quarta-feira, 10 de abril de 2013

Domésticas - o que faltou dizer


José Pastore *
Se a sua empregada doméstica precisar fazer uma hora extra, lembre-se de que ela terá de descansar 15 minutos antes de começar. Se você precisa de muitas horas extras, atente que ela não pode exceder dez horas por semana. Se dorme ou não no emprego, ela terá de ficar 11 horas sem trabalhar depois de encerrada uma jornada. Atenção: ela não pode comer em menos de uma hora em cada refeição. Se ela demorar mais de dez minutos para entrar no serviço, trocar de roupa ou tomar banho na hora da saída, esse tempo será contado como hora extra. Se ela dorme no quarto com uma criança ou um doente, terá de ser remunerada com adicional noturno e eventualmente hora extra por estar à disposição daquela pessoa. Se você tiver de compensar em outro dia as horas a mais que ela trabalhou no dia anterior (banco de horas), lembre-se de que isso tem de ser previamente negociado com o sindicato das domésticas. Se você concede à sua empregada um plano de saúde e ela se acidentar e for aposentada por invalidez, o plano terá de ser mantido pelo resto da vida. Se, para melhor controle do seu desempenho, você estabelecer metas e tarefas diárias que sua empregada considere exageradas, ela pode processá-lo por danos morais. E se você não pagar a indenização que o juiz determinar, ele penhorará (online) o saldo da sua conta bancária - sem prévio aviso.

Tudo isso está na lei e na jurisprudência. E há muito mais. Para ser franco, o espaço todo deste jornal não seria suficiente para explicar as complicações decorrentes dos 922 artigos da CLT e dos milhares de normas administrativas e orientações dos tribunais. Por isso vou parar por aqui, mesmo porque não quero ser considerado catastrofista. Nem por isso, porém, posso concordar com a opinião da nobre desembargadora Ivani Bramante, publicada neste caderno (2/4), segundo a qual os patrões estão com paranoia (sic) em relação à nova lei das domésticas.

O fato é que, no País inteiro, não se fala noutra coisa. A apreensão é geral. Os políticos já perceberam o desconforto e a irritação causados pelo impensado ato. Muitos já reformulam o seu cálculo eleitoral: se ganharam a simpatia das empregadas, perderam o apoio dos milhões de eleitores que não podem prescindir dos serviços de uma babá ou de um cuidador de idoso. A esse grupo se juntarão as empregadas que serão dispensadas.

Convenhamos, a execução do atual cipoal trabalhista já é difícil nas empresas. O que dizer das famílias, que não dispõem de contador, departamento de pessoal e assessoria jurídica? A nova lei, além de encarecer os serviços (que já estão caros), vai mudar o relacionamento entre empregada e empregador, que, de confiável e amistoso, passará a burocrático e conflituoso.

Os políticos buscam agora colocar uma tranca na porta que acabaram de arrombar. Mas as emendas poderão sair pior do que os sonetos. E podem ser inúteis, pois, a esta altura, as famílias que podem já se puseram a desenhar a sua vida sem a ajuda das empregadas domésticas.

A questão do encarecimento também é séria. O meu amigo Osmani Teixeira de Abreu, conhecedor profundo das relações do trabalho no Brasil, acredita que, em médio prazo, vai sobrar empregada doméstica, porque muitos empregadores não terão condições de cumprir a nova lei. Ele argumenta que na empresa, quando há um aumento de custo, o empresário o repassa ao preço ou o retira do lucro. O empregador doméstico não tem como fazer isso, porque geralmente é empregado e vive de salário, que não é elástico.

Ou seja, na pretensão de melhorar a vida das empregadas domésticas, nossos legisladores deixaram de lado o que é mais prioritário no momento presente, que é a formalização dos 5 milhões de brasileiras que não contam sequer com as proteções atuais. Será que aumentando os direitos e criando tanta insegurança elas vão ser protegidas? Penso que não. Muitas serão forçadas a trabalhar como diaristas, sem registro em carteira.

* José Pastore é professor de Relações do Trabalho da FEA-USP e membro da Academia Brasileira de Letras.

Vínculo empregatício é a principal causa de ações movidas por domésticas



PEC das domésticas

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Levantamento do TRT de São Paulo revela os 30 principais motivos de processos trabalhistas envolvendo empregadas domésticas


09 de abril de 2013 | 19h 44

Cley Scholz, de O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - O reconhecimento do vínculo empregatício é a principal causa de ações trabalhistas movidas por empregadas domésticas contra os patrões, segundo levantamento feito pelo Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo a pedido doportal Economia & Negócios do Estadão.
O reconhecimento do vínculo de trabalho é o primeiro passo para a obtenção de outros direitos, como anotações na carteira de trabalho, pagamento de horas extras e demais verbas rescisórias em caso de demissão.
Muitas diaristas também recorrem à justiça do trabalho para tentar conseguir comprovar o vínculo empregatício, quando trabalharam três dias ou mais por semana. Isso possibilita reivindicar outros direitos
Segundo especialistas em direito do trabalho, a nova lei que amplia os direitos dos trabalhadores domésticos deve provocar o aumento do número de ações judiciais. O motivo é que muitos empregados estão tomando consciência dos seus direitos e, além disso, o mercado de trabalho é favorável aos trabalhadores, pois existe grande oferta de vagas.
Os números do TRT-SP mostram que o número de ações trabalhistas subiu de 6.623 em 2010 para 9.022 em 2011, mas no ano passado caiu para 7.377. Este ano, foram 1.503 ações no primeiro trimestre.
Veja abaixo a lista dos 30 principais causas de ações trabalhistas envolvendo trabalhadores domésticos:
1) Reconhecimento de vínculo empregatício
2 ) Verbas rescisórias
3 ) Anotação na Carteira de Trabalho
4 ) Danos morais
5 ) Multa de 50% sobre verbas rescisórias não pagas na rescisão (art. 467 da CLT)
6 ) Multa por demissão sem motivo (art. 477 da CLT)
7 ) Recolhimento das contribuições previdenciárias
8 ) Pagamento de Vale transporte
9 ) Horas extras
10 ) Estabilidade gestante
11 ) Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS)
12 ) Danos materiais
13 ) Diferenças da estabilidade gestante
14 ) Diferenças salariais
15) Multa 40% FGTS
16 ) Reintegração gestante
17 ) Multa por falta de registro (art. 47 da CLT)
18 ) Carta de referência
19 ) Integração das horas extras nos descanso semanal remunerado
20 ) Seguro desemprego
21 ) Adicional noturno (reflexos)
22 ) Aviso prévio
23 ) Dupla função
24 ) Horas de sobreaviso e reflexos
25 ) Indenização substitutiva do seguro desemprego
26) Intervalo para refeição e descanso
27 ) Multas normativas
28 ) Nulidade do pedido de demissão
29 ) Recolhimentos fiscais
30 ) Reintegração no emprego 
Fonte: Coordenadoria de Gestão Normativa e Jurisprudencial - consulta de sentenças 

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Cesar Callegari: Heranças e desafios da educação paulistana



Tendências / DebatesInútil a tentativa do ex-secretário Alexandre Schneider de, em artigo recente ("Sobre parcerias e lealdades", em 29/3), fabricar uma "vacina" tardia contra avaliações negativas dos problemas deixados por seus sete anos de gestão à frente da Educação no município de São Paulo.
A eleição já passou, a população já fez a sua avaliação e já elegeu o programa de metas educacionais do prefeito Fernando Haddad. São elas que nos animam e mobilizam. Já dedicamos muito tempo e energia para solucionar os problemas que encontramos. São imensos os desafios à nossa frente.
É inaceitável que São Paulo ocupe o 35º lugar entre os 39 municípios da região metropolitana em qualidade da educação medida pelo Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). As crianças paulistanas não merecem e precisamos avançar.
Ano após ano, os alunos foram automaticamente aprovados. Mas 28% deles terminaram o primeiro ciclo do ensino fundamental, aos 10 ou 11 anos de idade, sem estar alfabetizados. Isso não é normal. Daí o nosso esforço para a Alfabetização na Idade Certa: todos lendo e escrevendo até os oito anos.
Educação com qualidade, sabemos, depende das condições em que se realiza o trabalho dos professores. Encontramos muitos deles adoecidos e desmotivados. Em 2012, houve 903 mil faltas por motivo de saúde --uma média de 15 dias por professor.
Foi necessário criar uma força-tarefa entre as secretarias de Educação, Saúde e Gestão, ouvir os sindicatos e passar a tratar desse problema com urgência. Estamos determinados a valorizar todos os educadores, apoiar o seu trabalho e investir na sua formação com a criação de 32 polos da Universidade Aberta do Brasil, em parceria com 22 das melhores universidades do país.
Herdamos, no dia 1º de janeiro de 2013, uma fila com 97 mil crianças à espera de vagas em creche. Fora as 1.600 que foram matriculadas em unidades que não estavam prontas. Um problemão. Nossa meta é zerar o deficit herdado e abrir ainda mais vagas, com a construção de 240 novas escolas, ampliação de convênios e estímulos para que as empresas atendam às necessidades educacionais dos filhos de seus empregados.
Estamos trabalhando muito para conseguir os terrenos para construir as 88 escolas que foram criativamente contratadas (sem terrenos) pela gestão anterior. Da mesma forma, estamos reduzindo os atrasos na entrega de material e uniforme causados por problemas havidos no ano passado.
É verdade que educação com qualidade se faz com cooperação e parcerias. Não continuaremos desprezando os apoios dos governos federal e estadual como vinha acontecendo. Eles são necessários.
Não "esqueceremos" de pedir livros didáticos ao MEC (Ministério da Educação) --lapso que prejudicou 50 mil alunos neste ano. Em dois meses, 312 de nossas escolas já se cadastraram nos programas de educação integral do MEC contra apenas 33 dos últimos quatro anos. Logo no primeiro mês, já obtivemos a liberação de R$ 20 milhões do governo estadual para a construção de novas creches.
A educação não pode ficar à mercê de diferenças político-partidárias. Portanto, tudo que foi produzido de bom nos últimos anos é tratado com o devido zelo à causa pública.
E tudo que mereça ser auditado, avaliado, mudado e melhorado será feito em respeito ao compromisso maior assumido com a população de São Paulo: fazer dela uma cidade educadora.
CESAR CALLEGARI, 60, sociólogo, é secretário de Educação do município de São Paulo