terça-feira, 4 de dezembro de 2018

OPINIÃO MIGUEL DE ALMEIDA Não existe amor em SP, FSP

Miguel de Almeida
O paulistano é, antes de tudo, um forte.

Acompanhe a cena: emissários da prefeitura da mais rica cidade da América do Sul perturbam uma tranquila senhora de classe média. Ela é viúva de um importante engenheiro. O que desejam os amanuenses?

Eles querem saber se --por acaso, Deus é pai, vai-que-damos-sorte, tóc-tóc três vezes-- ela guarda documentos de projetos realizados por seu falecido marido e, se lá no meio, entre eles, há referência--cruze os dedos-- a um viaduto de quase mil metros construído em uma das avenidas mais movimentadas do planeta"!

A senhora deve ter dado aquela risadinha interna, e respondeu que jogara tudo dele logo após sua morte.
Os emissários da prefeitura de uma das maiores cidades do mundo voltam à repartição com a cara de quem presenciou um karaokê com Roberto Justus e Marilia Gabriela.

Horas depois, o secretário municipal responsável pela área viária tenta uma pirueta petista: afirma que o viaduto passou sim, óbvio, por uma vistoria meses atrás, e nada se verificou. E o laudo técnico? O amanuense é taxativo: não pode mostrar porque é documento sigiloso!

Imaginando, é claro, que esse laudo foi feito, que tenha havido uma inspeção e que a secretaria haja cumprido seu papel de cuidar da infraestrutura da cidade. Sabe, eu, como João Doria, acredito que comunista come criancinha.

Até a data em que escrevo, seis quilômetros da marginal Pinheiros continuam interditados, e a prefeitura gastou apenas 5,3% do valor previsto na recuperação ou em obras em pontes e viadutos de São Paulo.

Dos R$ 44,7 milhões reservados pela municipalidade, somente R$ 2,4 milhões foram utilizados. Chamemos isso de criminalidade administrativa ou de Acelera São Paulo?

Não é por falta de aviso que o viaduto ruiu. Há pelo menos quatro prefeitos (Kassab, Haddad, Doria e o atual, Covas), o Ministério Público alerta que pontes e viadutos paulistanos necessitam de reparos.

A pauliceia tenta reagir. Haddad não se reelegeu; Doria perdeu feio na capital para um desconhecido governador tampão, e Bruno Covas, bem, quem é Bruno Covas?

Este é o problema da maior cidade da América Latina. Seus alcaides só desejam o cargo como trampolim. Em seus olhos e corações não há amor por São Paulo.

Não tivemos a sorte de um Michael Bloomberg, ex-prefeito de Nova York. Ou de um Jacques Chirac, ex-prefeito de Paris. O milionário alcaide nova-iorquino, por exemplo, ofereceu desde o pensamento de moradias populares na riquíssima Manhattan (e não essa vagabundagem do Minha Casa, Minha Vida petista ou do marqueteiro Cingapura malufista) aos cuidados do bem-estar auditivo quando proibiu as buzinas dos carros --além de vetar que se fume dentro dos parques públicos (não vou falar do grande Giuliani, que tirou Nova York da falência e as gangues das ruas).

Foram prefeitos. E o que é um prefeito? É o cara que cuida da cidade onde você mora com carinho, como se fosse o seu jardim, o seu quarto e o seu escritório. Ele acorda e dorme com a cidade na cabeça. Mostra-se solidário com o espírito da comunidade, do mais simples amanuense ao banqueiro.

Como herdeiro da urbanidade de Baudelaire, observo São Paulo e Rio, cidades onde passei maior número de meus anos, e facilmente constato como discutimos grandes questões (Lava Jato, impeachment etc) e elegemos uns sem-vergonhas de prefeitos, montados somente em suas ambições de alpinismo político.

Convivemos com o pior asfalto do planeta, calçadas fora da lei, a falta de e o descuido com as áreas verdes. Peraí, quem é Bruno Covas?
Miguel de Almeida
Escritor e diretor dos documentários "Não Estávamos Ali para Fazer Amigos" e "Tunga, o Esquecimento das Paixões"

Com fim do Ministério do Trabalho, Paulo Guedes vai gerir FGTS e FAT, OESP

Idiana Tomazelli, Julia Lindner e Luisa Marini, especial para o Estado
03 Dezembro 2018 | 19h07
Atualizado 04 Dezembro 2018 | 09h42

BRASÍLIA - O superministério da Economia de Paulo Guedes vai ficar com a gestão de dois fundos bilionários do governo: o FGTS e o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), que banca os pagamentos de abono salarial e seguro-desemprego. Juntos, ele reúnem um patrimônio de R$ 800 bilhões em recursos dos trabalhadores e são considerados estratégicos para o financiamento de investimentos em habitação, infraestrutura e saneamento
A transferência da gestão do FGTS e do FAT para a Economia foi definida após o fatiamento do que é hoje o Ministério do Trabalho. No centro de uma série de investigações deflagradas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, a pasta será extinta no governo do presidente eleito, Jair Bolsonaro.

Onyx Lorenzoni
'Queremos apresentar um modelo que vem sendo estudado para durar 30 anos', disse Onyx Lorenzoni. Foto: Adriano Machado/Reuters
Segundo o desenho apresentado nesta segunda-feira, 3, pelo ministro extraordinário da transição, Onyx Lorenzoni, as atribuições atuais do Ministério do Trabalho serão divididas entre as futuras pastas da Economia (Paulo Guedes), da Justiça (Sergio Moro) e da Cidadania (Osmar Terra).
Moro deve receber a estrutura responsável pelos registros sindicais, justamente uma das que foram alvo de investigações recentes. As investigações da Operação Registro Espúrio concluíram que 39 pessoas participaram de uma organização criminosa que teria atuado para fraudar registros sindicais no atual Ministério do Trabalho, inclusive ex-ministros e parlamentares.
Já o Ministério da Cidadania ficará responsável pela estrutura de promoção de políticas para formação profissional. Auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) revelada pelo Estadão/Broadcast no ano passado mostrou que programas de qualificação profissional bancados pelo Ministério do Trabalho desde 2003, ao custo de R$ 1,75 bilhão, empregaram apenas 10% dos beneficiados.
Além da gestão do FGTS e do FAT, Paulo Guedes deve ficar responsável pela área de políticas para geração de empregos e com a parte de fiscalização. Apesar disso, Onyx afirmou na segunda-feira que ainda está em discussão se a fiscalização de trabalho escravo ficará com Economia ou Justiça.

Fundos

O ministro extraordinário da transição disse que os “ajustes finos” ainda estão sendo feitos na nova estrutura. A transferência da gestão do FGTS e do FAT para a pasta comandada por Guedes pode ajudar na tarefa do futuro ministro de revisar parte dos gastos obrigatórios.
A equipe econômica do governo Michel Temer já defendeu junto ao time de Guedes restringir ou até acabar com o chamado abono salarial, benefício para quem ganha até dois salários mínimos e que custará mais de R$ 19 bilhões no ano que vem.
A revisão das regras do seguro-desemprego também está entre as medidas defendidas pelo atual governo como necessárias para reduzir as amarras no Orçamento e abrir espaço para outros gastos, como os investimentos. Os gastos com abono e seguro-desemprego devem chegar a R$ 59,8 bilhões em 2019, o equivalente a 4,2% das despesas primárias.
No caso do FGTS, a migração da gestão para a Economia também contempla o FI-FGTS, fundo de investimentos que usa parte dos recursos dos trabalhadores para aplicar em infraestrutura. Os aportes do FI-FGTS feitos no passado também estiveram sob escrutínio da Justiça por suspeitas de favorecimento em troca de propina.
Em nota, o Ministério do Trabalho afirmou que a extinção do órgão é inconstitucional e coloca fim a um canal de interlocução entre empregadores, trabalhadores e Estado.
Entidades sindicais e de preservação de direitos trabalhistas temem que o fim do Ministério do Trabalho provoque um retrocesso na mediação das relações entre trabalhadores e empregados e no combate ao trabalho escravo.

Previdência

Onyx Lorenzoni indicou que a reforma da Previdência pode levar um pouco mais de tempo até ser enviada ao Congresso Nacional. Ele reconheceu também que o presidente eleito ainda não definiu quais assuntos prioritários serão endereçados primeiro quando o novo Congresso assumir em 1.º de fevereiro.
Ele disse que a reforma da Previdência, medida mais aguardada pelos investidores e considerada essencial para garantir a sustentabilidade das contas, não será feita “no afogadilho” e que será preciso ter “paciência”. “Por isso a gente não fala de modelo específico, não fala de prazo, porque tem que ser uma coisa bem construída. Temos quatro anos para garantir futuro dos nossos filhos e netos”, disse.
Paulo Guedes tem destacado a importância de endurecer as regras para se aposentar no Brasil como uma das medidas prioritárias. Na segunda-feira, Onyx confirmou o nome do economista Abraham Weintraub para a secretaria-executiva da Casa Civil, número dois na hierarquia da pasta e um dos pontos-chave do governo. A informação foi antecipada pelo Estadão/Broadcast.
No arranjo que está sendo desenhado pela equipe de transição, a ideia é que uma das prioridades da secretaria vinculada à Casa Civil seja a condução das discussões para apresentar ao Congresso uma nova proposta de reforma da Previdência. Esse trabalho já vem sendo desempenhado por Abraham e seu irmão, Arthur Weintraub, responsáveis na transição pelo tema da Previdência.
“Reforma da Previdência tem que ser feita com prudência, com boa transição, respeitando direito das pessoas”, disse Onyx, que por enquanto atua como ministro extraordinário da transição, coordenando o diálogo entre o atual e o novo governo.
Segundo ele, a tramitação da reforma da Previdência no Congresso vai acompanhar o trabalho de convencimento dos parlamentares. Ele reafirmou ainda que o novo governo “não quer remendo” e por isso resistem em adotar o texto apresentado pelo presidente Michel Temer que está pronto para ser votado no plenário da Câmara.
De acordo com o ministro da transição, as prioridades do novo governo no Congresso serão definidas nas próximas semanas. A partir de quarta-feira, os grupos técnicos começarão a apresentar seus diagnósticos e só então Bolsonaro vai definir a estratégia. “Nesse momento não dá para dizer ainda qual será a prioridade”, afirmou Onyx. 

Nomeações no Judiciário e pressão externa de usurpadores do poder, FSP

Frederico Vasconcelos
Sob o título “Ato Jurídico Perfeito e Juiz Natural”, o artigo a seguir é de autoria de Alfredo Attié, presidente da Academia Paulista de Direito e desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. O autor é Doutor em Filosofia da Universidade de São Paulo.
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Haverá algum assunto que diga respeito apenas ao foro interno do Poder Judiciário?
A Constituição de 1988, que completou trinta anos, em outubro, impulsionou mudanças substanciais na crença de que haveria uma esfera administrativa no interior desse 
Poder fechada ao escrutínio da sociedade.
O Princípio da Moralidade Administrativa, antes de tudo, impôs a construção e a concertação de mecanismos de fiscalização e controle que ultrapassaram as tradicionais estruturas da Corregedorias dos Tribunais, antes soberanas, absolutamente.
A criação do Conselho Nacional de Justiça, pela Emenda Constitucional 45/2004, após o longo debate sobre a pertinência de um controle externo do Poder Judiciário, veio a consolidar a tendência de centralização da organização administrativa do Poder Judiciário brasileiro, e, como corolário, a da necessidade de fiscalização dos atos que, até seu advento, os Tribunais consideravam soberanos, no âmbito de sua atuação.
O próprio Supremo Tribunal Federal firmou jurisprudência, no sentido de o controle dos atos do Conselho Nacional de Justiça se mostrar excepcionalíssimo, mormente evitando interferir no sistema de freios e contrapesos estabelecido pelo constituinte.
É a sociedade brasileira a protagonista da cena política e jurídica. A Constituição o estabelece em fórmula lapidar: todo poder emana do povo e em seu nome é exercido, por representantes eleitos. É a consagração do princípio do Estado democrático de Direito, que obriga a Administração Pública, em qualquer de suas esferas e em qualquer de seus âmbitos, a se submeter ao controle da sociedade, por meio dos órgãos incumbidos pelo povo, por meio de seus representantes legítimos, a realizar atos de fiscalização.
O Princípio da Moralidade Administrativa garante à sociedade que qualquer ato da Administração será impessoal e público. Não será, portanto, dirigido a beneficiar determinadas pessoas, como no passado, em que o princípio do parentesco e da “amizade” – na verdade cumplicidade – permitiam que nomeações fossem feitas ao alvedrio do administrador, contrariando normas estabelecidas. Muito menos que esses atos arbitrários fossem cometidos em segredo.
A questão da nomeação para cargos e funções públicas, com efeito, segue critérios rígidos, que não podem ser contornados. A Constituição, a par da Moralidade, exige que requisitos certos sejam seguidos, sob pena de se contrariar não apenas a Lei, mas sobretudo o interesse da sociedade, que é o de atenção objetiva aos valores republicanos e democráticos do império da lei.
A questão da promoção, no interior das carreiras públicas, é apenas consequência do que aqui se afirmou a respeito da nomeação. A promoção segue as regras da lei em vigor, para evitar que se privilegie ou se prejudique alguém, apenas porque o administrador ou o órgão da Administração do momento têm suas preferências. A promoção e as listas de antiguidade e merecimento seguem a lei (legalidade), e são conformadas pelos critérios da moralidade, da impessoalidade e da publicidade.
Como isso se dá no Poder Judiciário? Haverá regras excepcionais, que permitem que esses princípios sejam contrariados? A sociedade pode estar alheia aos critérios 
estabelecidos e ao modo como age o Judiciário, nas nomeações, promoções e fixação de listas de antiguidade e merecimento?
É evidente que não. No Judiciário, as regras são ainda mais rígidas. Enfim, está em jogo a capacidade de julgar, que um espírito pioneiro considerava terrível entre os homens. Julgar as relações sociais, qualificadas pelo direito. Com imparcialidade, impessoalidade, abstração de interesses familiares ou de afinidade, busca de atender plenamente aos critérios da Lei, na exata compreensão e no fiel cumprimento da Constituição. É isso que se pode chamar fazer Justiça, de modo autêntico. E é para isso que o Judiciário foi criado, para evitar o arbítrio do poder, seu abuso por administradores descomprometidos com o que determinam princípios e regras de sua ação.
As regras e princípios que regem a função dos juízes (desembargadores e ministros) são garantias da sociedade. Garantia dos jurisdicionados de serem julgados pelo órgão jurisdicional certo, e não por julgadores escolhidos segundo o arbítrio interno de tribunais, ou a pressão externa de usurpadores do poder.
Assim é que um princípio basilar da jurisdição, ou seja, da função que exercem juízes e juízas, é o princípio do juiz natural.
Abra o leitor leigo os dicionários e as enciclopédias e verá que esse princípio não é apenas tema de direito, mas da história das conquistas da humanidade em direção a uma ordem jurídico-politica justa e legitima.
O conceito de tribunal de exceção relaciona-se intimamente com a ideia de que o cidadão, ao ser julgado, estará diante do juiz que foi nomeado e promovido na forma da lei, de modo impessoal, em procedimento público, observada a moralidade. E não diante de um julgador escolhido contra a lei, pinçado segundo preferências pessoais de 
um órgão, seja ele qual for, que aplica regras que também escolhe, sem observar o ordenamento jurídico.
Refiro, aqui, uma questão a que, aparentemente, a cidadania não tem prestado atenção. Mormente o órgão porta-voz dessa cidadania, que é a imprensa.
Importa à sociedade a nomeação e a promoção de seus juízes, porque a sociedade quer que os julgamentos sejam feitos pelos juízes postos em seus cargos e funções de modo regular, jurídico, propriamente.
Toda vez que essa ordem é burlada, é a sociedade que fica ameaçada, seja por que critério for, seja qual for a justificativa – anticonstitucional, sempre – dessa irregularidade.
Há muitas irregularidades passíveis de ocorrer. Elas dirão sempre respeito a uma desobediência ao artigo 37 da Constituição Federal.
Uma dessas irregularidades pode ser determinada pela contrariedade ao Ato Jurídico Perfeito.
Pense o leitor que assinou um contrato em 2006. Nesse ano, a lei lhe assegurava que, por meio desse contrato, tornava-se proprietário de uma casa, mediante o pagamento de um determinado valor, e o registro público da compra. Assinado o contrato, pago o valor, e registrado o contrato no órgão competente, o leitor se tornava proprietário da casa. Entretanto, em 2009, três anos depois, após haver o leitor adquirido a propriedade regularmente, a lei muda e diz que aquela propriedade não é mais sua, mas de outro.
Ora, o Princípio do Ato Jurídico Perfeito protege o nosso proprietário, que adquiriu a casa em 2006. A mudança de uma regra não afeta os atos consolidados antes da vigência dessa regra. E isso para proteger as pessoas de arbitrariedades, exigindo que haja segurança nas relações jurídicas. À aquisição da propriedade em 2006 aplica-se a regra de 2006.
A regra de 2009 não pode retroagir a 2006 para desfazer algo que está perfeito e acabado. Não pode querer beneficiar assim, contra a Constituição, o amigo daquele que pretende essa aplicação monstruosa.
Isso se aplica também na Administração Pública. Se alguém foi promovido e classificado em 2006, não pode perder seja a promoção seja a classificação, consolidada em 2006, por causa da mudança de uma regra havida em 2009.
Permitir que isso ocorra é grave e abala a ordem jurídica, mormente se ocorre no interior do Judiciário, desfazendo o elo de confiança entre jurisdição e jurisdicionados, entre justiça e cidadania.
Toda vez que isso ocorre, uma nuvem cinzenta se instala sobre a Administração. Se essa nuvem está sobre o Judiciário brasileiro, é fato grave, que precisa ser corrigido a tempo.
Não são apenas juízes e juízas que serão prejudicados por uma inconstitucionalidade, mas a sociedade como um todo. Sobretudo o próprio Poder Judiciário, que foi criado para cumprir e fazer cumprir a Constituição e a Lei, e nunca para as contrariar.
Cabe ao Judiciário impedir que se estabeleça um atentado à Constituição. À imprensa inteirar-se do que ocorre e informar, pois é povo detém o poder, e precisa ser informado das arbitrariedades que o impedem de exercer seus direitos, seu controle, seu acesso a uma Justiça verdadeiramente legítima.