segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Americana, no interior de SP, contraria Doria e autoriza comércio por mais tempo, FSP

 

AMERICANA (SP)

A prefeitura da cidade de Americana, na região metropolitana de Campinas, autorizou que o comércio local funcione 12 horas por dia a partir desta segunda (7), contrariando as diretrizes previstas para a fase amarela do Plano SP, elaborado pelo governo de João Doria (PSDB). O argumento é de que aumentar o horário diminui as aglomerações.

A cidade está entre as 62 consideradas em estado de atenção pelo governo estadual no que diz respeito ao controle da pandemia do novo coronavírus.

Até o início da semana passada, toda a região de Campinas estava na fase verde, a mais branda em termos de restrições, assim como São Paulo, Sorocaba e Baixada Santista, totalizando 76% da população do estado.

Diante da piora nos índices hospitalares e do aumento de novos casos de Covid-19, todo o estado recuou para a fase amarela na última quarta-feira (2).

Nessa fase, a ocupação dos estabelecimentos fica limitada a 40%; o funcionamento volta a ser de dez horas por dia, com limite de horário até as 22h; e eventos com público em pé ficam proibidos.

No entanto, no próprio dia 2 o Comitê de Combate à Covid-19 de Americana autorizou que a Acia (Associação Comercial e Industrial de Americana) mantivesse o calendário original do fim de ano, que prevê a abertura do comércio de rua das 9h às 21h.

Segundo a Acia, a decisão foi tomada após reunião da entidade com o comitê, formado pela prefeitura, autoridades de saúde e entidades de classe do município.

"De acordo o secretário de Negócios Jurídicos de Americana, Alex Niuri, que também participou do encontro, a decisão da prefeitura é amparada por lei e tem aval do prefeito Omar Najar (MDB)”, disse a entidade.

Não está claro em que lei a prefeitura se amparou para a tomada dessa decisão.

Em resposta à Folha, a Prefeitura de Americana informou que, desde o início da pandemia, discordou de várias medidas adotadas pelo governo do estado, "como fechar salões de beleza e manter abertos salões de pet shop". "Mas sempre cumprimos."

"Vamos continuar cumprindo as decisões do governo do estado, vamos respeitar a regressão de fase, mas também respeitando a nossa autonomia", continua a nota.

"Nesse diapasão, é público e notório que a restrição no horário de funcionamento só contribui para a maior aglomeração de pessoas, principalmente nessa fase de final de ano em que as pessoas não vão deixar de ir às compras por conta de um horário reduzido. A experiência neste ano demonstrou que o horário reduzido gerou filas na porta de lojas, ônibus lotados e o mesmo público concentrado no mesmo horário", disse.

"A medida, portanto, não faz parte de um negacionismo ou de uma tentativa de burlar as regras de distanciamento, mas sim uma visão distinta do estado, de que a forma mais segura de ir às compras no fim do ano é se houver mais opções de horários."

O setor de comércio e serviços representa 76,75% do PIB de Americana, segundo dados do Seade de 2017. Em protesto pela regressão de fase, moradores convocaram para o sábado (5) uma carreata “contra Doria”.

Questionada sobre se o governo do estado adotaria alguma medida contra a prefeitura, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico explicou que cabe ao Ministério Público verificar o descumprimento do plano e aplicar eventuais sanções. O MP-SP foi procurado, mas não se pronunciou.

A pasta "recomenda que os prefeitos sigam as ações de combate ao coronavírus indicadas pelo Plano São Paulo".

"O governo de São Paulo esclarece que atua com plena responsabilidade e transparência no combate e controle do coronavírus, sempre amparado pela ciência. O Plano SP é respaldado por critérios técnicos, análises e pareceres do Centro de Contingência para permitir, de forma consciente e gradual, a retomada das atividades econômicas dos setores", afirmou, em nota.

Americana é a única cidade da região a anunciar o descumprimento das diretrizes. Piracicaba, Campinas, Sumaré e a vizinha Santa Bárbara d'Oeste adotaram medidas para se adequar às novas regras.

Até sexta (4), a cidade tinha 6.957 casos confirmados e 182 mortes por Covid-19, com aumentos respectivamente de 5,3% e de 3,4% em uma semana. As internações em UTI aumentaram 65,2% no mesmo período, enquanto as internações em enfermaria registraram uma queda de 4,4%.

A cidade de Rio Claro anunciou que irá cumprir a fase amarela “com ressalvas” e também manterá o horário ampliado do comércio. Foi mantido ainda o horário especial durante o período natalino, com os shoppings funcionando das 9h às 23h desde a sexta (4).

O secretário de Negócios Jurídicos, Rodrigo Ragghiante, afirmou que a decisão foi tomada com base nos “números epidemiológicos favoráveis, dentro da legalidade”. A cidade não está entre as 62 em estado de atenção.

“Se houver mudança nos números epidemiológicos do município, a situação poderá ser alterada, com regras mais rígidas”, afirmou o então prefeito João Teixeira Junior (Democratas), o Juninho.

“As medidas que estamos anunciando só foram possíveis por conta de ações que adotamos ao longo da pandemia, principalmente por não termos desmobilizado equipamentos e estrutura de atendimento instalados, como o hospital de campanha.”

Até sábado (5), o município tinha 5.627 casos confirmados e 149 mortes por Covid.

Juninho é investigado pelo Ministério Público sob suspeita de ter contratado uma empresa de fachada para o fornecimento de R$ 4 milhões em EPIs e de superfaturamento nessa compra. Ele foi preso no último dia (2) e suspenso temporariamente do cargo.

Em reunião virtual com representantes dos 62 municípios em atenção, na última terça (1º), Doria pediu a ampliação de testagem, o rastreamento de casos confirmados e suspeitos, o uso obrigatório de máscaras e uma fiscalização rigorosa contra aglomerações e festas clandestinas.

“Em nome da preservação da vida, vamos precisar muito da cooperação de todos assim como já obtivemos ao longo dos meses, mas especialmente neste final do ano. Reconhecemos que as pessoas estão cansadas dado o longo período dessa pandemia. Mas, até a chegada da imunização com as vacinas, não temos outra arma senão a proteção com máscaras, uso de álcool em gel e higienização das mãos, com distanciamento social e evitar aglomeração de pessoas”, declarou Doria.

domingo, 6 de dezembro de 2020

Mujica lamenta a morte do colega Tabaré Vázquez, OESP

 Redação, O Estado de S.Paulo

06 de dezembro de 2020 | 12h03

Mujica e Vazquez
Tabaré Vázquez posa ao lado de José Mujica em Montevidéu Foto: Pablo La Rosa/REUTERS

O ex-presidente uruguaio José Mujica (2010-2015) homenageou o colega Tabaré Vázquez (2005-2010 e 2015-2020), que morreu neste domingo aos 80 anos, vítima de câncer de pulmão. Ele ressaltou: "A melhor maneira de lembrar de você é lutar por suas bandeiras".

"Se foi um companheiro, filho dos trabalhadores, que fez seu futuro, sua carreira, mas jamais conseguiu se separar do seu compromisso social", disse Mujica em declaração à rádio uruguaia Sarandí. Para ele, o dia de hoje é triste tanto para a força política que ambos compõem, a Frente Ampla, como para o seu bairro, La Teja. Uma perda para os mais pobres e também para os proletariados. 

"Ele dedicou sua vida, seu trabalho político e social para combater esse mal que no final o carregou, contribuindo com tudo o que podia por isso. Obrigado, Tabaré. É uma honra ter te conhecido de perto", ressaltou emocionado.

Entre as memórias que compartilhou, ele observou que ao longo dos anos, mesmo quando Vázquez era presidente, ele "não podia deixar de ser um médico preocupado com a saúde das pessoas". E contou que isso pôde ser percebido em mais de uma conversa, nas quais ele sentia que Vázquez o observava como se estivesse tentando descobrir se tinha sintomas de algo.

"Obrigado por seu espírito científico, na maneira como você analisa as coisas, em seu verdadeiro compromisso com a causa do diferido e  por tudo. Para sempre, a melhor maneira de lembrar de você será lutar por suas bandeiras", disse ele.

Além disso, Mujica afirmou que sempre poderia receber conselhos de Vázquez, quem se preocupava com sua saúde, ou simplesmente saber se estava tudo bem. "É por isso que ele foi um presidente notável, porque nnca deixou de ser um médico. Ele sabia o que estava esperando por ele. Quando o mal irrompeu, ela disse a Lucia (Topolansky) com uma realidade lacônica, que na época ela era a vice-presidente, 'eu vou morrer, mas descanse porque estou aqui até março'.Ele era mais claro do que todos nós para se tornar, e isso também fala de sua fortaleza. Até logo", enfatizou.

Outra memória que ele compartilhou durante a entrevista foi quando recebeu a faixa presidencial das mãos de Vázquez e antes de abraçá-lo disse: "Olha que eu ainda vou devolver para você". Algo que finalmente conseguiu cinco anos depois. "Vou tentar simbolizar um abraço de despedida para o companheiro", concluiu.

Mujica e Vazquez
Mujica passando a faixa presidencial para Vázquez em 2015 Foto: Andres Stapff/REUTERS

 Tabaré Vázquez morreu na madrugada deste domingo, aos 80 anos, cercado por sua família, vítima de câncer de pulmão diagnosticado em agosto de 2019, logo após a morte de sua esposa, María Auxiliadora Delgado.

Nos últimos dez dias, o ex-deputado sofreu um agravamento de seu estado de saúde, com várias complicações ligadas ao câncer, como explica seu filho Álvaro Vázquez, oncologista por profissão como o pai./EFE


O naufrágio, J. R. Guzzo, O Estado de S.Paulo


06 de dezembro de 2020 | 03h00

Diante da comédia de circo montada em torno da “reeleição” do senador Davi Alcolumbre e do deputado Rodrigo Maia para os cargos que ocupam como presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, vale a pena sair um pouco da neura cultivada pelo noticiário político e pelas mesas-redondas na televisão e fazer algumas perguntas bem fáceis de responder. A primeira é: “Existe uma única pessoa, no Brasil e no mundo, que esteja pedindo a reeleição de qualquer dos dois – salvo eles próprios, suas famílias e seus amigos?” A resposta – não, não há ninguém pedindo nada – já resolve 90% da questão, não é mesmo? Se toda essa novela de terceira categoria se resume a atender aos interesses pessoais dos envolvidos, não faz o menor nexo violar abertamente a Constituição, em parceria com o STF, só para deixar contentes o senador e o deputado. 

As outras perguntas possíveis são igualmente elementares. O que a população brasileira teria a ganhar na prática com a permanência, até o momento ilegal, de Alcolumbre e de Maia nos seus empregos atuais? Nada, outra vez. Qual a grande emergência nacional que poderia recomendar uma mudança na Constituição para legalizar os desejos desses dois cidadãos? Nenhuma. Enfim: qual seria o motivo de interesse público, mesmo teórico, para justificar essa “reeleição”? Nenhum. Conclusão: a história toda deveria ser encaminhada para o arquivo morto, e não sair mais de lá. Só que não: os presidentes atuais do Senado e Câmara continuam sendo tratados pela mídia, pelo mundo político e pelas elites como dois imensos estadistas empenhados no melhor desfecho de uma grave questão nacional. Não há questão nacional nenhuma. Há apenas uma tentativa de atender a interesses individuais. 

Nenhum dos dois, pelo que está escrito na lei, tem o direito de continuar no cargo. Alcolumbre, pelo menos, teve a sinceridade de admitir que está interessado no que é melhor para ele. Maia tem feito de conta que é apenas um patriota à espera de decisões superiores; tudo o que deseja é “cumprir a lei”, na condição de defensor número um do “estado de direito” que atribui a si mesmo. Assim sendo, o presidente do Senado pediu que o STF tomasse essa extraordinária decisão que frequentou as manchetes nos últimos dias: declarar que um artigo da Constituição é inconstitucional. O artigo em causa proíbe a reeleição dos presidentes das duas Casas do Congresso, nas condições em que estão os mandatos de ambos. 

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Mesmo deixando de lado a questão central – a absoluta falta de sentido da reeleição –, deveria estar claro, de qualquer forma, que uma mudança na Constituição só poderia ser feita por emenda constitucional, e só os 513 deputados federais e 81 senadores têm o direito de aprovar emendas constitucionais. Mas não é desse jeito que as coisas funcionam no Brasil de hoje. O Poder Legislativo aceita, com perfeita passividade, a sua submissão ao Poder Judiciário; em consequência, faz o que o STF manda. 

Os atuais presidentes do Senado e da Câmara, quando se esquece a conversa fiada, estão em busca de uma coisa só: a manutenção dos poderes, dos privilégios e da vida de sultão à custa de dinheiro público que a Constituição Cidadã lhes garante – vantagens turbinadas pelas constantes “releituras” da lei que os membros do Congresso vivem fazendo em seu próprio favor. O STF, naturalmente, não vai decretar a reeleição dos dois – ou pelo menos não se sugeriu essa saída até agora. Mas é um atestado do naufrágio do Congresso brasileiro que seus comandantes peçam que a lei seja violada – e entreguem o futuro do Poder Legislativo a onze cidadãos que nunca tiveram um voto na vida.

*JORNALISTA