domingo, 6 de novembro de 2011


ALÉM DAS MONTANHAS DE MINÉRIO 

publicado no suplemento do Estadão em 25 de outubro de 2011
Há muito mais do que montanhas de minério de ferro no Porto de Tubarão, no Espírito Santo, à espera de embarque. O complexo de 14 quilômetros quadrados, inaugurado em 1966 e controlado pelaVale, pode exportar anualmente 100 milhões de toneladas, incluindo carvão, soja, fertilizantes e granéis líquidos. Tudo isso, de acordo com estudos da Universidade de São Paulo, com 35% a mais de eficiência, se comparado com os maiores portos do mundo.

Nada disso vem de graça. Eduardo Bartolomeo, diretor executivo de operações integradas da Vale, afirmou que só neste ano a empresa vai chegar aos US$ 5 bilhões de investimentos em infraestrutura. As obras de dragagem vão dar um calado de 22,3 metros, permitindo receber os novos e enormes graneleiros, de 400 mil TPB, além do alongamento do canal de acesso e da expansão da bacia de evolução, de 600 metros para 730 metros de diâmetro.

Até o final deste ano também serão investidos R$ 500 milhões em projetos de controle ambiental no complexo de Tubarão, relacionados à emissão de particulados. Um dos mais importantes será a barreira de vento (wind fence), que controla a velocidade do ar sobre as pilhas de minério. Assim, reduz a poeira do minério em cerca de 77%, de acordo com análises realizadas. Outra novidade tecnológica, esta inédita, vai atuar diretamente sobre os pátios de estocagem, que serão escaneados, permitindo controle on-line da movimentação do material, com redução dos riscos de colisão de máquinas e as pilhas de produtos.

A empresa espera produzir 552 milhões de toneladas em 2015 e fazer esse volume chegar a seus destinos é um desafio que está sendo vencido com investimentos e tecnologia. O minério sai da mina, é embarcado na ferrovia, chega ao navio em dez dias e, em 45 dias, pode ser desembarcado na China, do outro lado do mundo. 

 

INDÚSTRIA NAVAL RESSURGE

ESTADO DE SÃO PAULO | SUPLEMENTO (4)
O setor petrolífero alavancou e está investindo na construção de embarcações: setor já registra 56 mil empregos diretos Oressurgimento da indústria naval brasileira, depois de ocupar o segundo lugar do mundo na década de 1970 (agora é a quinta colocada), veio com a força de um tsunami, impulsionado principalmente pela avalanche de investimentos do setor petrolífero. De acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), o setor registra 56 mil empregos diretos (mais 32 mil na indústria náutica de lazer e turismo) para uma carteira de 278 encomendas, num valor perto de US$ 7 bilhões. Só a Petrobras prevê investimentos de US$ 224,7 bilhões em seu plano de negócios 2011/2015, para atender às necessidades da exploração do pré-sal. No Brasil, serão utilizados 95% desse valor. A subsidiária Transpetro, maior armadora da América Latina e principal empresa de logística, transporte e armazenagem de petróleo e derivados, álcool e gás natural do País, vai ter mais 49 navios até 2015, elevando sua frota para 101 unidades, ao custo de R$ 10 bilhões.

Segundo informações do Sinaval, estão em construção nove sondas de perfuração e sete naviossonda, havendo a possibilidade de novos contratos ainda neste ano, como os 14 navios petroleiros e para derivados licitados pela Petrobras. Também foi anunciada a construção de mais 21 navios-sonda. O Fundo da Marinha Mercante já aprovou o financiamento de 29 navios de apoio marítimo, 24 empurradores e 124 barcaças fluviais.

O presidente da Associação Brasileira das Empresas do Setor Naval e Offshore (Abenav), Augusto Mendonça, explica que, embora a maioria dos 45 estaleiros de maior porte existentes no País não divulguem seus balanços, a entidade estima que o setor fature cerca de R$ 6,3 bilhões por ano. Segundo ele, “R$ 2,5 bilhões são referentes à construção de navios, R$ 3 bilhões à construção de plataformas e seus módulos; e cerca de R$ 300 milhões de outros segmentos, como rebocadores portuários, comboios para navegação fluvial e outros”.

Mendonça destaca que um dos desafios mais importantes para o setor foi o aumento da obrigatoriedade de conteúdo local (componentes de fabricação nacional) nos fornecimentos a navios e plataformas. “A cadeia produtiva vem acompanhando bem o ritmo da construção em andamento. A participação do conteúdo local no valor total dos fornecimentos aos estaleiros varia de 63% a 72%”, explica. Mas ainda existem os desafios da qualificação e formação de recursos humanos, aumento do conteúdo local nos fornecimentos a navios e plataformas e o aumento da competitividade e a inovação da construção naval e offshore.

As perspectivas do setor são otimistas. O segmento de petróleo e gás (navios e plataformas de produção) lidera o crescimento, com uma programação de encomendas para os próximos dez anos. O presidente da Abenav afirma que esse segmento está impulsionando o mercado interno, assim como a cabotagem e a navegação fluvial. Mesmo com o fantasma de uma redução do crescimento chinês, que assombra os países ocidentais, o País terá condições de superar o problema.

Para Mendonça, a implantação de um estaleiro deve ser tratada com cuidado. “A preservação do meio ambiente é uma política pública que a Abenav defende e apoia. O estaleiro não é uma indústria poluente, sua principal material-prima é o aço, que é totalmente reciclado. Mas a implantação de um estaleiro provoca grande impacto local”, explica. Ele afirma que, como é um projeto de grande porte, geralmente empregando de mil a três mil pessoas, o estaleiro precisa ter uma logística urbana de serviços e transportes em seu entorno: “Há uma transformação relevante econômica e social nas localidades onde o estaleiro será implantado. Todos esses fatores precisam ser bem avaliados e é essencial que os órgãos ambientais, municipais, estaduais e federais examinem o projeto e escutem as populações”.

JURONG

Enquanto os estaleiros nacionais disputam o crescente número de encomendas, que incluem sondas e plataformas de exploração, outra contenda é pela implantação de estaleiros, que trazem consigo uma grande cadeia produtiva e desenvolvimento econômico nas regiões em que se instalam. É com essa pespectiva que o Estaleiro Jurong abre o setor no Espírito Santo, devendo iniciar as obras no início do ano que vem.

Estaleiro Jurong Aracruz (EJA), do grupo Semb Marine, de Cingapura, vai ocupar uma área de 82,5 hectares quadrados na Barra do Sahy, gerando seis mil empregos diretos quando estiver operando, ao custo de R$ 300 milhões por ano em salários e outros R$ 100 milhões em tributos para o Estado. Com a Licença Prévia e a Licença de Instalação concedida, a empresa agora termina de cumprir uma longa lista de condicionantes socioambientais. “O EJA está cumprindo todas as determinações dos órgãos ambientais e tem o compromisso de integrar-se às comunidades locais de forma sustentável, promovendo o desenvolvimento regional. Para isso, mantém parcerias com prefeituras e entidades como Senai, Ifes, Findes, Sine, entre outras”, explica Luciana Sandri, diretora institucional.

Há dois anos vêm sendo realizados projetos exigidos para o licenciamento, como um extenso programa ambiental de monitoramento e resgate de fauna e flora, recuperação de áreas para conservação ambiental, controle de emissão de partículas e de ruído, entre outros programas. Há também dois projetos de capacitação e aproveitamento de mão de obra local.

O complexo portuário industrial de Suape, em Pernambuco, que já tem três estaleiros, vai ganhar a quarta unidade e a primeira no Brasil da empresa italiana Navalmare, que anunciou no último dia 17 o investimento inicial de R$ 200 milhões, devendo iniciar suas operações no segundo semestre de 2013, com cerca de mil empregos diretos. A empresa atua na construção naval desde 1979 fabricando estruturas offshore.

Os projetos de novos estaleiros se espalham pelo litoral brasileiro. AEstaleiros do Brasil (EBR) assinou protocolo de intenção com o governo gaúcho para implantar um estaleiro em São José do Norte, ao lado do Porto de Rio Grande, onde serão montadas plataformas marítimas e construídas embarcações de apoio à exploração de petróleo, gerando cinco mil empregos diretos, com investimento de US$ 420 milhões e incentivos estaduais.AWilson, Sons também escolheu a região para construir um estaleiro com capacidade de produzir até quatro embarcações de apoio por ano. O investimento previsto é de US$ 140 milhões.

Depois de desistir de construir um estaleiro em Biguaçu, na Grande Florianópolis, a OSX vai se instalar na área industrial do Porto de Açu, norte do Estado do Rio de Janeiro, com o objetivo de construir plataformas de produção para a OGX, empresa petroleira do mesmo grupo. O investimento pode chegar a R$ 2 bilhões. O empreendimento tem como sócio minoritário a coreana Hyundai Heavy Industries.

Longe do balanço do mar, em Araçatuba (SP), o Estaleiro Rio Tietê será implantado para construir 20 empurradores e 80 barcaças encomendados pela Transpetro. O empreendimento, do Estaleiro Maguari, de Belém (PA), mereceu até a presença da presidente Dilma Rousseff no lançamento da pedra fundamental, em setembro último. As embarcações formarão 20 comboios com capacidade de transportar 7,6 milhões de litros de etanol cada um. Em plena operação, em 2015, o transporte hidroviário do combustível vai substituir 80 mil viagens de caminhão. O custo será de R$ 432,3 milhões, a maior parte financiada pelo Fundo de Marinha Mercante.


O Tietê prateado: Despoluindo um esgoto a céu aberto

The Economist Sáb, 22/10/11 - 15h00 publicado no portal do governo sp
A transmissão de um programa de rádio brasileiro, em 1990, chamado "O Encontro das águas", fez uma comparação entre as condições do Rio Tâmisa de Londres e o Tietê de São Paulo. O Tâmisa foi revitalizado, quando Joseph Bazalgette, um engenheiro vitoriano, começou a construir canalizações que demoveram a sujeira ao longo do rio. O Tietê foi asfixiado por resíduos de 33.000 fábricas e esgotos de 13 milhões de pessoas, mais do que quatro quintos deles sem tratamento. O rio estava biologicamente morto desde Barra Bonita, a 260 quilômetros de São Paulo.

A ação ganhou apoio. Jornais e ONGs se juntaram a campanha para limpar o rio. Uma petição atraiu 1,2 milhões de assinaturas. Finalmente, em 1992, O Projeto Tietê foi lançado.

Ao contrário de outros projetos de infraestrutura no Brasil, este continuou em andamento mesmo com a hiperinflação, crises financeiras e a alternância dos chefes de governo. Empréstimos baratos ajudaram os grandes poluidores industriais a se tornarem limpos. Novas estações de tratamento de água foram construídas e redes de esgoto instaladas.

Vinte anos depois, o Tietê continua fedido e imundo ao passar com suas águas turvas por São Paulo. Mas não por muito tempo. Hoje 55% dos esgotos da cidade são tratados; em 2018, 85% deverão ser. O governador do estado, Geraldo Alckmin, está tentando mobilizar 35 municípios da bacia do Tietê para que cooperem: até 2010, Guarulhos, uma cidade satélite de 1,2 milhões de pessoas, não tratou uma gota de seu esgoto.

A poluição de São Paulo agora chega só até Salto, a 100 quilômetros de distância. Em 2018, diz Monica Porto, uma expert em qualidade da água da Universidade de São Paulo, as melhoras serão visíveis - e sentidas através do cheiro - na própria cidade.

A limpeza do Tietê é mais do que um problema habitual. São Paulo está a apenas 75 quilômetros de distância da nascente do rio, por isso há menos água para diluir o que nele se despeja. As serras bloqueiam as potenciais rotas do esgoto até o mar. A média anual de chuva é 150 cm e as tempestades de verão podem trazer 7 cm em apenas algumas horas. Ruas e calçadas impermeáveis agravam as inundações: este ano o rio já transbordou três vezes. A cidade se multiplicou em oito vezes desde 1950, e grande parte da população vive em favelas não planejadas. Algumas delas estão nas margens do rio: companhias de água muitas vezes pedem ao governo para remover pessoas que ocupam ilegalmente a área onde eles precisam trabalhar. E mesmo quando os esgotos são construídos, algumas famílias continuam desconectadas porque não são capazes ou não estão dispostas a pagar.

Mas as áreas virgens próximas à nascente do rio estão sendo transformadas no que oficialmente é considerado o maior "parque linear" do mundo, com 75 quilômetros de extensão, cheio de ciclovias para que ciclistas fiquem de olho em assentamentos ilegais. A Sabesp, uma companhia de água, está limpando 100 afluentes do rio, construindo áreas de recreação e plantando árvores ao longo das margens.

Paulistanos adoravam o rio, diz Janes Jorge, cujo livro, "Tietê - O rio que a cidade perdeu", conta a sua história. Artistas o retratavam; nadadores e remadores disputavam provas lá; famílias passavam os feriados nas ilhas e margens do rio. Hoje seria preciso ser corajoso para atravessar as marginais e tentar fazer um piquenique, ou ainda mais se arriscar a dar um mergulho. Adequar o esgoto da cidade é apenas um começo, diz Jorge: muito do que suja o Tietê é o lixo jogado na rua, além da fumaça e do óleo dos carros. "Os problemas do rio são uma expressão dos problemas da cidade - a pobreza e a degradação ambiental." Sua despoluição serve para mostrar que tudo isso pode ser lentamente superado.