domingo, 16 de fevereiro de 2025

O Brasil exibe paradoxo de pouca corrupção trivial e alta corrupção institucional, Marcus André Melo, FSP

 16.fev.2025 às 10h00

Como mensurar a corrupção em um país? Através de pesquisa de opinião sobre a extensão da corrupção, como muitos alegaram após a divulgação do desempenho pífio do país no Relatório Anual da Transparência Internacional 2025? Elas aferem a centralidade do tema na opinião pública, tema obviamente de grande interesse, mas não a extensão da corrupção real. Aqui a distinção entre o que a literatura chama de pequena (petty) e de grande (grand) corrupção. A pequena corrupção envolve transações singulares, individualizadas, e não institucionalizadas de pequeno valor; a grande, é institucionalizada, envolvendo burocracias públicas, partidos políticos, estatais, sendo recorrente e de elevado valor.

A imagem mostra uma vista panorâmica do Congresso Nacional em Brasília, com a bandeira do Brasil em primeiro plano. O cenário inclui um grande espaço aberto e a Esplanada dos Ministérios ao fundo, sob um céu nublado.
Imagem de drone da Praça dos Três Poderes, com o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o STF - Pedro Ladeira/Folhapress

As pesquisas de vitimização são as mais relevantes sobre a extensão da corrupção. As perguntas relevantes típicas referem-se a se no último ano o/a respondente pagou propina. Há técnicas para mitigar o problema de respostas em temas sensíveis: além do anonimato, a pergunta pode ser feita com referência a tentativas de se cobrar propina em vez de pagamento efetivo.

E mesmo aqui há viés. As pessoas têm experiência direta —mas seletiva— apenas da pequena corrupção. Ela vem de sua experiência com a polícia, o serviço de saúde, fiscais, alfândegas, prefeituras. Ela não envolve experiência em participar de licitações, emendas parlamentares, investimentos de fundos de pensão etc. E mesmo esta experiência deve ser calibrada. A opinião sobre quem não usa diretamente um serviço —por exemplo, o SUS— é desconsiderada, ou as respostas ponderadas pela frequência do uso (maior frequência, maior peso).

No caso da grande corrupção —aquela que efetivamente impacta a economia e subverte a democracia ao garantir vantagens aos incumbentes—, os envolvidos são o alto escalão de empresas multinacionais e altos funcionários. Eles são os principais agentes envolvidos e suas respostas são uma das fontes mais importantes. O tamanho das amostras e pesquisas utilizadas —em geral milhares de observações e agregação de resultados de pesquisas para a maioria dos países— permite que as respostas extremas (outliers) sejam controladas. As opiniões de especialistas que monitoram a corrupção nos países são outra fonte de dados para os índices internacionais utilizados.

A pequena corrupção no país é similar à média da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e à menor da América Latina. A porcentagem de brasileiros que declararam ter pago propina (a policiais, fiscais, provedores de serviço etc.) aumentou de 2011 a 2019. Passou de 4% (12% na Argentina, 21% no Chile e 31% do México) para uma média de 11%. Quanto aos dados sobre "tentativas de obtenção de propina", as mais recentes (2021). As percentagens de pessoas que responderam positivamente à pergunta "alguma vez nos últimos 12 meses algum funcionário público lhe pediu uma propina" foram de 4.8% (Brasil), 26,2% (México), 19% (Paraguai), 13,9% (Peru) e 7,7% (Argentina).

A grande corrupção vem à tona através da exposição pública de casos como o da leniência da Odebrecht, nos EUA, que permitiu comparações sobre a distribuição das propinas entre 11 países na região e a razão entre propina/vantagem obtida. Aqui o Brasil ocupou a segunda razão mais baixa (18%), após a Argentina. Mas em valores absolutos somos o campeão absoluto.

Nenhum comentário: