A eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com o apoio decisivo de uma frente ampla, é uma grande vitória da democracia não apenas para o Brasil, mas para o mundo. Seu discurso depois de eleito deu o tom do que planeja: um governo civil, inclusivo, conciliatório e verde. E se por um lado a vitória, reconhecidamente por pequena margem, envia um importante sinal ao redor do mundo, por outro demanda com urgência que se apresente uma agenda de reengajamento com pelo menos quatro prioridades.
A primeira é almejar se tornar uma superpotência verde e liderar a transição justa no âmbito global. Para isso precisa aumentar sua ambição e investir no desenvolvimento de economias de ponta inclusivas e compatíveis com a preservação florestal, como a bioeconomia, biotecnologia e os serviços ambientais a partir de biomas como a floresta amazônica, o cerrado, a mata atlântica e o Pantanal, em uma matriz energética 100% renovável e na produção sustentável de alimentos.
Para tal precisará alavancar grandes parcerias multissetoriais, com o envolvimento dos distintos níveis de governo, da sociedade civil e do setor privado e financeiro. Isso não será fácil no clima político atual, mas é a única forma de o Brasil atingir seu potencial.
A segunda grande prioridade é conduzir um processo de reconciliação da sociedade, com o foco na superação das divisões que fizeram desta eleição um marco da polarização e da violência política. Isso passa por construir uma visão compartilhada sobre como lidar com o tema, incluindo a criação de regras pactuadas no âmbito democrático e o fortalecimento da cooperação multissetorial. Desta forma poderá contribuir em escala planetária, afinal, o país não é o único que tem sofrido as consequências deste mal contemporâneo.
As soluções para a polarização política não são simples e é fundamental construir uma cultura de voto em propostas e programas de governo, e não em personalidades. Será preciso também trabalhar conjuntamente com a sociedade civil e as grandes plataformas digitais para desarmar a bomba da desinformação, fortalecendo a educação e os direitos digitais.
A terceira prioridade é reorientar a cooperação Sul-Sul e triangular para questões de redução da pobreza e desigualdades, e para a garantia da segurança alimentar. Essas questões são fundamentais para todos os países em desenvolvimento que sofreram grandes retrocessos por conta da pandemia da Covid e da guerra russo-ucraniana.
Por fim, o Brasil deve ressaltar a importância da cooperação multilateral em um mundo fragmentado em torno de múltiplos assuntos como, por exemplo, as questões da paz e da segurança global, com atenção especial para a questão nuclear, governança digital, e principais riscos climáticos. O país também deve se engajar nas urgentes discussões sobre a reorientação do sistema financeiro internacional para expandir o investimento em ação climática nos países mais afetados e menos responsáveis pelo aquecimento global.
Em um momento de desafios sistêmicos e interconectados que afetam a sobrevivência humana, a volta ao multilateralismo de um ator como o Brasil, com um longo legado de construção e cumprimento das regras internacionais, é mais que necessária. O mundo está mudando rapidamente, e o Brasil ficou fora de inúmeras discussões, perdeu "soft power" e deixou de participar de decisões-chave nos últimos anos.
A única maneira de conseguir dar os inúmeros saltos que precisamos é unir a sociedade ao redor dos desafios coletivos, e usar de forma eficiente e sustentável os abundantes ativos dos quais dispomos. Já passou da hora de trazer o Brasil do futuro para o presente de forma responsável e compatível com o seu papel de potência global.
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