Novo aumento do imposto de importação de painéis solares pegou de surpresa as empresas que investem em parques e projeto de geração distribuída (GD). O encarecimento do módulo fotovoltaico pode comprometer pelo menos 281 empreendimentos, que somam R$ 97 bilhões em aportes até 2026, segundo levantamento da Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica).
A mudança foi elogiada, por outro lado, pela Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica), como alternativa para compensar os subsídios dos painéis asiáticos, especialmente chineses, que vinham derrubando o preço dos importados, comprometendo a indústria nacional.
A alteração tributária consta da resolução número 666 do Gecex (Comitê-Executivo de Gestão), colegiado da Camex (Câmara de Comércio Exterior), um órgão vinculado do Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços). O aumento entra em vigor em julho de 2025.
Os investidores de energia solar enxergam a volta do protecionismo, que marcou governos anteriores do PT. O setor mais significativo no passado foi o automotivo, mas houve também aumento de alíquota do imposto de importação para segmentos tão diversos quanto barcos esportivos, aparelhos de ar-condicionado, porcelanato e até sardinhas.
Segundo Carlos Dornellas, diretor técnico e regulatório da Absolar, a entidade trabalhava para deter mais uma elevação nas tarifas. Em janeiro, a taxa já havia subido de 6% para 9,6%. A sinalização do governo foi que, apesar de haver novos pleitos pelo aumento da tarifa, não havia disposição para fazer nova alta. O imposto, no entanto, mais que dobrou, para 25%.
"Esse expressivo aumento é uma facada nas costas —prejudica a atração de capital para o setor e a geração de empregos verdes", afirmou Dornellas à Folha.
O aumento reflete também perda de ex-tarifário (redução temporária da alíquota do imposto de importação de bens de capital). Historicamente, o imposto de importação para módulos ficava em 12% no Brasil. A partir de 2014, o segmento passou a contar os ex-tarifários, que ajudavam a baixar a alíquota da importação para produtos específicos, e chegaram a zerar o imposto.
Os ex-tarifários começaram a ser retirados em 2023, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), promovendo elevação progressiva do imposto, que agora dobra em relação a média histórica.
A mexida aí, segundo Dornellas, afeta financiamentos vinculados aos empreendimentos, com risco de prejuízos a grandes projetos. "O número 666 da resolução condiz com a maldade do governo, que faz um discurso pró-renováveis, mas mostra não tem prática condizente", diz o executivo.
Causou especial surpresa para a Absolar que, entre as empresas que pediram o aumento, esteja a chinesa BYD, que é associada da entidade e tem fábrica de painéis em Campinas, interior de São Paulo. Também há manifestação a favor do aumento pela Sengi, fabricante nacional do Paraná.
Dornellas afirma que a indústria local mal consegue atender 5% da demanda interna. "O volume de importação de painéis no ano passado, para dar um ideia, era capaz de gerar 17 GW (giga-watts). A indústria nacional, para forçar a amizade, como se diz, produziu em torno de 1 GW", afirma.
Segundo o executivo, não basta ter volume. Precisa ter preço competitivo e também qualidade compatível com o financiamento, que exige certificações que a indústria local não tem.
"Não é de hoje que o governo tem essa pegada de fomentar a indústria nacional, mas não é assim que se faz, de forma tão violenta, sem um plano para o desenvolvimento do parque local ou apresentação de indicadores para acompanhar o que pode acontecer", afirma Dornellas.
Em matéria publicada pela Folha há mais de um ano, no entanto, a BYD já falava do que considerava um problema: o painel chinês importado ser mais barato que o produto fabricado no país. Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da empresa enviou nota assinada pelo vice-presidente sênior da BYD Brasil, Alexandre Baldy, elogiando a elevação da taxa.
"BYD Brasil aplaude a decisão do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, como parte de seu compromisso com o desenvolvimento sustentável e com o fortalecimento da indústria brasileira. Como empresa líder em veículos híbridos, elétricos e tecnologia solar, esta medida é um estímulo gigantesco para retomada da indústria local, quase falida, impulsionando a produção local, incentivando inclusive novos investimentos e reforçando a cadeia produtiva brasileira", afirmou.
O texto também destaca que a BYD tem mais de R$ 65 milhões destinados a P&D no Brasil, especialmente em tecnologias fotovoltaicas, e mantém o compromisso com o país.
Também em nota, a Abinee diz que o aumento de 25% na alíquota de importação compensa parte dos subsídios diretos e indiretos dos produtos asiáticos. "É um primeiro passo para que as indústrias instaladas no país tenham condições mais isonômicas de tratamento em relação aos fabricantes do exterior."
De acordo com a entidade, os preços dos módulos fotovoltaicos importados vinham em vertiginosa queda por causa dos incentivos. Neste ano já caiu mais de 25%, depois de uma retração de 40% no ano passado.
"A decisão não deve acarretar aumento de preços para os consumidores brasileiros. O que muda com a alíquota é a competitividade dos produtos fabricados internamente", destaca a nota.
"Quem reclama da mudança da alíquota está, na verdade, querendo justificar um aumento de margem ou aumento de preços e de lucros, porque a queda nos preços de importação não foi repassada aos consumidores brasileiros nesse período e é isso que deu tranquilidade ao governo para mudar a alíquota, com a certeza de que os preços internos não seriam afetados."
A Abinee defende a valorizar a produção reforçando que, nos próximos dez anos, 90% da expansão da geração de energia elétrica será provida pelas fontes solar fotovoltaica e eólica.
"Garantir a produção local dos módulos e dos aerogeradores [também abrangidos na resolução] não só é uma medida de política industrial como também de segurança energética", afirmou a nota.
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