domingo, 29 de julho de 2018

Desemprego é mais duro para cargos de chefia, FSP

Empresas voltam a contratar na base da pirâmide, mas ainda cortam vagas de diretores e gerentes

SÃO PAULO
A volta do emprego formal neste ano tem sido não apenas lenta mas desigual.
Apesar das quase 400 mil vagas com carteira assinada criadas em 2018, segundo dados brutos do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), há categorias que ainda são alvo de cortes significativos. O destaque são os cargos de chefia.
Diretores, gerentes e supervisores —a linha de frente na cadeia de comando— continuam sendo demitidos mesmo após superado o período econômico mais crítico.
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No primeiro semestre deste ano, foram fechados quase 80 mil postos de chefia, após 90 mil vagas eliminadas em igual período do ano passado.
Segundo especialistas, em um cenário de retomada muito gradual da economia, em que o faturamento das companhias ainda não se recuperou, empregadores buscam enxugar os custos se valendo de algumas estratégias.
Há empresas que optaram por ampliar as obrigações de quem já está em cargo de chefia, fazendo com que passe a coordenar a gerência de múltiplas áreas.
Outras colocaram mais empregados sob o comando de um mesmo gestor.
Ainda há aquelas que delegaram tarefas de gerência a empregados que, antes, ocupavam posições subalternas.
A reengenharia que busca cortar custo, porém, tem seus riscos. Renato Villalba, gerente sênior da Michael Page, consultoria especializada no recrutamento de gerentes e diretores, diz que muitos empregadores pagaram um preço alto pela chamada juniorização dos cargos de chefia.
“Pessoas mais jovens, muitas vezes, não têm experiência para enfrentar turbulências do momento”, diz Villalba.
Outras empresas mantiveram os empregados seniores, mas lhes deram mais responsabilidades do que talvez possam assumir, o que também é arriscado, diz o consultor.
Especialistas que acompanham o mercado de trabalho, no entanto, atribuem esses cortes não só a estratégias pontuais para lidar com  cenários de crise, mas também a uma mudança que pode ser estrutural.
Para além do fator econômico, está em curso uma tendência de diminuir os níveis hierárquicos, diz Wilma Dal Col, diretora do Right Management, que pertence à agência de empregos americana ManpowerGroup.
“Talvez as empresas estejam buscando mais profissionais com competências e habilidades naquilo que elas precisam, e menos líderes ou gestores para cuidar das pessoas, um perfil que nós tínhamos mais recorrente no passado”, diz Dal Col.
Entre 2014 e 2017, quase 3 milhões de vagas com carteira sumiram do mercado de trabalho como consequência dos efeitos da recessão sobre a saúde das companhias —e o topo da hierarquia das empresas não ficou fora dessa dinâmica.
“Essa queda de vagas para gerentes e diretores tem a ver com o contexto geral, que é o de queda do emprego formal, mas pode não ser só isso”, diz Miguel Foguel, pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Mais recentemente, o descolamento da trajetória dos cargos de chefia e do restante dos empregados pode ser um indício de que as empresas estão fazendo mudanças mais profundas na estrutura de pessoal, avalia Foguel.
O fenômeno da pejotização (o empregado que se torna pessoa jurídica), dizem especialistas, também pode estar por trás da tendência de eliminação de vagas de gerentes e diretores.
Nessa equação, ganhariam empregadores, com a redução dos custos trabalhistas atrelados a uma vaga formal, ao passo que empregados conseguiriam manter ganhos maiores em tempos difíceis e recolher menos impostos do que um celetista, mas teriam reduzidas suas garantias trabalhistas.
Outro aspecto que pesa no movimento de fechamento de ocupações de gestão, diz Foguel, é que as empresas podem estar em busca de novas ideias, em um cenário no qual as pessoas com cargos mais altos não conseguem encontrá-las em uma situação difícil.
Em busca de melhores resultados, as companhias estão dispensando altos executivos que tiveram perda de desempenho nos últimos anos e indo atrás de outros que tragam mais produtividade, diz Rodrigo Forte, sócio-diretor da Exec, consultoria que realiza contratações apenas para os postos no topo da pirâmide.
Esses salários são superiores a R$ 30 mil por mês. Nesse nível hierárquico, que inclui vice-presidentes, presidentes e conselheiros, diz Forte, a demanda por recrutamento começa a reagir.
O grupo que concentra chefias ceifadas não inclui, porém, apenas os mais qualificados e bem pagos, mas aqueles com mais responsabilidades —em particular, os profissionais de áreas que devem prever riscos e evitar perdas.
Segundo os dados do Caged, a média dos salários dos diversos cargos de direção fechados ao longo do ano foi de R$ 4.500 a R$ 21.800, dependendo da ocupação.
O maior salário pertencia a diretores de pesquisa e desenvolvimento, cargo que sofreu 42 cortes no primeiro semestre de 2018.
Entre as maiores perdas, os gerentes administrativos, financeiros e de risco se destacaram. A categoria incorporou 30 mil novas vagas nos seis primeiros meses do ano, mas fechou quase 42 mil postos.
Já os gerentes de operação comercial somam 24 mil novas vagas, mas perderam mais de 34 mil.
Cresce pessimismo com recuperação do mercado de trabalho
Consultorias e agências de emprego começam a registrar certa reação do mercado para cargos de chefia, mas em um ritmo ainda bastante tímido, que desautoriza expectativas mais otimistas para o mercado de trabalho como um todo.
Fabrício Kuriki, gerente da Catho, observa admissões para cargos estratégicos no setor de serviços.
“No nível gerencial, o número de admissões entre o primeiro semestre de 2017 e o de 2018 cresceu 13% enquanto os outros setores ficaram em torno de 2%”, diz.
De modo geral, no entanto, as perspectivas para o mercado de trabalho pioraram, influenciadas pelo desempenho decepcionante em junho do Caged (que mede o mercado formal), além dos 13 milhões de desempregados formais e informais apontados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
No mercado de trabalho formal, a economia brasileira perdeu 661 postos em junho.
Na média, no entanto, junho costuma registrar a criação de 93,8 mil vagas desde o início da série, iniciada em 1992, segundo o Banco Fibra.
Em relatório, o Itaú Unibanco apontou que, no mês passado, a desagregação por setor mostrou ganhos de vagas em serviços, enquanto os demais segmentos registraram quedas, com destaque para os setores de manufatura e varejo.
Mais à frente, afirma a equipe, o mercado de trabalho pode continuar sendo negativamente influenciado por condições financeiras mais restritivas e algum impacto da paralisação dos caminhoneiros.
Para a MCM Consultores, após adquirir certa velocidade no ritmo de contratação no último trimestre de 2017, a geração de vagas formais de emprego já vinha em desaceleração desde o mês de fevereiro, em linha com outros indicadores da atividade econômica.
A retomada da geração de vagas no segundo semestre, diz a MCM, dependerá da recuperação dos níveis de confiança dos agentes e da redução do quadro de incerteza, principalmente no que se refere ao cenário eleitoral.
Miguel Foguel, do Ipea, afirma que o cenário de desaceleração no mercado de trabalho não muda muito até que um novo presidente seja eleito.
Diante da piora do cenário em junho, a LCA Consultores revisou pela metade a expectativa de criação de vagas formais em 2018, de 500 mil para 250 mil —uma gota no oceano de quase 3 milhões de postos com carteira perdidos durante a crise.
Paulo Muzzolon , Flavia Lima e Joana Cunha

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