No
bangue-bangue que se seguiu ao afastamento da presidente Dilma Rousseff e à posse
do interino Michel Temer, um dos primeiros alvos atingidos foi a área de
comunicação.
A
confusão destes dias iniciais não deixa dúvida de que o novo governo tem a
intenção de mexer de forma drástica na EBC (Empresa Brasil de Comunicação),
responsável pela TV Brasil.
O
primeiro sinal foi dado pela demissão nesta terça-feira (17) do presidente da
empresa, o jornalista Ricardo Melo. Temer, que quer colocar um aliado no lugar,
causou espécie por tomar uma atitude juridicamente questionável. O estatuto da
EBC estabelece que o presidente tem mandato de quatro anos e só pode ser
demitido por vontade própria ou falha grave no exercício da função.
Melo
foi nomeado por Dilma no último dia 4, apenas sete dias antes do início da
votação no Senado que resultou na suspensão do mandato da presidente. O cargo
estava vago havia três meses, desde que o jornalista Américo Martins pediu
demissão.
À
época, especulou-se que o jornalista estaria insatisfeito com pressões
recebidas do governo para indicação de nomes e alterações na grade da TV
Brasil.
Reside
aí, justamente, um dos pontos centrais da discussão. Como critica Eugênio Bucci
em "O Estado de Narciso" (Companhia das Letras, 2015), "a
comunicação pública no Brasil virou um palanque partidário, um negócio
lucrativo, uma passarela para a vaidade particular e, sem exagero nenhum, uma
arma a serviço da guerra eleitoral".
Tese
de livre-docência apresentada à USP em 2014, o estudo reflete experiências do
autor em dois níveis –como presidente da Radiobrás (2003-2007) e como conselheiro
da Fundação Padre Anchieta, responsável pela TV Cultura, em São Paulo.
Bucci
chama a atenção para o erro, cometido em todas as instâncias de poder, de achar
legítimo o uso da comunicação pública para defender o ponto de vista de um
partido ou uma coalizão. "A comunicação pública só se justifica dentro do
Estado democrático de Direito se ela realizar o dever do Estado de
informar".
Na
sua visão, uma falha grave na estrutura da EBC é o fato de os dois cargos
principais da empresa serem uma escolha do presidente do país. Bucci também
critica o vínculo funcional da estatal com o governo por meio da área de
comunicação social, e não a de cultura. "Não há possibilidade de decisões
que contrariem as diretrizes expressas dos ministros e do presidente da República."
A
situação, observa, é semelhante na TV Cultura. "Não existe, na história da
Fundação, uma única decisão grave que tenha prevalecido contra a vontade do
governador de turno".
Concordo
que mudanças no modelo são necessárias. Mas não é açodamento um governo
interino, com prazo de duração estabelecido por lei, propor alterações
estruturais? Não seria mais correto esperar até o fim do processo de
impeachment para, se confirmado o afastamento de Dilma, fazer isso?
CONVITE
Está
saindo pela editora Arquipélago "Adeus, Controle Remoto "" Uma
Crônica do Fim da TV como a Conhecemos". O livro reúne textos publicados
na Folha e em meu blog no UOL, além de
reflexões inéditas. O lançamento será nesta segunda (23), às 19h, na livraria
Blooks, no shopping Frei Caneca. Estão todos convidados.
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