Quem pede intervenção militar aceita o risco de destruir de um só golpe a democracia
O colega buscava palavra menos vulgar que “bagunça” para os efeitos da guerra comercial iniciada por Donald Trump. Abrimos o dicionário de sinônimos e de lá caíram orquídeas secas.
O pensamento imediato foi que a economia e o amor podem seguir trajetórias inversas.
Nos arranjos econômicos, vale o ditado “construir leva anos, mas destruir é num segundo”.
Os EUA encarecem a importação de baterias, motores, máquinas de radiografia e mais dezenas de produtos chineses, a China sobe o tributo sobre soja, boi, frango e peru americanos, os EUA treplicam nos minérios, plástico e papel. Os preços todos se desequilibram. Os dois gigantes crescem menos, o mundo todo empaca a reboque, e isso é só a fotografia panorâmica.
Cada vez que se altera um preço à força, toda a cadeia produtiva refaz as contas. Não é só o fornecedor imediato, mas o fornecedor do fornecedor do fornecedor. O cliente do cliente do cliente também não escapa.
Já o amor pode surgir como relâmpago e levar anos se esvaindo, desbotando como as flores presas entre os verbetes “belas-artes” e “benefícios”, até que ninguém se lembre de onde vieram, que significado tiveram e por que foram guardadas ali.
Não há pistas nem mesmo nas palavras ao redor: bélico, beliscão, bem-vindo, belzebu são alguns dos termos que aparecem, disparatados.
Também polarizada, a política eleitoral deste ano fica entre a paixão e a economia.
De um lado, eleitores arrebatados à primeira vista podem patrocinar relacionamentos decadentes, destino provável dos que não quiseram se conhecer bem antes nem investir o suficiente depois.
Do outro, manifestantes que pedem intervenção militar aceitam o risco de destruir de um só golpe democracia que vem sendo lentamente construída —lentamente, mas construída.
(Para evitar palavra vulgar como “bagunça”, naquele dia optamos por desajuste.)
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