A polêmica em torno da exploração de petróleo da margem equatorial é mais do que uma mera disputa entre Ibama e Petrobras. Trata-se de definir qual o posicionamento do Brasil no esforço mundial para a redução da emissão de gases de efeito estufa.
Ao se oferecer como anfitrião da COP30, o Brasil mostrou determinação não apenas em aderir ao esforço global pela mitigação mas de se colocar entre os líderes do processo. Fez bem, não apenas por uma questão moral —o legado para as futuras gerações— como também porque o aquecimento global é mais problemático para o Brasil e demais países tropicais do que para os países com invernos rigorosos.
Porém, com a eleição de Trump e as mudanças políticas na Europa, a probabilidade de sucesso da mitigação de emissões tem diminuído. Há duas explicações: 1) acúmulo de poder político pelos que não acreditam na relação entre gases de efeito estufa e clima; ou pelos que acreditam, mas não se importam com as consequências; 2) pessimismo dos que temem o que os economistas chamam de "tragédia dos comuns".
Essa tragédia tende a ocorrer quando indivíduos ou países compartilham um recurso comum —no caso, a atmosfera terrestre. Cada um tende a agir de acordo com seus próprios interesses de curto prazo, sem considerar o impacto negativo cumulativo de suas ações sobre o recurso compartilhado, a longo prazo. Como resultado, o recurso é degradado, prejudicando todos. A tragédia é evitada quando há gestão e regulamentação para garantir a sustentabilidade dos recursos compartilhados. É exatamente o que se pretende alcançar com as COPs.
O governo vinha cozinhando a polêmica sobre a margem equatorial em banho-maria, provavelmente aguardando a conclusão da COP30. Se o conclave fosse bem-sucedido, seria um sinal de que a aposta na regulamentação global teria chance de dar certo e o Brasil poderia unir o útil ao agradável. Isto é, ser um dos líderes do esforço pela mitigação e alavancar a atividade econômica —produzir bens com baixo conteúdo de carbono, por exemplo—, resgatando da pobreza parte de nossa população. Porém, se a COP30 fosse malsucedida, sairia fortalecida a visão de que os efeitos deletérios do aquecimento global são inevitáveis e que o Brasil não pode se dar ao luxo de desprezar a produção de petróleo da margem equatorial.
A eleição de David Alcolumbre para presidente do Congresso precipitou os acontecimentos. O presidente Lula chamou de lenga-lenga o licenciamento da pesquisa para comprovar, ou não, a existência de petróleo comercialmente explorável na costa do Amapá. E demonstrou convicção de que, se existir, acelerará a transição energética.
Produzir combustíveis fósseis para ajudar a transição energética é uma aparente incoerência. Porém, talvez o presidente Lula considere a tragédia dos comuns inevitável e entenda que a riqueza produzida pelo petróleo é indispensável para viabilizar a infraestrutura de adaptação aos eventos extremos.
Mitigar e adaptar não são estratégias mutuamente excludentes. Mas é preciso substituir a atual fragmentação decisória do governo por um processo em que todos os aspectos da questão —ambientais, energéticos, econômicos e diplomáticos— sejam coletiva e simultaneamente examinados.
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