quinta-feira, 17 de abril de 2025

Hélio Schwartsman - Julgando a Justiça, FSP


A culpa é da Constituição. A contradição em potência dorme lá, no artigo 4º, que enumera os princípios pelos quais o Brasil se rege em suas relações internacionais. Os incisos III e IV mencionam a autodeterminação dos povos e a não intervenção, mas o X estampa a concessão de asilo político.

Inconsistências emergem porque a decisão de dar asilo envolve sempre um juízo qualitativo sobre as instituições do outro país, o que pode ser entendido como uma violação à sua soberania e uma interferência em seu sistema político-judicial.

Um homem e uma mulher estão em uma conferência de imprensa. O homem, à esquerda, está gesticulando e parece estar falando de forma enfática. Ele usa um paletó escuro e uma camisa branca. A mulher, à direita, está olhando para ele e usa uma blusa branca com um padrão. O fundo é de madeira e há uma parede de pedra ao lado.
O ex-presidente do Peru Ollanta Humala fala ao lado de sua esposa, Nadine Heredia, após ser libertado de uma prisão preventiva, em 2018 - Luka Gonzales - 30.abr.18/AFP

Nos últimos dias, assistimos a dois exemplos dessa tensão. O governo Lula concedeu asilo a Nadine Heredia, ex-primeira-dama do Peru, horas depois de ela ser condenada a 15 anos de prisão. Heredia é mulher do ex-presidente Ollanta Humala, um aliado de Lula que também foi condenado aos mesmos 15 anos por corrupção e já está preso. É um caso ligado à Odebrecht.

Ao conceder o asilo, o recado que o governo Lula, justa ou injustamente, dá a Lima é que não considera seu Judiciário digno de crédito, de modo que permitirá que a ré se furte à aplicação da lei.

Como que a dar materialidade ao dito popular segundo o qual pau que bate em Chico também bate em Francisco, o Judiciário espanhol negou a extradição do blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio. A extradição fora pedida por Alexandre de Moraes, do STF. Eustáquio é investigado por crimes contra a democracia.

A imagem mostra um grupo de pessoas em uma manifestação. Um homem, que está falando ao microfone, usa um boné e uma camiseta escura. Ele levanta a mão em um gesto de fala. Ao fundo, há várias pessoas, incluindo homens com trajes tradicionais indígenas e outros com roupas casuais. Um banner verde é visível, com a frase "monrem a es" parcialmente legível.
O influenciador Oswaldo Eustáquio, durante manifestação em Brasília em 2022 - Adriano Machado - 10.dez.22 /Reuters

Justa ou injustamente, a Justiça espanhola julgou a brasileira e viu problemas. Para os espanhóis, o caso de Eustáquio tem forte dimensão política e o investigado poderia ter sua situação prejudicada devido a suas opiniões, razão pela qual negaram a extradição.

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Não vejo muito como fugir a esse esquema. Na hora de conceder asilo ou mesmo interpretar notícias, é inevitável fazer juízos sobre os sistemas de Justiça. E não dá para pôr em pé de igualdade o Judiciário na Noruega e o de Putin. Mas nosso STF deve ter ficado surpreso ao constatar que não é visto lá fora como gostaria. 

Baterias resolvem vários problemas, mas mercado quer demanda pública para aumentar produção, FSP

SÃO PAULO

Cortes provocados pelo excesso de energiaaumento na contratação de térmicas caríssimas e negativa das distribuidoras em conectar painéis solares à rede. Alguns dos principais problemas do setor elétrico no Brasil poderiam ser solucionados se o país tivesse um mercado maior de sistemas de armazenamento de energia, também conhecidos como BESS.

Esses equipamentos reúnem, dentro de um contêiner, dezenas de baterias, além de conversores e sistemas eletrônicos capazes de armazenar e liberar energia na rede em vários momentos do dia –principalmente naqueles em que a eletricidade é mais cara.

A imagem mostra uma instalação de energia renovável com um aerogerador ao fundo e várias unidades de armazenamento de energia em primeiro plano. O local está situado em uma área rural, com campos verdes ao redor e um céu azul com algumas nuvens. Há também um veículo próximo à instalação.
Sistema de armazenamento de energia em Barásoain, na Espanha - Vincent West/Reuters

Não à toa, esses equipamentos são hoje os queridinhos do mercado internacional de energia, que vem aumentando a geração de eletricidade de fontes intermitentes em suas redes, como solar e eólica. EUA, Europa e China já têm as maiores capacidades instaladas de BESS e querem expandir para dezenas de vezes mais.

Mas no Brasil esse setor ainda caminha a passos lentos, apesar de interesses já declarados. O governo federal, por exemplo, promete desde o ano passado incluir esses sistemas em leilões públicos, mas a data exata de quando isso acontecerá e quanto de energia será contratado nunca foram divulgados. Já o setor privado, como os grandes geradores de energia, dizem esperar regulações sobre o tema, além de corte de impostos.

Enquanto isso, as fabricantes nacionais de baterias esperam ansiosamente pelo momento em que a demanda crescerá a ponto de agitar o mercado no país.

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Weg, Moura e UCB Power disseram recentemente estarem prontas para receber as demandas do setor pelos próximos anos. A primeira, aliás, anunciou no ano passado investimentos de R$ 1,8 bilhões para a produção de baterias em larga escala, e a segunda divulgou uma parceria com a gigante americana Powin para acelerar a produção desses sistemas.

Mas, enquanto a demanda por BESS não vier de fato, essas empresas vão precisar se contentar com a produção de transformadores, conversores e baterias de veículos e telecomunicações, o atual carro-chefe delas.

A Weg, por exemplo, tem capacidade de produzir até 1 GWh (gigawatt-hora) por ano de baterias, mas só 60% disso é usado hoje em dia, sendo que 20% da produção vem de BESS. "A gente pode dobrar os 1 GWh em um ano, se essa for a necessidade do mercado, mas tem que ter demanda", afirma Carlos Bastos Grillo, diretor superintendente de Digital e Sistemas da empresa.

Já a Moura tem capacidade de produzir 2 GWh por ano de baterias para BESS, mas se limita a 350 MWh. Ainda assim, a expectativa de aumento da demanda pode fazer com que a empresa aumente sua capacidade para 5 GWh.

A UCB, por sua vez, fabricou no ano passado 500 MWh de todo tipo de bateria, sendo que 10% vieram de BESS. "O nosso desafio agora é continuar nessa agenda de crescimento, pensando exatamente onde que a gente vai conseguir sair de soluções de KWh para MWh", afirma Marcelo Rodrigues, vice-presidente de novos negócios e soluções na empresa.

Mas para isso acontecer é necessário demanda, e a primeira demanda em escala no Brasil, segundo quem acompanha o mercado, precisará vir do setor público, justamente a partir do leilão prometido pelo governo Lula. Isso porque, apesar de terem interesse nas baterias, os grandes consumidores e geradores de energia ainda se sentem inseguros sobre o tema no país.

 

Projeto propõe descontos para uso de energias renováveis em propriedades rurais, FSP

 O deputado federal Danilo Forte (União-CE) protocolou um projeto de lei para permitir que os descontos nas contas de luz para quem usar energia elétrica em atividades de irrigação e aquicultura também sejam aplicados durante o dia, e não somente à noite.

A imagem mostra um campo aberto com várias vacas e bezerros pastando. Um homem está em pé, interagindo com os animais. Ao fundo, há uma área de pastagem verde e um corpo d'água visível. O céu está claro e há algumas nuvens.
Em Janaúba (MG), sede do maior parque de geração de energia solar da América do Sul, a pecuária cede espaço a placas fotovoltaicas - Eduardo Anizelli/Folhapress

O texto muda artigo de uma lei de 2002 que prevê descontos na conta de luz por consumo nas atividades de irrigação e aquicultura desenvolvida em um período diário contínuo de 8h30, mas que cita o horário entre 21h30 e 6h do dia seguinte. A proposta de Danilo Forte retira a menção ao intervalo.

O deputado argumenta que a regulamentação dos descontos impede o desenvolvimento das energias renováveis no campo.

"Os descontos tarifários concedidos a produtores rurais estão limitados ao período noturno, em uma lógica que remonta à necessidade de aliviar o sistema elétrico nos horários de pico", diz. "A proposta representa um avanço estratégico ao conectar a política de subsídios tarifários com o crescimento das energias renováveis no campo."

Na justificativa, ele afirma que, embora o modelo tenha cumprido sua função quando foi criado, ele se mostra atualmente insuficiente para atender às demandas do campo, "especialmente nas regiões em que as condições climáticas e agronômicas impõem a necessidade de irrigação durante o dia."

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A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) ficaria autorizada a permitir que os descontos especiais nas tarifas para consumidores rurais sejam aproveitados ao longo do dia. "Trata-se de uma proposta que se alinha às metas de transição energética do país, moderniza o setor agropecuário e reforça o papel do parlamento na construção de soluções concretas para o Brasil rural."