A Técnica e a Tecnologia não podem ser frias e estanques diante da vida humana. Há
muitos riscos no exercício dessa dissociação, e que já trouxeram desgraças imensas à
Humanidade.
Choca-me e consterna-me perceber colegas de profissão incapazes de se encantar diante
de uma música, de uma pintura, de um livro, de um poema, alguns até achando que esse
sentimento do deslumbramento diante do belo seja mais próprio a intelectuais, gays ou
malucos. Sem essa dimensão humana da Vida a quem dedicarão suas habilidades, por
que crivos de julgamento submeterão suas decisões técnicas?
Vejo a Técnica e a Tecnologia, enfim o Conhecimento Técnico-científico, como
instrumentos do processo civilizatório maior da espécie humana, assim nunca podendo
ser utilizados com objetivos alheios a essa maravilhosa dimensão. O próprio
equacionamento físico e matemático das soluções tecnológicas adotadas responderá
sempre às visões que o profissional tenha sobre o mundo e a sociedade dos Homens. E
essas soluções deverão servir, não limitada e falseadamente a interesses locais de lucro ou
qualquer outra mesquinhez, mas sempre a uma entidade impessoal e maior, a
Humanidade.
Em resumo, o que nos falta hoje é justamente o que por aí andam pregando como
desnecessário (ou adjetivações mais agressivas e estúpidas), qual seja a reimpregnação de
valores humanistas ao nosso ensino de ciências exatas. Um engenheiro, um físico, um
geólogo, um arquiteto, um agrônomo, um médico, etc., devem sair da Universidade
sabendo exatamente que sua ação profissional interferirá inexoravelmente com a vida de
seus semelhantes. Deverá saber, mesmo nos pequenos espaços profissionais que lhe
sobrem, que a ele se apresentarão opções de escolha sobre essa ou aquela abordagem
profissional que seja melhor ou pior frente aos referenciais de uma sociedade que tenha
como pilares os valores da dignidade espiritual e material de todos seus cidadãos. Ou
escolhas que se definirão pelo exercício da compaixão humana, atributo maior do
Homem civilizado.
Não é apenas sua competência na profissionalização técnica dos alunos que caracteriza
uma verdadeira Universidade, mas também sua capacidade complementar de os prover
de uma formação crítica e de uma visão humanista sobre o horizonte maior de suas
profissões.
Ou seja, caros amigos, as coisas devem se colocar justamente no caminho inverso dos
apelos pragmáticos e tecnicistas que hoje são comumente lançados sobre o mundo da
Educação. Na verdade, poderíamos dizer que hoje no Brasil o campo educacional das
ciências exatas pede socorro ao seu campo complementar das ciências humanas, é
preciso que os valores humanistas e iluministas voltem a fazer parte e dar sentido
humano, social e civilizatório às carreiras profissionais tidas como isoladamente do
mundo das exatas. A separação entre esses dois mundos somente interessa àqueles que
veem a sociedade humana a partir de seus próprios umbigos e, egoistamente, a partir de
seus interesses pessoais, sem qualquer preocupação de ordem humana e social. Se, ao
contrário, alimentamos uma visão social de integração e felicidade entre os seres
humanos, não poderemos nunca admitir a dicotomia e a independência entre o mundo
das ciências exatas e o mundo das ciências humanas.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e Ex-Diretor da Divisão de Geologia
Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do
Mar”, “Diálogos Geológicos”, “Cubatão”, “Enchentes e Deslizamentos: Causas e Soluções”, “Manual
Básico para Elaboração e Uso da Carta Geotécnica”, “Cidades e Geologia”
Consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente
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