A nova política nuclear parece ser uma volta à razão numa área que há muito anda à deriva. Em artigo nesta Folha (22/7), o general Sergio Etchegoyen reconhece que o que se propõe é "romper o imobilismo que por décadas entravou o nosso programa nucelar". Esse imobilismo tem causas bem definidas, e é útil rememorá-las para evitar repeti-las.
Energia nuclear pode gerar eletricidade, produtos radioativos para fins médicos e industriais ou armas. Desde que as atividades nucleares se iniciaram no Brasil, há quase 70 anos, seus objetivos foram mal definidos e contaminados por uma retórica nacionalista retrógrada, como se o domínio da energia nuclear fosse só uma questão de soberania nacional e monopólio do governo.
Um nacionalismo esclarecido teria adotado desde o início um caminho racional para desenvolver o uso pacífico de energia nuclear, dominando gradativamente a tecnologia, construindo reatores com nossos cientistas, engenheiros e a indústria nacional, que se capacitaria no processo.
A Argentina seguiu esse caminho e produz excelentes reatores nucleares de pequeno porte exportados para vários países.
O Brasil não fez isso. Em 1967, importou Angra 1 para produzir eletricidade com as "chaves nas mãos", cujo combustível (urânio enriquecido) tinha que ser importado. Para evitar proliferação de armas nucleares, essa importação implicava aceitar restrições ao seu uso. Mais ainda, em 1975, o governo militar embarcou num enorme programa para instalar oito grandes reatores nucleares no país até 1990.
O pacote original negociado com a Alemanha incluía enriquecimento de urânio e até reprocessamento de plutônio produzido nos reatores. Era evidente que isso abria o caminho para a produção de armas nucleares, como o próprio general Geisel reconheceu em 1974.
Pior ainda, a ênfase dada à produção de eletricidade com reatores nucleares colidia com a estratégia de instalar usinas hidroelétricas, entre as quais, Itaipu. Quem resolveu o problema da soberania na área nuclear foram cientistas da USP que trabalhavam no Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares) e no IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), com o apoio da Marinha brasileira.
À medida que o grandioso programa nuclear do governo Geisel se mostrou inviável devido a seu gigantismo, cientistas como Fausto Lima, Alcídio Abrão e Ivo Jordão purificaram minério de urânio e o colocavam em condições de ser enriquecido em centrífugas construídas com base em modelos que o almirante Álvaro Alberto havia obtido da Alemanha 40 anos antes.
O passo seguinte é a construção de um reator para a produção de radioisótopos para garantir autonomia nesse setor, em que às vezes a importação é problemática por motivos técnicos, como a perda de radioatividade que ocorre no percurso.
As necessidades de urânio enriquecido do país são pequenas, e as instalações atuais em Resende (RJ) garantem nossas necessidades.
A capacitação técnica e industrial obtida será a base concreta sobre a qual se poderão basear outros avanços.
Como Etchegoyen deixa claro em seu artigo, a proposta apresentada à Presidência "não avança em questões como a eventual construção de novas usinas nucleares (para a produção de eletricidade), tema que deverá ser discutido nas instâncias apropriadas".
O documento não diz quais são essas instâncias, mas é evidente que elas deverão considerar os aspectos econômicos do problema e comparar com outras opções para produção de eletricidade.
A volta à razão significa abandonar os equivocados sonhos de grandeza na área nuclear e até de construir armas nucleares, como se projetou no governo Lula.
Energia nuclear pode gerar eletricidade, produtos radioativos para fins médicos e industriais ou armas. Desde que as atividades nucleares se iniciaram no Brasil, há quase 70 anos, seus objetivos foram mal definidos e contaminados por uma retórica nacionalista retrógrada, como se o domínio da energia nuclear fosse só uma questão de soberania nacional e monopólio do governo.
Um nacionalismo esclarecido teria adotado desde o início um caminho racional para desenvolver o uso pacífico de energia nuclear, dominando gradativamente a tecnologia, construindo reatores com nossos cientistas, engenheiros e a indústria nacional, que se capacitaria no processo.
A Argentina seguiu esse caminho e produz excelentes reatores nucleares de pequeno porte exportados para vários países.
O Brasil não fez isso. Em 1967, importou Angra 1 para produzir eletricidade com as "chaves nas mãos", cujo combustível (urânio enriquecido) tinha que ser importado. Para evitar proliferação de armas nucleares, essa importação implicava aceitar restrições ao seu uso. Mais ainda, em 1975, o governo militar embarcou num enorme programa para instalar oito grandes reatores nucleares no país até 1990.
O pacote original negociado com a Alemanha incluía enriquecimento de urânio e até reprocessamento de plutônio produzido nos reatores. Era evidente que isso abria o caminho para a produção de armas nucleares, como o próprio general Geisel reconheceu em 1974.
Pior ainda, a ênfase dada à produção de eletricidade com reatores nucleares colidia com a estratégia de instalar usinas hidroelétricas, entre as quais, Itaipu. Quem resolveu o problema da soberania na área nuclear foram cientistas da USP que trabalhavam no Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares) e no IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), com o apoio da Marinha brasileira.
À medida que o grandioso programa nuclear do governo Geisel se mostrou inviável devido a seu gigantismo, cientistas como Fausto Lima, Alcídio Abrão e Ivo Jordão purificaram minério de urânio e o colocavam em condições de ser enriquecido em centrífugas construídas com base em modelos que o almirante Álvaro Alberto havia obtido da Alemanha 40 anos antes.
O passo seguinte é a construção de um reator para a produção de radioisótopos para garantir autonomia nesse setor, em que às vezes a importação é problemática por motivos técnicos, como a perda de radioatividade que ocorre no percurso.
As necessidades de urânio enriquecido do país são pequenas, e as instalações atuais em Resende (RJ) garantem nossas necessidades.
A capacitação técnica e industrial obtida será a base concreta sobre a qual se poderão basear outros avanços.
Como Etchegoyen deixa claro em seu artigo, a proposta apresentada à Presidência "não avança em questões como a eventual construção de novas usinas nucleares (para a produção de eletricidade), tema que deverá ser discutido nas instâncias apropriadas".
O documento não diz quais são essas instâncias, mas é evidente que elas deverão considerar os aspectos econômicos do problema e comparar com outras opções para produção de eletricidade.
A volta à razão significa abandonar os equivocados sonhos de grandeza na área nuclear e até de construir armas nucleares, como se projetou no governo Lula.
José Goldemberg
Ex-reitor da USP (1986-1990), ex-secretário de Ciência e Tecnologia da Presidência da República (1990-1991, governo Collor) e ex-ministro da Educação (1991-1992, governo Collor)
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