Muito se fala sobre os efeitos nocivos à saúde do consumo de cigarros eletrônicos no Brasil. Em artigo recente na Folha, o médico e colunista Drauzio Varella atribuiu à indústria do tabaco a culpa por isso ("Não se deixem enganar, os fabricantes de cigarro não querem ajudar viciados", 1º/1). Mas, se a indústria legal é impedida de fabricar e vender cigarros eletrônicos no país, quem responde pelos produtos de procedência desconhecida a que os consumidores estão expostos?
É preciso lembrar que os vapes consumidos no Brasil são 100% ilegais e distribuídos pelo comércio ilícito. A indústria formal não vende cigarro eletrônico em território nacional. Portanto, qualquer pesquisa que os analise —como a citada no texto, com dados do Instituto do Coração— irá coletar os efeitos de produtos ilegais, que não seguem qualquer controle ou padrão sanitário. Reforço: o descontrole do consumo de cigarros eletrônicos no Brasil acontece por causa de uma proibição de fachada, que não cumpre o que propõe.
Cerca de 3 milhões de adultos consumidores utilizam vapes 100% contrabandeados e estão expostos a riscos incalculáveis à saúde. A pesquisa do Incor citada no artigo revela uma exposição do organismo à nicotina equivalente a 120 cigarros.
Nesse sentido, é possível perceber que a disponibilização dos produtos sem controle, fiscalização ou informação anula o principal objetivo do cigarro eletrônico, que é a redução de riscos no consumo de nicotina. Apenas com regulamentação é possível envolver a indústria formal e criar políticas públicas que englobem educação, prevenção, segurança e composição conhecida e certificada do produto. Isto para fumantes adultos que deveriam ter o direito de acesso a uma alternativa lícita de menor risco.
Países da União Europeia, Canadá, Estados Unidos, Suécia, Reino Unido e Nova Zelândia, que já regulamentaram os cigarros eletrônicos como instrumento de redução de riscos, estabelecem que o nível máximo de nicotina permitida (total por produto) é, na maioria dos casos, de 20 mg/ml. O excesso visto nos dispositivos eletrônicos no Brasil só acontece porque a proibição abre caminho para fabricantes ilegais, em vez de estabelecer regras que seriam seguidas à risca pela indústria fiscalizada e legal.
É importante destacar que o cigarro eletrônico não é um produto inócuo, mas a experiência internacional mostra que, quando devidamente regulado, é uma alternativa de menor risco para fumantes, desde que haja substituição completa. Essa redução de riscos é comprovada por instituições independentes de renome, como King’s College of London, Royal College of Physicians e Cochrane, padrão ouro em publicações de saúde, bem como são referendadas pelo FDA —Food and Drug Administration, a "Anvisa dos EUA"— e ministérios da Saúde de diversos países.
Não faltam, portanto, exemplos de como tratar o tema. Ao Brasil, restam duas opções: continuar com uma proibição que só beneficia o crime organizado e prejudica o consumidor adulto e jovens que estão tendo acesso indevido a esses produtos ou respeitar o direito de quem opta por consumir alternativas de nicotina, criando regras claras para produção e comercialização dos cigarros eletrônicos, com controle sanitário e fiscalização.
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