quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

Ruy Castro - Excelência aos berros, FSP

 Há dias, num tribunal em Xanxerê (SC), uma juíza do Trabalho esbravejou contra uma testemunha exigindo ser chamada de "Excelência". Como o homem não entendesse, Sua Excelência, descontrolada, trovejou, bramiu, mandou-o calar a boca e dispensou-o aos berros. Mas a juíza se deu mal. Seu destempero estava sendo gravado e "viralizou" nas redes. Foi suspensa das funções e, pelos próximos tempos, exercerá sua excelência em casa.

Por si, o tratamento de "Excelência" não garante nada. Carlos Lacerda, terrível polemista das bancadas, usava-o para destruir seus adversários. Certa vez, na Câmara, o deputado alagoano Ari Pitomba o ofendeu: "Vossa Excelência é um purgante!". Ao que Lacerda rebateu: "E Vossa Excelência é o resultado desse purgante!". Em outra, num discurso, Lacerda citou uma frase em francês e seu inimigo pessoal, o deputado Roland Corbisier, do PTB da Guanabara, zombou de sua pronúncia. Lacerda nem piscou: "Infelizmente, ao contrário de Vossa Excelência, não sou filho de mãe francesa..." —o que todos na época sabiam o que queria dizer.

Mas isso foi no tempo em que os políticos se agrediam com urbanidade. Hoje parlamentares mimoseiam-se no Congresso com "Vossa Excelência é um filho da puta!" e "Filho da puta é a mãe de Vossa Excelência!", e vai tudo para os anais.

Quanto a mim, sou a favor do respeito. Em 1967, ao atazanar Guimarães Rosa por telefone para uma entrevista sobre sua posse no dia seguinte na Academia Brasileira de Letras, só o chamei, claro, de "embaixador". Mas ele, muito amável, não me recebeu. E, em 1983, ao entrevistar Jânio Quadros para a Folha em sua casa no Guarujá, tratei-o pelo obrigatório título de "presidente".

A conversa com Jânio, ótima, avançou pelo dia, regada a vodcas, uísques, cervejas e licores, servidos por ele. Nunca um presidente entornou tantas —hic!— e continuou a ser chamado de "presidente".


Deirdre Nansen McCloskey O liberalismo é chato, FSP

 O liberalismo é notavelmente aborrecido. Tratar os outros com o mesmo respeito e a mesma autorização perante a lei, como fazem, por exemplo, os chatos suíços, não acelera os batimentos cardíacos. Por outro lado, o populismo é excitante. Tratar il duce como um soberano sagrado e tratar judeus, imigrantes, mulheres, homossexuais ou estudantes universitários como demônios aumenta a pulsação a 100 batimentos por minuto.

Há poucos dias, no centro de Dublin, na Irlanda, país que, em uma longa geração, passou do socialismo mágico e da tirania católica para o liberalismo moderno e assim para a quinta maior renda per capita do mundo, uma multidão de populistas incendiou automóveis e lutou com a polícia. Excitante. Os demônios? Imigrantes, especialmente aqueles que fogem de tiranias populistas em outros lugares. A multidão foi instigada por um boato na internet sobre um ataque a faca supostamente cometido por um refugiado. A teoria justificativa? Que os refugiados estão tomando nossas moradias, tal como os judeus estão tomando nossa economia ou os negros estão roubando nossas mulheres.

A habitação é, na verdade, absurdamente cara em Dublin, mas isso tem pouco a ver com os refugiados. A explicação econômica, chata, liberal, adulta e sensata para o alto preço das moradias, assim como ocorre em todo o mundo em cidades como Londres, San Francisco e São Paulo, é que os interessados locais, como os proprietários e os urbanistas, regulamentaram excessivamente a construção de novas habitações. Oh, não, dizem os populistas. São os demônios. Vamos matá-los. Vamos conseguir um novo duce para fazer isso. A excitação de cada eleição, mesmo em lugares geralmente adultos e liberais, como o seu país e o meu, pelo menos nos dias pares do mês, vem da excitação infantil sobre um novo duce, e a crença pré-moderna e mágica de que ele transformará todas as nossas decepções em ouro.

O liberalismo também é surpreendentemente moderno. Estou lendo um livro excelente chamado India in the Persianate Age [Índia na era persa], de Richard M. Eaton, que mostra que dois imperadores do século 17 experimentaram a modernidade regida pela lei. Talvez lei demais, como na regulamentação da moradia, mas pelo menos não a velha e altamente popular ideia do soberano sagrado. Isso muito antes da chegada dos britânicos. É verdade que o liberalismo total só se consolidou em 1991, e Modi o ameaça com o populismo.

Eu digo: cresçam, sejam modernos e fiquem ricos.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

A ‘carta na manga’ da oposição a Tarcísio se a privatização da Sabesp for aprovada, OESP

 A oposição ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), avisa que vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) se a Assembleia Legislativa do Estado aprovar, na tarde desta quarta-feira, a privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

Essa é a principal “carta na manga” da bancada contrária à privatização, que já aposta na aprovação do projeto de lei em dicussão. Em um movimento encabeçado pelo deputado federal Emídio de Souza (PT), amigo pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a oposição argumentará junto ao STF que a privatização da Sabesp não pode ser feita via projeto de lei, como está acontecendo, mas apenas por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

O deputado federal Emídio de Souza (PT-SP).
O deputado federal Emídio de Souza (PT-SP). Foto: Divulgação/Alesp

A medida só poderá ser protocolada após a aprovação do texto por se tratar de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin).

A mesma argumentação já foi apresentada por Emídio junto ao Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo, mas foi indeferida. Nos bastidores, porém, deputados estaduais contrários à privatização avaliam ter mais trânsito junto ao STF do que à Justiça paulista — o que facilitaria, por exemplo, a conquista de uma decisão liminar barrando a privatização.

Obrigar o governo estadual a recorrer a uma PEC para privatizar a Sabesp pode ser um empecilho aos planos de Tarcísio, que tem a entrega da companhia para o controle da iniciativa privada como uma promessa de campanha. Afinal, para aprovar uma mudança constitucional em São Paulo é necessário ter ao menos 57 votos em dois turnos, enquanto um projeto de lei é preciso apenas 48 votos entre os 94 deputados.