segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Tarcísio enfrenta dilema e pode ser visto como capacho do bolsonarismo, Lara Mesquita- FSP

 O governador de São Paulo dedicou a última semana a se apresentar como defensor e articulador da anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

Tarcísio de Freitas (Republicanos) não conseguiu o endosso do ex-presidente antes de sua prisão domiciliar e não possui registros em áudio e vídeo que possa utilizar na campanha de 2026. Mais do que isso, sabe que Bolsonaro e sua família não são conhecidos pela fidelidade aos aliados políticos.

Ainda assim, o carioca que governa São Paulo acredita que precisa provar ao ex-presidente, sua família e, sobretudo, aos eleitores mais fiéis dessa turma sua lealdade. Essa aposta pode ser um erro.

A imagem mostra duas pessoas em um palanque durante um evento público. Uma delas, à esquerda, está segurando um microfone e levantando a mão do outro, que está à direita, vestindo uma jaqueta azul e segurando um papel. Ao fundo, há prédios altos e uma multidão visível na parte inferior da imagem. A iluminação é natural, sugerindo que é um dia ensolarado.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), durante protesto em apoio a Bolsonaro na Paulista em junho. - Zanone Fraissat-29.jun.2025/Folhapress

Em fins de agosto, foi apresentada na Escola de Economia de São Paulo da FGV a primeira pesquisa do Connectlab, novo centro de pesquisa aplicada, coordenado por Felipe Nunes, dedicado a estudar temas como a polarização afetiva.

A pesquisa mostra que o contingente de eleitores que se declaram lulistas e bolsonaristas é menor do que o percebido.

Segundo a pesquisa, os independentes, grupo mais importante para o desfecho da eleição de 2026, e que assim como em 2022 será quem definirá o resultado, são 31% dos brasileiros, mas são percebidos como um grupo menor, apenas 15%. Entre eleitores bolsonaristas são percebidos como apenas 11%.

Talvez seja essa percepção deturpada que oriente Tarcísio a se empenhar tanto em construir uma imagem de defensor de Jair Bolsonaro e sua anistia. O governador deveria ser mais cauteloso.

Pesquisa da Quaest de agosto sobre a avaliação do Governo de São Paulo aponta que 59% dos paulistas gostariam de um governador independente, não aliado a Lula ou Bolsonaro. Não há razão para acreditar que esse grupo queira um próximo presidente defensor ferrenho do bolsonarismo.

Corroboram essa percepção pesquisas recentes da Quaest e do Datafolha, que apontam que a maioria dos brasileiros é contrária à concessão de anistia aos envolvidos no atentado do 8 de Janeiro.

Não há, até o momento, figura da direita que faça frente ao governador paulista na corrida presidencial de 2026.

Na família Bolsonaro, os únicos nomes viáveis parecem ser Michelle e Flávio Bolsonaro.

O primogênito, o mais pragmático, não renunciaria a uma reeleição garantida ao Senado. Além disso, a exposição excessiva de uma candidatura presidencial pode reacender denúncias que Flávio prefere esquecer.

Para Michelle, o cálculo é semelhante: envolve desistir de concorrer ao Senado pelo Distrito Federal, competição menos concorrida, e enfrentar o machismo e a desconfiança mútua que reinam na família. O próprio ex-presidente, em julho, afirmou que o Senado seria o destino de sua esposa.

Fora da família, Tarcísio é o nome mais conhecido nacionalmente e conta com a simpatia de empresários e de parcela significativa da imprensa, que, apesar das atrocidades cometidas cotidianamente pela Polícia Militar de São Paulo com respaldo do governador, continuam reputando-o como nome moderado.

O risco de se engajar excessivamente na defesa da anistia e nas críticas ao Supremo Tribunal Federal é manchar sua imagem de moderado e afastar financiadores, imprensa e eleitores independentes. Estes, ainda que não aprovem o governo Lula 3, não desejam votar em um capacho do bolsonarismo e podem repetir a escolha de 2022.

sábado, 6 de setembro de 2025

Caras durões e bandos de irmãos Deirdre Nansen McCloskey FSP ( definitivo)

 Deirdre Nansen McCloskey

Nos Estados Unidos, circulam notícias sobre a participação de Jair Bolsonaro, sua família e aliados na imitação brasileira, em 8 de janeiro de 2023, da rebelião traiçoeira contra o Congresso norte-americano no ano anterior. Ana Lankes, chefe do escritório brasileiro da revista "The Economist", escreveu um longo artigo na edição atual da revista "Atlantic", de ampla circulação, intitulado "A história não contada da estranha e selvagem tentativa de golpe de Bolsonaro: como o ex-presidente do Brasil e seus comparsas tentaram derrubar a democracia". Lankes pesquisou durante muitos meses, fez diversas entrevistas com os principais nomes, como o juiz Alexandre de Moraes, e muitos de seus inimigos. O americano médio, mesmo bem informado, não sabia nada sobre o assunto. Agora, muitos sabem.

Embora ela nunca diga isso, acho que Lankes fez o trabalho e escreveu o artigo, e seus editores o publicaram devido aos paralelos com o papel de Donald Trump em 6 de janeiro. Mas o que eu quero que você pense hoje não são as possíveis traições de Bolsonaro e Trump, que para algumas mentes ainda precisam ser comprovadas. Quero que você me diga por que as pessoas fazem o que esses dois são acusados e, em particular, por que seus subordinados os seguem com tanto empenho. Um exemplo é o emaranhado de supostas conspirações que Lankes relata. Foi preciso que muitas pessoas violassem seus juramentos de posse e a lei brasileira para apenas começarem a fazer o que são acusadas de fazer. Você faria isso?

Precisamos de caras durões, poucos. Polícia. Exército —aliás, o Brasil realmente precisa de um? Mas por que eles violam a lei com tanta frequência, como os "kids pretos"? Eu me pergunto sobre isso há muito tempo. De onde vem o policial de Hong Kong que espanca manifestantes e depois vai para casa, vizinha à dos pais do estudante que espancou? Por que policiais comuns de Hamburgo, reunidos no Batalhão 101, assassinaram judeus aos milhares durante o Holocausto?

Parte da resposta parece ser o que eles chamam no jargão militar de "coesão da unidade". Um exército precisa ter "bandos de irmãos" que se amem e se respeitem. Aquiles voltou à batalha na Guerra de Troia quando Heitor matou seu amante, Pátroclo. Uma grande parte do treinamento militar consiste em criar coesão de unidade, desde o pequeno "esquadrão" nos Estados Unidos, que arma uma dúzia de pessoas, até grupos maiores. No futebol, isso se chama espírito de equipe. Em direito ou medicina, chama-se orgulho profissional.

A primeira polícia secreta soviética, com caras muito durões, era chamada de Cheka. O nome muda constantemente, mas é o mesmo grupo. Até hoje eles se autodenominam "chekistas", como Vladimir Putin, treinados na antiga KGB, e têm essa coesão de unidade. Esses grupos, em todas as sociedades, costumam ser altamente éticos em seus próprios termos, incapazes, por exemplo, de aceitar suborno.

Aconteceu no Brasil. A Cheka de Bolsonaro fazia qualquer coisa para vencer e se admirava de seus atos, por mais insanos que fossem. A coragem dominava todas as outras virtudes, como acontece em um bando de irmãos. "Um coronel aposentado", relata Lankes, "mandou um recado desesperado para Cid: ‘O povo está onde [Bolsonaro] pediu que estivesse... Eu sei que vocês tentaram levar isso até o fim sem um colapso institucional, mas o outro lado jogou fora da lei. Chega, irmão!’"