Indicador do grau de civilização dos povos, a compaixão pelo sofrimento dos animais tem —ou deve encontrar— limites. Ninguém em sã consciência defenderia salvar a vida de roedores que transmitem a peste. Mas e o javali?
Se depender das autoridades paulistas, de ora em diante essa espécie terá salvo-conduto para vagar pelos campos e matas. O governador Márcio França (PSB) sancionou lei que proíbe a caça no estado “em todas as suas modalidades, sob qualquer pretexto, forma e para qualquer finalidade”.
Soubessem ler e se importar com normas legais, esses suínos teriam muito o que celebrar. Como não é o caso, humanos é que temos com que nos preocupar diante dessa legislação algo desequilibrada.
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Verdade que a lei estadual 16.784 abre exceção para os chamados animais sinantrópicos —ou seja, aqueles que, adaptados ao convívio em assentamentos humanos, podem implicar risco para a população. Ratos e pombos surgem como os exemplos mais notórios, por transmitirem doenças.
Javalis representam um caso à parte. A espécie originária da Europa, da Ásia e do norte da África foi introduzida na América do Sul para fins de pecuária e pode reproduzir-se com porcos comuns, gerando os híbridos que ficaram conhecidos como “javaporcos”.
O javali não tem predadores naturais nos ecossistemas brasileiros e proliferou, após escapar de criadouros (ou por soltura intencional, após proibição de manter rebanhos). Bandos ferais passaram a arrasar lavouras de cana e milho, entre outras; supõe-se, ainda, que possam transmitir doenças como a febre aftosa a criações domésticas.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) autorizou em 2013 a caça ao suíno selvagem, para controlar sua população. Defensores de direitos dos animais se levantaram contra o abate, alegando sofrimento intenso com os ferimentos a bala e a mutilação de cães atacados pelos seres perseguidos.
A exposição de motivos do deputado estadual Roberto Tripoli (PV), autor do projeto sancionado, deixa claro que a libertação dos javalis era o alvo principal. O texto admite o controle populacional, mas veda o emprego de meios cruéis e exclui da ação pessoas físicas e jurídicas não governamentais.
Na prática, autorizou-se em território paulista a continuada proliferação dos bichos e a destruição que ocasionam. Ninguém imagina que o governo estadual vá organizar brigadas só para capturá-los —a não ser, talvez, políticos em busca de votos piedosos.
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