A competição que as mídias e marcas tradicionais enfrentam não se resume só às plataformas. Ela abrange também os influenciadores. Se antes o ecossistema das mídias era dominado por canais ou marcas, hoje assistimos à consolidação da "me-media" ou "egomídia", cujo centro é o "eu". Esse é um fenômeno global que não está só na superfície. É o capítulo mais recente do processo de mudança radical das mídias, com consequências estruturais. Mais gente quer consumir conteúdo de pessoas e menos de empresas ou marcas.
No final do ano passado mais de 75% das marcas tinham um orçamento dedicado a pagar influenciadores, conforme artigo da Harvard Business Review. Além disso, o fenômeno tem desdobramentos econômicos, com influenciadores lançando seus próprios produtos e marcas. Nos EUA há influenciadores que lançaram marcas bem-sucedidas de café, moda, cosméticos, delivery e assim por diante.
As vantagens competitivas do marketing de influência são enormes. Por exemplo, baixo custo de aquisição de novos clientes e de conversão de vendas junto a seguidores fiéis. Além disso, como os influenciadores usam seu próprio conteúdo para vender, ganham em eficiência e velocidade. São também multiplataforma, espalhando sua presença por várias redes e canais diferentes.
Possuem também uma vantagem pouco discutida: não se sujeitam a praticamente nenhuma regulamentação, regra, ou normas éticas. Podem comunicar de forma agressiva (ou abusiva) e inclusive vender produtos duvidosos ou prejudiciais que não teriam trânsito em mídias tradicionais. Em outras palavras, não há um CONAR dos influenciadores.
Ou melhor, não havia. Nos EUA a Comissão Federal de Comércio refez no início de julho as diretrizes aplicáveis aos influenciadores, tornando-as mais restritivas. A Inglaterra seguiu o mesmo caminho, e criou regras mais duras desde março. Já na União Europeia praticamente todos os países estão avançando na aprovação de leis e códigos de conduta aplicáveis aos influenciadores. A França é o destaque.
Mesmo em meio a uma polarização política profunda, o país aprovou consensualmente no dia 9 de junho uma nova legislação para regular a atuação dos influenciadores (apelidados pejorativamente no país de "infuvoleurs", mistura de influenciador com ladrão em francês). A lei é abrangente e clara. Define como influenciador quem "mobiliza sua notoriedade de forma onerosa para promover bens, serviços ou mensagens políticas".
Proíbe a divulgação de várias atividades por meio de marketing de influência. Por exemplo, procedimentos estéticos, incluindo cirurgia plástica, produtos falsificados, produtos com nicotina, apostas e jogos de azar em plataformas que possam ser acessadas por crianças. Nesse caso, as plataformas precisam estar inscritas e certificadas pelo governo francês. As penas para o descumprimento são de 2 anos de prisão e multa de 300 mil euros (cerca de R$ 1,6 milhão). Além disso, os influenciadores precisam seguir o Código de Defesa do Consumidor e de Propriedade Industrial, dentre outras diretrizes estabelecidas pela própria lei.
No Brasil não há legislação específica sobre o tema. Ele também ficou ausente do texto da chamada Lei das Fake News, atualmente no Congresso. Mesmo assim, o judiciário brasileiro está em pé de guerra contra vários influenciadores. Não são poucos os casos com pedidos de suspensão de contas de influenciadores. Para evitar casuísmos, melhor seria que as regras para decisões como essas estivessem bem-estabelecidas e fossem claras, como outros países vêm fazendo.
Já era – Comunicação só no modelo de broadcast ("one-to-many")
Já é – A utopia do modelo "many-to-many"
Já vem – Comunicação no modelo "influencer-to-many"
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