domingo, 22 de maio de 2016

Ministério da Cultura: uma oportunidade desperdiçada, POR BERNARDO GUIMARÃES


O maior desafio do novo presidente é colocar a economia brasileira nos trilhos. Isso requer ajustar as contas públicas para evitar um crescimento explosivo da dívida.
Esse ajuste é muito complicado em uma recessão, pois a arrecadação de impostos é menor e aumentar impostos nesse momento torna ainda mais difícil a recuperação.
Se o novo governo conseguisse transmitir confiança aos investidores e, assim, atrair investimentos, a tarefa seria menos complicada por dois motivos: esse aumento no investimento e na produção teria um efeito positivo na arrecadação (menos cortes seriam necessários); e o consequente aumento no nível de emprego colaboraria para a popularidade do novo governo e, assim, reduziria a oposição às reformas.
Então, como transmitir confiança?
O governo precisa convencer os agentes econômicos que será capaz de aprovar uma série de medidas econômicas que implicam em gastos públicos menores e/ou impostos maiores. Muita gente vai reclamar.
Portanto, para transmitir confiança, o presidente precisa mostrar que será capaz de suportar pressões de vários grupos e de angariar algum apoio da opinião pública.
A questão do Ministério ou Secretaria da Cultura é pouco relevante. Em princípio, a mudança poderia ser só uma troca de nome. Só que Michel Temer poderia ter usado esse episódio para transmitir confiança.
Usando a terminologia de teoria dos jogos, a chiadeira contra a extinção do Ministério da Cultura deu ao presidente a oportunidade de “sinalizar seu tipo”, ou seja, deu-lhe a chance de mostrar que teria condições de suportar pressões e ditar a agenda.
Por exemplo, me parece que seria fácil para o governo olhar os orçamentos dos ministérios e:
(1) Achar algum motivo pelo qual faria sentido ter o Ministério da Cultura junto com o da Educação. Alguma secretaria ou órgão com função parecida nos dois ministérios, ou alguns programas que poderiam ser combinados, alguma sinergia, qualquer coisa. Qualquer coisa que pudesse ser usada para argumentar que a mudança será benéfica (mesmo que depois alguém pudesse apontar contra argumentos).
(2) Achar algum gasto que pode ser cortado, algum incentivo que pode ser modificado (talvez por algum tempo), alguma coisa que signifique uma economia de recursos e que a maior parte da população seja a favor (claro que alguns vão chiar, é preciso aguentar).
(3) Achar algum gasto que foi cortado, algum programa que não foi executado pela gestão anterior, qualquer coisa que custe menos que o que será cortado (o item 2) e pareça um melhor uso de recursos.
Por exemplo: seria reduzido o incentivo fiscal a grandes empresas (ou bancos!) que financiam eventos direcionados aos mais ricos (com ingressos caros); aumentaria o incentivo fiscal para algum tipo de projeto de arte com entrada franca. No total, o país economizaria um troco.
Os jornais trariam os argumentos dos Ministros ou Secretários com números e exemplos que quase ninguém conhece ou tem acesso (ou paciência para olhar). Até alguém achar os dados, entender o assunto e estruturar um bom contra-argumento, levaria uma semana. Nesse tempo, o assunto já estaria esfriando e o debate ficaria restrito aos mais interessados.
A economia de recursos seria ínfima se comparada ao tamanho do ajuste, mas o governo conseguiria “sinalizar seu tipo”.
À opinião pública, o governo passaria a impressão de saber o que está fazendo e de estar buscando um ajuste fiscal razoável.
Aos mais cínicos (como eu), o governo passaria a impressão de conseguir suportar pressões e de ser capaz de trazer a opinião pública para seu lado. Investidores passariam a acreditar que o governo teria condições de fazer limonadas dos vários limões que ainda serão atirados quando medidas de ajuste forem propostas.
Ao invés disso, temos as piadas sobre o Ministério do Recuo.
A teoria dos jogos nos diz que quem não aproveita a chance para transmitir uma mensagem positiva efetivamente transmite uma mensagem negativa.
A implicação é que os agentes econômicos devem ficar um pouco mais céticos em relação à capacidade desse governo aprovar as medidas de ajuste.

A TV pública como palanque, por Mauricio Sticer


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No bangue-bangue que se seguiu ao afastamento da presidente Dilma Rousseff e à posse do interino Michel Temer, um dos primeiros alvos atingidos foi a área de comunicação.
A confusão destes dias iniciais não deixa dúvida de que o novo governo tem a intenção de mexer de forma drástica na EBC (Empresa Brasil de Comunicação), responsável pela TV Brasil.
O primeiro sinal foi dado pela demissão nesta terça-feira (17) do presidente da empresa, o jornalista Ricardo Melo. Temer, que quer colocar um aliado no lugar, causou espécie por tomar uma atitude juridicamente questionável. O estatuto da EBC estabelece que o presidente tem mandato de quatro anos e só pode ser demitido por vontade própria ou falha grave no exercício da função.
Melo foi nomeado por Dilma no último dia 4, apenas sete dias antes do início da votação no Senado que resultou na suspensão do mandato da presidente. O cargo estava vago havia três meses, desde que o jornalista Américo Martins pediu demissão.
À época, especulou-se que o jornalista estaria insatisfeito com pressões recebidas do governo para indicação de nomes e alterações na grade da TV Brasil.
Reside aí, justamente, um dos pontos centrais da discussão. Como critica Eugênio Bucci em "O Estado de Narciso" (Companhia das Letras, 2015), "a comunicação pública no Brasil virou um palanque partidário, um negócio lucrativo, uma passarela para a vaidade particular e, sem exagero nenhum, uma arma a serviço da guerra eleitoral".
Tese de livre-docência apresentada à USP em 2014, o estudo reflete experiências do autor em dois níveis –como presidente da Radiobrás (2003-2007) e como conselheiro da Fundação Padre Anchieta, responsável pela TV Cultura, em São Paulo.
Bucci chama a atenção para o erro, cometido em todas as instâncias de poder, de achar legítimo o uso da comunicação pública para defender o ponto de vista de um partido ou uma coalizão. "A comunicação pública só se justifica dentro do Estado democrático de Direito se ela realizar o dever do Estado de informar".
Na sua visão, uma falha grave na estrutura da EBC é o fato de os dois cargos principais da empresa serem uma escolha do presidente do país. Bucci também critica o vínculo funcional da estatal com o governo por meio da área de comunicação social, e não a de cultura. "Não há possibilidade de decisões que contrariem as diretrizes expressas dos ministros e do presidente da República."
A situação, observa, é semelhante na TV Cultura. "Não existe, na história da Fundação, uma única decisão grave que tenha prevalecido contra a vontade do governador de turno".
Concordo que mudanças no modelo são necessárias. Mas não é açodamento um governo interino, com prazo de duração estabelecido por lei, propor alterações estruturais? Não seria mais correto esperar até o fim do processo de impeachment para, se confirmado o afastamento de Dilma, fazer isso?
CONVITE


Está saindo pela editora Arquipélago "Adeus, Controle Remoto "" Uma Crônica do Fim da TV como a Conhecemos". O livro reúne textos publicados na Folha e em meu blog no UOL, além de reflexões inéditas. O lançamento será nesta segunda (23), às 19h, na livraria Blooks, no shopping Frei Caneca. Estão todos convidados. 

A caravana do atraso, por Elio Gaspari, na FSP

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Conservador é uma coisa, direita é outra, mas os males de Pindorama nunca vieram de uma nem da outra. Vieram do atraso que sustenta um pedaço do andar de cima.
Michel Temer entrou no Planalto com a bandeira da reforma da Previdência. Ela gira em torno da elevação da idade com que os brasileiros podem se aposentar. Faz sentido que ninguém vá para a conta da Viúva antes dos 65 anos. Falta explicar como ficarão as pessoas do andar de baixo que estão há décadas no sistema do INSS. Não foram eles quem quebraram a Previdência.
Foi o atraso. Michel Temer, procurador do Estado de São Paulo, requereu sua aposentadoria em 1996, aos 55 anos. Desde então, passou a receber R$ 9.300 mensais. Naqueles dias, o cardiologista Adib Jatene, ícone da medicina brasileira comentava: "Tenho 66 anos de idade e 38 de serviço público. Não me aposentei". À época, o deputado Temer relatava a reforma da Previdência dos outros.
O deputado Ricardo Barros, ministro da Saúde de Temer, diz que o SUS deve restringir suas atividades e aplaude a proliferação de planos privados. Ele não é freguês do SUS, mas sua campanha recebeu uma doação de R$ 100 mil do presidente da operadora de saúde privada Aliança. Já o ministro do Desenvolvimento Social, doutor Osmar Terra, ponderou que é preciso "oportunizar" a saída de gente do Bolsa Família e que esse cheque não pode virar "coleira política". Tem toda razão, mas nem todo mundo é capaz de "oportunizar" um acesso à "coleira" da Odebrecht, que injetou R$ 190 mil na sua campanha eleitoral.
Como disse Temer ao justificar seu pedido de aposentadoria, tudo foi feito dentro da legalidade, pois do contrário pareceria que era um "safardana". Nem ele, nem Barros ou Terra são safardanas. São apenas parte de um enorme e histórico processo de predominância do atraso.
Os doutores nem novidade são. O patrono do ensino de economia no Brasil é José da Silva Lisboa, o visconde de Cairu (1756-1835). Ele foi o primeiro professor de "ciência econômica" e propagava as ideias do escocês Adam Smith, o da "mão invisível" do mercado. Quando foi transferido de escola, Smith ofereceu-se para devolver aos alunos o dinheiro do curso. Cairu aposentou-se aos 50 anos e nunca deu uma aula.
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A COBRA QUE RI
Se Lula tiver saúde e estiver no uso e gozo de seus direitos políticos, será candidato a presidente em 2018.
A ideia de que se esmagou a cabeça da cobra da jararaca é prematura.
Essa especulação poderá ser mais bem avaliada depois da eleição municipal. Se o PT segurar a Prefeitura de São Paulo, a jararaca voltará a sorrir.
EM AÇÃO
Na quinta-feira (19), o secretário-executivo Moreira Franco e seu colega Raul Jungmann, ministro da Defesa, almoçavam no restaurante Laguiole, no Rio.
Um curioso fez a conta: eram acompanhados por seis seguranças.
Com a linda vista do Museu de Arte Moderna, o Laguiole é um dos mais caros da cidade.
No início do consulado petista, o mesmo curioso estava no Piantella de Brasília e percebeu que havia algo de novo no país quando viu a relação de Jair Meneguelli, ex-presidente da CUT, com uma taça de vinho. Ele manuseava o copo com a coreografia de um Rothschild no Maxim's.
JOGO CHINÊS
O companheiro Xi Jinping, presidente da China, avançou sobre o seu antecessor Hu Jintao.
Numa noite de 2012, uma Ferrari 458 Spider encaçapou-se num muro, matando o motorista e uma das jovens seminuas que estavam a bordo. O garoto era filho de Ling Jinhua, principal assessor do presidente Hu. Alguns amigos do mundo do petróleo compraram silêncios e a operação abafa foi um êxito.
O companheiro Xi vem decapitando as quadrilhas de poderosos. Encarcerou um rival, meteu na cadeia o chefe dos serviços de segurança. Agora o poderoso Ling vai para a cana.
Começa-se a suspeitar de que a campanha contra a corrupção esteja acompanhada de um projeto de poder pessoal de Xi.
A MÁGICA DE CUNHA
Eduardo Cunha tem um aliado em André Moura, o novo líder do governo na Câmara, e não se pode dizer que tenha um adversário no Palácio do Planalto.
Para fechar sua grande mágica, Cunha precisa eleger o novo presidente da Câmara. Ele sabe que ninguém conseguirá o lugar sem o apoio de sua bancada particular.
DINASTIA
José Mendonça Bezerra, pai de Mendonça Filho, o ministro da Educação na caravana Temer, elegeu-se sete vezes deputado federal por Pernambuco.
O ministro é genro de Marcos Vilaça, autor de um dos melhores livros sobre o patriarcado político nacional. Chama-se "Coronel, Coronéis - Apogeu e Declínio do coronelismo no Nordeste" e foi publicado quando Vilaça tinha 26 anos.
Alguém poderia retomar o assunto. Temer tem três ministros que se identificam pela condição de "filho" (Mendonça, Sarney e Fernando Coelho).
O Barão do Rio Branco era filho do poderoso Visconde e tinha a mesmo nome do pai, mas ninguém teve a ousadia de chamá-lo de Paranhos Filho.
O PATO DE SKAF
Se Temer aumentar um imposto, coisa que parece inevitável, o doutor Paulo Skaf, presidente da Fiesp, deverá recolocar aquele grande pato amarelo diante da sede da guilda.
A volta do enfeite poderá significar uma de duas coisas, ou ambas: O pato era Skaf. O pato era quem acreditava em Skaf.
VENEZUELA
O comissariado petista diz que o impedimento de Dilma Rousseff foi um golpe. Já as malfeitorias do presidente venezuelano Nicolás Maduro seriam aperfeiçoamento da democracia direta.
Tem razão o grande Pepe Mujica: "Maduro está louco como uma cabra".
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A Bolsa Fies alimenta gatos gordos

O ministro da Educação, Mendonça Filho, tem sobre a mesa uma pasta de pleitos. Nela estão as pressões das empresas que controlam instituições privadas de ensino aninhadas no Fundo de Financiamento Estudantil, o Fies. Querem mais fregueses (leia-se recursos) e menos controles. Em 2014, a Viúva botou quase R$ 14 bilhões no programa.
Em tese, o Fies ajuda os estudantes. Na prática, por violar normas elementares do crédito, financia faculdades privadas e estimula calotes.
Quem estiver interessado na exposição desse truque, pode buscar o artigo "O Efeito da Disponibilidade de Crédito para Estudantes sobre as Mensalidades", dos professores João Manuel Pinho de Mello, do Insper, e Isabela Ferreira Duarte, da PUC-Rio.
Eles ralaram nos números de 2010 a 2013 e concluirão que o dinheiro do Fies provocou um aumento de seis pontos percentuais acima da inflação no preço das mensalidades das faculdades privadas. No período, a lucratividade do Grupo Kroton (o maior do mercado) dobrou. Metade dessa bonança viria do "efeito Fies".
O texto em inglês está na rede: "The Effect of the Availability of Student Credit on Tuitions: Testing the Bennet Hypothesis using Evidence from a Large-Scale Student Loan Program in Brazil".




É coisa para quem entende economês.