domingo, 17 de novembro de 2024

Até namorado da Sandy fraudou reembolso, diz associação, FSP

 BRASÍLIA

O acesso individual à saúde é um problema para os brasileiros. A inflação médica, até quatro vezes acima do IPCA, não pode ser repassada aos planos e isso restringe ofertas. Trabalhadores, que usam planos médicos empresariais como benefício, perdem o emprego e não encontram soluções no mercado. Ao mesmo tempo, os planos travam uma batalha contra fraudes que, por ano, tomam R$ 30 bilhões em recursos dos beneficiários, desequilibrando o sistema. Para Gustavo Ribeiro, 47, presidente da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), essa situação também afeta a saúde pública.

Gustavo Ribeiro, presidente da Abramge
Gustavo Ribeiro, presidente da Abramge - Rafaela Araújo/Folhapress

Por que não há planos de saúde individuais acessíveis?
A regulação da ANS [Agência Nacional de Saúde Suplementar] tabela o reajuste e isso inviabiliza não só o crescimento dos planos individuais como engessa a carteira existente, que, com o envelhecimento da população, presta mais atendimentos, pressionado ainda mais os custos para as empresas.

Mas há no mercado soluções alternativas, como os cartões de benefício, especialmente para quem tem baixa renda.
Quem tem esse cartão não tem nada. Ele [o titular] não está protegido, porque não é um plano de saúde. É um cartão que dá desconto em consultas particulares e, se precisar de atendimento, ele encaminha o paciente para o SUS.

É um produto de sucesso?
Deve ter muito mais [clientes] do que os planos individuais, que hoje representam 20% do total do mercado de seguros de saúde. É um produto de cerca de R$ 100 mensais e hoje não podemos vender algo melhor para esse público.

Por que não?
Um produto de acesso à rede de saúde é muito caro. Se eu pudesse vender um plano de consulta e exames, seria barato, mas eu não posso por conta da regulação [da ANS]. Não seria melhor para o consumidor poder comprar um produto de uma operadora para, numa urgência ou emergência, ter acesso e cobertura a uma rede?

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O que é pior: o reajuste da ANS ou as fraudes no setor?
Os reajustes da agência são sempre muito abaixo da inflação e é isso o que prejudica os planos individuais. Por uma questão tecnológica, a inflação médica é sempre três vezes maior que a inflação da economia. Esse setor é diferente de outros. Na indústria automobilística, por exemplo, você insere tecnologia e o carro fica mais barato. Na saúde, é o contrário. Quanto mais inovação, mais encarece o sistema em um primeiro momento.
As fraudes pesam demais também. São cerca de R$ 30 bilhões por ano. Tem várias quadrilhas e o setor, com a ajuda das autoridades, está desmontando [os esquemas]. Recentemente, até o namorado da Sandy [o médico Pedro Andrade] foi processado pela SulAmérica por fraude de reembolso. [Consultado, Pedro Andrade não respondeu.]

Quais são as fraudes do momento?
Você pega fraudes, por exemplo, em clínicas que fazem hemodiálise e, mais recentemente, em tratamentos do TEA [Transtorno de Espectro Autista], que, inclusive, é uma crueldade com os pais e as crianças. Hoje em dia, ninguém escapa. Todo mundo tem um leve desvio, o que é uma coisa inacreditável. Todo mundo precisa de terapia? Se todo mundo usar, quem realmente precisa não terá. Há casos de clínicas com até oito horas de terapia [para as crianças diagnosticadas]. Uma associação de proteção de autistas já comparou isso ao regime manicomial.

A força-tarefa do setor na Justiça contra esses abusos deu resultado?
O Judiciário também é vítima porque, em boa parte, é usado pelos fraudadores. Mas já há técnicos especializados nos tribunais e os juízes estão mais atentos com reações mais duras. Começa a existir a compreensão de que o prejuízo é para todos.

Como assim?
As redes pública e privada são complementares. O Incor, por exemplo, maior referência em tratamento do coração na América Latina, atende 85% dos pacientes pelo SUS, mas os 15% privados respondem por mais da metade da receita do hospital.

Raio-X | Gustavo Ribeiro, 47

Advogado, mestre em Direito do Estado (PUC-SP), é presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) e vice-presidente do Grupo Hapvida NotreDame Intermédica. Atuou ainda pelo UnitedHealth Group/Amil e Qualicorp, além de ter sido vice-presidente da Fundação Zerbini, do InCor da Faculdade de Medicina da USP.

Com Stéfanie Rigamonti Diego Felix

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