sábado, 14 de novembro de 2020

Cristina Serra - Canalhas, canalhas, canalhas!, FSP

 Muitos que ajudaram Jair Bolsonaro a se eleger, sabendo quem ele é, agora fingem espanto cada vez que ele aumenta a voltagem das barbaridades que despeja de sua boca pestilenta. Teve até general escrevendo cartinha lamuriosa. Sentem-se traídos? Bem feito.

Apesar de suas evidentes dificuldades com a sintaxe, Bolsonaro sabe se expressar como poucos quando se trata de insultar alguém. Como fez em recente cerimônia, em que ofendeu o povo brasileiro e bravateou contra o presidente eleito dos EUA.

Bolsonaro arrasta o país ao ridículo mundial junto com sua figura grotesca, capaz de comemorar a interrupção dos testes da vacina contra a Covid e de lançar suspeitas infundadas sobre a imunização; aparelhar a Anvisa e destruir o que resta da credibilidade do órgão regulador, num momento em que a pandemia está longe de ser controlada. Isso é um crime contra o país.

No Amapá, o clima é de convulsão social em consequência do apagão de energia. Há mais de dez dias, a população se tornou refém da inépcia da empresa transmissora e das autoridades, em todos os níveis. Abandono não é novidade nos confins da Amazônia. E qual o plano dos fardados para a região ? Controlar ONGs e levar embaixadores para um passeio.

Quanta degradação e incompetência ainda vamos aguentar? Ah, sim! Enquanto a elite do dinheiro grosso continuar se beneficiando da agenda econômica encarnada em Paulo Guedes. Não importa o preço que iremos pagar em mais brasileiros mortos e em apodrecimento moral.

Bolsonaro nos legará um farrapo de país. Na mesma cerimônia, disse: "Não estou preocupado com minha biografia, se é que tenho biografia". Nisso, ele tem razão. Bolsonaro e família não têm biografia. Sua história será contada nos arquivos policiais.

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Aos que contribuíram para o estado de coisas que levou à sua eleição, aos que o naturalizam como figura normal do jogo democrático, aos que lhe dão sustentação política, evoco Tancredo Neves em 1964. Canalhas, canalhas, canalhas!

Cristina Serra

Cristina Serra é jornalista.

Hélio Schwartsman Ditadura eleitoral, FSP

 Os EUA, mais uma vez, acabam de mostrar ao mundo os riscos de um sistema eleitoral descentralizado e sem padronização —e nem estou falando da extemporaneidade que é o colégio eleitoral.

Como cada estado faz mais ou menos o que quer, no tempo em que quer, não existe um instante inequívoco em que se possa identificar o vencedor. Normalmente, isso pode gerar confusão, mas não é um problema grave. Quando, porém, temos um Trump do lado derrotado, a falta de uma autoridade eleitoral central facilita contestações, que podem fragilizar a democracia.

No Brasil, padecemos do problema oposto, que são os pleitos hiper-regulados. Com efeito, a Lei Eleitoral (9.504/97) e as toneladas de resoluções da Justiça Eleitoral, que pretendem controlar cada aspecto das campanhas, transformam o período eleitoral num estado de exceção, no qual liberdades fundamentais, como as de expressão, reunião e investigação científica, ficam suspensas.

Não, não estou me valendo de hipérboles retóricas. O simpatizante que põe em sua janela um cartaz com 0,6 m2 está encrencado, pois o limite legal é 0,5 m2. Um artista não pode cantar canções em ato de apoio a seu candidato. Advogados das campanhas pedem —e às vezes conseguem— a censura a jornais e a pesquisas eleitorais. A crer na Carta (art. 5°, IX), atividades intelectuais, artísticas, científicas e de comunicação são livres e independem de censura ou licença.

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No dia da eleição propriamente dito, o estado de exceção se torna uma ditadura escancarada, com a proibição de reuniões em determinados lugares e, se o juiz quiser, até a imposição de lei seca. A "sharia" vale entre nós.

Obviamente não recomendo que sigamos os passos da quase anarquia eleitoral que são os EUA, mas não tenho dúvida de que nos beneficiaríamos de uma abordagem um pouco mais relaxada, que não tolhesse tanto as liberdades cotidianas de cidadãos e candidatos.

Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".