Hoje, um importante risco para economia mundial vem dos EUA, onde a inflação pode ultrapassar a meta de 2% ao ano e a dívida pública vai passar de 100% do PIB, sem sinal de que vai parar de subir.
As expectativas de inflação nos EUA são as maiores desde julho de 2008, um feito e tanto se considerarmos que o desemprego chegou a ficar abaixo de 3% em meados da década passada e nem assim se esperava um aumento significativo dos índices de preço.
Um misto de receio de aumento de preços e medo do descontrole fiscal pelo tamanho do pacote de estímulo econômico, de US$ 1,9 trilhão, que deve ser votado nos próximos dias, jogou para o alto as taxas de juros dos títulos públicos americanos.
Assim como no Brasil, os EUA lançam alguns títulos públicos que protegem os investidores da inflação. Lá, esses títulos têm a alcunha de Tips (Treasury Inflation-Protected Security) e equivalem aos nossos Tesouro IPCA (cuja remuneração para um título com vencimento em 2035 anda em torno de 3,8% ao ano, além da variação do IPCA).
Assim, as expectativas de inflação nos EUA podem ser estimadas como a diferença entre o retorno esperado de uma obrigação do governo com o mesmo vencimento, mas sem a proteção contra a inflação, de uma Tips.
No pior da crise, em meados de março de 2020, quando se temia por uma deflação, os títulos sem proteção de inflação pagavam somente 0,16% a mais que uma Tips. Esse 0,16% seria, portanto, a inflação esperada, já que os investidores estavam dispostos a abandonar a proteção de um aumento generalizado de preços por esse 0,16% a mais de retorno por ano.
Mas desde então a inflação esperada passou a barreira de 1% em junho, de 2% em janeiro e está em 2,4% hoje, um índice que não acontecia desde 2008. Em parte, isso é resultado da normalização da atividade econômica, mas a maior remuneração das Tips é também um sinal de que os investidores mundiais querem mais retorno para compensar o risco de emprestar para o Tesouro americano.
Para um brasileiro, ter investidores com medo de emprestar para o governo é o status quo, e parece até piada alguém se preocupar com inflação de pouco mais de 2% ao ano, mas uma corrida contra o Tesouro americano seria um desastre.
E os EUA ainda não atingiram o fundo do buraco fiscal. Para este ano, a projeção é de um déficit de US$ 2,3 trilhões, mais que todo o PIB brasileiro. Mesmo com o PIB americano podendo crescer quase 4%, a dívida pública dos EUA deve passar de 100% do PIB, em 2021, crescendo ao longo desta década até atingir 110% em 2030.
Obviamente, os EUA estão muito, mas muito longe de um real descontrole inflacionário, como no Brasil da década de 1980, pois o processo é longo.
O nosso veio pelo descontrole das contas públicas, tanto em moeda nacional quanto estrangeira, do regime militar; sem nenhuma credibilidade, a ditadura passou a pagar as contas públicas imprimindo dinheiro, em vez de lançar títulos públicos, como faz hoje qualquer país que pretende gastar mais do que arrecada.
Hoje, nos EUA, muita da variação dos preços dos Tips é uma tentativa bem indireta de desidratar o pacote trilionário do governo Biden, para amenizar seu impacto fiscal, e pode ser revertida logo. Ainda assim, o verdadeiro risco para a economia mundial é baixo, mas não é zero.
Se o governo não tem credibilidade, a economia americana afunda. E leva o mundo junto.
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