Expulso do DEM e advertido por chamar pares de vagabundos, membro do MBL e youtuber afirma que não é 'moleque bobo xingando todo mundo'
SÃO PAULO
A notoriedade obtida com uma sequência de brigas serve para alavancar o deputado estadual Arthur do Val, o youtuber Mamãe Falei, na corrida pela Prefeitura de São Paulo, mas esse comportamento não definirá sua gestão no cargo.
Assim promete o segundo mais votado da Assembleia Legislativa paulista, num cenário em que o próprio presidente da República é criticado por não abandonar o estilo deputado baixo clero e adequar-se à liturgia do cargo.
No último dia 4, um empurra-empurra entre deputados começou quando petistas ameaçaram agredir Arthur, que havia chamado sindicalistas presentes na Assembleia 11 vezes de vagabundos —mesmo termo que utilizou contra seus pares em outra ocasião e, por isso, recebeu advertência verbal.
"Quando você é o chefe do Executivo, a sua postura tem de ser outra. Você tem de ter uma postura às vezes menos combativa e mais flexível", diz Arthur em entrevista à Folha em seu gabinete.
Para viabilizar seu projeto, está em busca de um partido —foi expulso do DEM há um mês. Arthur servirá de laboratório do MBL (Movimento Brasil Livre), grupo do qual faz parte, para candidaturas majoritárias.
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O deputado tem críticas a Bolsonaro e a João Doria (PSDB), mas compartilha de valores da direita. Seu objetivo é enxugar radicalmente o Estado.
Chamar servidores de vagabundos é compatível com o cargo de deputado estadual? Acho que sim. Eu não xinguei servidores, minha mãe é professora pública, minha tia também, tenho dois avós que trabalharam até morrer como enfermeiros do estado.
O que eu xinguei foram sindicalistas que estavam ali me ameaçando de morte, chamando a mim e às pessoas que votavam sim no projeto [da reforma da Previdência] de nazistas, assassinos. Eu não falo que servidor é tudo vagabundo. Eu olho no cara e falo: "você de óculos aí, você é vagabundo". E eu reafirmo. Sindicalista que se apoia nas costas do trabalhador para ficar sustentando mamata é vagabundo mesmo.
Mas é postura de deputado chamar para a briga? Eu não chamei para a briga. Em nenhum momento falei "vamos sair na porrada". Se eu estou aqui e acredito na política é porque não acredito na barbárie. Meu jeito sempre foi mais combativo, e vou continuar assim. Tomei bastante cuidado. As minhas palavras, por mais que eu pareça ali que eu estou exaltado, usei com muita cautela.
O sr. não estava exaltado? Não. Eu estava dentro da normalidade. Lógico, um pouquinho, mas eu não estava fora de controle.
O sr. tem maturidade política e pessoal para ser prefeito? Sim. Existe um efeito colateral do tipo de comunicação que eu faço, mas é um caminho que eu escolhi. E o trabalho que não é midiático e a gente faz? Que é ter convicção de votar contra um monte de politicagem que acontece aqui na Casa.
Eu não surgi do nada. Não sou um cara que de repente abriu um canal no YouTube e não tinha nada para falar. Fui trabalhar, abri empresa, tive sucesso na iniciativa privada. Então existe, sim, uma maturidade. Não é um moleque bobão xingando todo mundo. É alguém que tem um trabalho sólido e uma conduta condizente com os ideais que prega.
Eu não surgi do nada. Não sou um cara que de repente abriu um canal no YouTube e não tinha nada para falar. Fui trabalhar, abri empresa, tive sucesso na iniciativa privada. Então existe, sim, uma maturidade. Não é um moleque bobão xingando todo mundo. É alguém que tem um trabalho sólido e uma conduta condizente com os ideais que prega.
Como prefeito, o sr. vai negociar com sindicalistas? Ou vai dizer que é vagabundo? Quando você é o chefe do Executivo, a sua postura tem de ser outra. Você tem de ter uma postura às vezes menos combativa e mais flexível.
O prefeito Mamãe Falei não terá a mesma atitude do que o deputado Mamãe Falei, então? Com certeza. São papéis diferentes. É a mesma pessoa, sou o mesmo cara, tenho as mesmas convicções. Agora, o jeito de me comportar é diferente.
É possível fazer muitas críticas aos sindicatos e à maneira como operam. Mas o sr. não entende que eles são legítimos? Depende. A partir do momento que tem financiamento compulsório e a unicidade sindical obrigando que você se filie somente àquele sindicato, então você não tem concorrência, não pode dizer que aquilo é legítimo.
Mas a lei é assim. A culpa é deles? Opa, claro que é. A lei foi feita desse jeito por causa de pressão de corporações como sindicatos. Eu não estou falando que sindicato não deveria existir. Deveria existir nos moldes espontâneos.
Quais são os seus principais feitos aqui na Casa? Como eu realizo meu trabalho aqui? Sendo o deputado mais barato da Casa. Eu tenho apenas 6 dos 32 funcionários que eu posso ter, abri mão de todos os benefícios. Isso manda um recado para todos os outros parlamentares e para a sociedade.
E eu barrei os principais projetos que desrespeitam o dinheiro público. Barrei sozinho o projeto que aumentava em R$ 4.000 o benefício para os deputados alugarem carro aqui. O projeto estava quase passado, corri na Comissão de Finanças, fiz um discurso de três minutos e pouco que finalizou a sessão, viralizou e a partir de então os deputados ficaram constrangidos em votar.
Por que o sr. não declarou nada de verba de gabinete? O sr. não comprou nem uma folha de sulfite em nove meses? Não. Às vezes eu recebo um convite de um evento que vai ter aqui na Casa. Aí vem um envelope lindo, com a cara do deputado, brilhante. Quanto será que custou? Não é só pelo valor do envelope, é pelo recado que passa. No começo do ano eu gastei R$ 150, comprei alguns pacotes de folha de sulfite, uma caixa de caneta, um pouco de clipes e até hoje ninguém precisou mais.
O MBL, ao qual o sr. é ligado, defende privatização. Como o sr. avalia o programa de desestatização atual da prefeitura, e o que mudaria? É um programa bem-intencionado, só que por alguns motivos não deu certo. Se você pegar a privatização do Anhembi, ninguém se interessou. Se não apareceu nenhum interessado, está esquisito.
O MBL, ao qual o sr. é ligado, defende privatização. Como o sr. avalia o programa de desestatização atual da prefeitura, e o que mudaria? É um programa bem-intencionado, só que por alguns motivos não deu certo. Se você pegar a privatização do Anhembi, ninguém se interessou. Se não apareceu nenhum interessado, está esquisito.
Eu posso dizer a mesma coisa da Prodam, do autódromo e das praças. O Doria veio com uma ideia muito boa, de passar praças para concessão privada onde você vai poder explorar atividade econômica. É bem-intencionado, mas foi tecnicamente mal feito. Eu faria mais parecido com Nova York, no Central Park você pode comprar o banco onde conheceu sua esposa.
A sua ideia é privatizar tudo? A gente não pode ser liberal bobo. Não posso chegar aqui e dizer "ah, é absurdo ter subsídio para transporte". Nenhuma cidade do mundo, fora Seul, conseguiu não subsidiar transporte. Se você fizer um estudo técnico dentro de um parâmetro aceitável, dá para privatizar praticamente tudo.
A sua ideia é privatizar tudo? A gente não pode ser liberal bobo. Não posso chegar aqui e dizer "ah, é absurdo ter subsídio para transporte". Nenhuma cidade do mundo, fora Seul, conseguiu não subsidiar transporte. Se você fizer um estudo técnico dentro de um parâmetro aceitável, dá para privatizar praticamente tudo.
Escola, saúde, inclusive? Não, isso eu nem posso pela Constituição. O que dá para ser feito são programas liberais de voucher. Sobre transporte por aplicativo, sou a favor da completa desregulamentação desse tipo de serviço.
Como vê o cenário eleitoral? Acha que consegue pegar o voto da direita bolsonarista? Sim. O cenário é o seguinte. Tem a esquerda da lacração, a esquerda PSOL, que tem um engajamento forte, mas um teto [de votos] baixo. Tem a esquerda petista, que atrapalha a esquerda não-petista, provavelmente o Márcio França (PSB).
Na direita, temos no meio o Bruno Covas (PSDB) com voto de máquina. Na centro-direita, o Andrea Matarazzo (PSD), o Felipe Sabará (Novo) e eu. E uma direita mais ideológica, com algum candidato do Bolsonaro.
Tem a Joice Hasselmann (PSL), que é uma incógnita. Acabou de sair um vídeo dela dançando com o Doria. É simbólico. Ela está chutando o Bolsonaro e abraçando o Doria. Qual a viabilidade eleitoral disso? Bem questionável.
O sr. não tem partido. Essa incerteza vai até quando? Estou conversando com muita gente. É impressionante como os partidos são rachados. Estamos com conversas avançadas. O que sei é que não vou ser vice de ninguém.
Sua campanha vai ser muito centrada no combate aos privilégios. Isso como bandeira de candidato a prefeito não é insuficiente? Minha campanha não vai ser centrada nisso. Tudo bem, você vai combater privilégios, mas e a saúde? E a educação? A mulher que quer levar o filho na creche está muito mais preocupada com a realidade imediatista do que com os privilégios. E eu não vou julgar moralmente se isso é certo ou errado.
As pessoas têm demandas reais. A base da minha candidatura à prefeitura não é minha experiência de deputado. Eu aprendi muito mais na vida privada e na vida real do que como deputado.
Arthur do Val, 33
Nascido em São Paulo e formado em engenharia química, atuou no comércio e distribuição de resíduos metálicos e gerenciou um estacionamento. Em 2015, abriu o canal "Mamãe Falei" no Youtube, com mais de 2,6 milhões de inscritos, onde faz provocações à esquerda e prega liberalismo econômico. É membro do MBL. No ano passado, viralizou ao receber um pescotapa de Ciro Gomes (PDT). Foi o segundo deputado estadual mais votado de São Paulo, com 478 mil eleitores.
Nascido em São Paulo e formado em engenharia química, atuou no comércio e distribuição de resíduos metálicos e gerenciou um estacionamento. Em 2015, abriu o canal "Mamãe Falei" no Youtube, com mais de 2,6 milhões de inscritos, onde faz provocações à esquerda e prega liberalismo econômico. É membro do MBL. No ano passado, viralizou ao receber um pescotapa de Ciro Gomes (PDT). Foi o segundo deputado estadual mais votado de São Paulo, com 478 mil eleitores.