foi atacada pela Associação Multidisciplinar Australiana de Profissionais Psicodélicos (AMAPP, em inglês). Neste caso, acusa-se a medida de não satisfazer as necessidades de tratamentos de muitos pacientes.

A AMAPP congrega médicos, psicólogos, enfermeiros, paramédicos e assistentes sociais favoráveis à introdução "segura e judiciosa" da PAP no atendimento de saúde mental. O presidente da associação, Anthony Bloch, afirmou no comunicado:

"O atual sistema regulatório é virtualmente impraticável, excessivamente cauteloso e oneroso, e precisa evoluir com a ajuda e a contribuição daqueles profissionais que têm conhecimento e experiência apropriados trabalhando no campo psicodélico".

Para Bloch, é impraticável a presença obrigatória de um psiquiatra na sessão de dosagem de MDMA ou psilocibina, em detrimento por exemplo de psicólogos: "Isso pode contribuir para resultados piores para clientes que tenham precisado de sessões prolongadas e cuidadosas de preparação com terapeutas em que passaram a confiar".

Sem uma revisão das regras, argumenta a AMAPP, pacientes vulneráveis podem se ver incentivados a buscar psicodélicos com terapeutas informais, aumentando o risco de efeitos adversos. "A regulamentação atual é contraproducente e limitada por distorções e excesso de burocracia. Exigimos mudança."

De certo modo, é um problema análogo ao que serviços de facilitação à psilocibina enfrentam no estado do Oregon: no afã de dar acesso a psicodélicos, regras inovadoras, porém eivadas de burocracia, acabam por torná-lo complicado e caro. No caso, pelo menos US$ 2.500 (mais de R$ 12 mil) por três sessões, só uma delas com ingestão de cogumelos.

Desencantados, os clientes potenciais podem preferir comprar os fungos no mercado virtual paralelo e engoli-los por conta própria, ou na companhia de pessoas não qualificadas, em doses e locais impróprios. E aí mora o perigo.

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AVISO AOS NAVEGANTES - Psicodélicos ainda são terapias experimentais e, certamente, não constituem panaceia para todos os transtornos psíquicos, nem devem ser objeto de automedicação. Fale com seu terapeuta ou médico antes de se aventurar na área.

Sobre a tendência de legalização do uso terapêutico e adulto de psicodélicos nos EUA, veja a reportagem "Cogumelos Livres" na edição de dezembro de 2022 na revista Piauí.

Para saber mais sobre a história e novos desenvolvimentos da ciência nessa área, inclusive no Brasil, procure meu livro "Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira".