sábado, 4 de novembro de 2023

Globo descobre a duras penas que nem todo remake de novela ou trama rural dá certo- Tony Goes, FSP

Todas as faixas horárias da emissora vêm desapontando na audiência

Cena do remake de 'Elas por Elas', que ocupa a faixa das 18h na Globo - Leo Rosario/Globo
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Dois anos atrás, Ricardo Waddington, então diretor dos Estúdios Globo, me contou numa entrevista sobre um plano ambicioso. Ele pensava em pedir à cúpula da empresa uma espécie de moratória de dois anos, sem cobranças pela audiência, para testar novos formatos e novos autores da teledramaturgia.

Waddington saiu da Globo em meados de 2022, e seu projeto não foi adiante. Na verdade, a emissora ficou ainda mais conservadora do que já era. Com números decrescentes no Ibope em todos os seus horários de novela, a Globo tem apelado para remakes de títulos antigos e tramas rurais, que costumavam ser garantia de sucesso.

Pelo jeito, não mais. "Terra e Paixão", atual ocupante da faixa das 21 horas, até que não vai mal de audiência. Novos personagens e novos colaboradores deram uma boa sacudida no folhetim de Walcyr Carrasco. Mas a novela repercute pouco. A única subtrama que parece engajar o público é o quase romance entre Ramiro (Amaury Lorenzo) e Kelvin (Diego Martins), que anda em banho-maria ultimamente.

Às 18 horas, a nova versão de "Elas por Elas", escrita por Cassiano Gabus Mendes em 1982, modernizou o original, mas nem tanto. A inovação mais flagrante foi transformar a personagem Carmem, que havia sido interpretada por Maria Helena Dias, em Renée, uma mulher trans, vivida por Maria Clara Spinelli.

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Mas muito do que foi mantido tem um leve cheiro de mofo. Por que Taís (Késia) não conta logo para Lara (Deborah Secco) que era ela a "patinha", a amante do finado Átila (Sergio Guizé)? Afinal, ela não sabia que o sujeito era casado. Mas claro que, se ela confessar, estragará o arco dramático de seu irmão, o incompetente detetive Mário Fofoca (Lázaro Ramos).

A aliança entre Cris (Valentina Herszage) e Tony (Richard Abelha), que se fingem de namorados para separar o casal Ísis (Rayssa Bratillieri) e Giovanni (Filipe Bragança) podia fazer sentido na década de 1980, mas soa forçada para os dias de hoje. O resultado é que "Elas por Elas" vem alcançando apenas 16 pontos na Grande São Paulo, um recorde negativo no horário.

A crise também se instaurou em "Fuzuê", das 19 horas, que vem perdendo audiência desde que estreou e já é o título de menor audiência do horário desde "Geração Brasil", que foi muito prejudicada pela Copa do Mundo de 2014.

A Globo convocou o experiente Ricardo Linhares para supervisionar o texto de Gustavo Reiz, mas as mudanças ainda não foram ao ar.

Todos esses esforços equivalem a trocar um pneu com o carro em movimento. No meu entender, as novelas precisam passar por uma profunda reformulação e arriscar bem mais se quiserem sobreviver.

Por que quase toda protagonista é uma mocinha batalhadora, de classe baixa, geralmente mãe solo? Por que esse é o perfil básico da espectadora de novelas? Mas suas histórias costumam ser mais do que previsíveis: são repetitivas.

E por que até hoje a descoberta de que os pais de um personagem não são quem ele imaginava continua sendo um dos pilares da nossa teledramaturgia? Esse recurso vem sendo usado desde os tempos do rádio, e já deu o que tinha que dar.

Desde que começou a pandemia, a Globo emplacou apenas duas novelas de sucesso indiscutível: "Pantanal" e "Vai na Fé". A primeira resgatou o novelão de tons épicos. A segunda conseguiu atingir um público jovem que andava afastado do gênero. Mas, e agora, o que vem pela frente? O remake de "Renascer", que estreia em janeiro, dará conta de sua pesada missão?

E de onde virá a renovação? Dos títulos mais ousados que são lançados primeiro no Globoplay? Da HBO Max, que grava simultaneamente as novelas "Beleza Fatal" e "Dona Beja", com menos capítulos do que as tramas da TV aberta? Ou a saída é embarcar no melodrama descabelado das novelas turcas, atual sensação do mercado internacional?

Enquanto isto, a TV Azteca, segunda maior rede aberta do México, anunciou que interromperá a produção de novelas. Sinal dos tempos? 

Redes sociais viciam? Veja o que a ciência diz, NYT FSP

 

Matt Richtel
THE NEW YORK TIMES

Um grupo de 41 estados e o distrito de Columbia (EUA) entrou com um processo no último dia 24 contra a Meta, empresa responsável por FacebookInstagramWhatsApp e Messenger. Eles afirmam que a empresa usou intencionalmente recursos para fazer com que as crianças usem compulsivamente suas plataformas, mesmo alegando que suas redes sociais eram seguras para os jovens.

"A Meta utilizou tecnologias poderosas e sem precedentes para atrair, envolver e, por fim, enredar jovens e adolescentes", afirmaram os estados em seu processo movido em tribunal federal. "Seu objetivo é o lucro."

As acusações no processo levantam uma questão mais profunda sobre o comportamento: os jovens estão se tornando viciados em redes sociais e na internet? Aqui está o que pesquisadores descobriram.

celular logado em rede social
Especialistas afirmam que a atração magnética das redes sociais vem da forma como o conteúdo atua em nossos impulsos e conexões neurais - Tony Cenicola/The New York Times

O QUE TORNA AS REDES SOCIAIS TÃO ATRAENTES?

Especialistas que estudam o uso da internet afirmam que a atração magnética das redes sociais vem da maneira como o conteúdo ativa nossos impulsos e conexões neurais, de modo que os consumidores acham difícil se afastar do fluxo constante de informações.

David Greenfield, psicólogo e fundador do Centro de Dependência em Internet e Tecnologia em West Hartford, Connecticut, diz que os dispositivos atraem os usuários com táticas poderosas. Uma delas é a "reforço intermitente", que cria a ideia de que o usuário pode receber uma recompensa a qualquer momento. Mas quando a recompensa chega é imprevisível. "Assim como uma máquina caça-níqueis", diz ele. Assim como em uma máquina caça-níqueis, os usuários são atraídos por luzes e sons, mas, ainda mais poderoso, informações e recompensas adaptadas aos interesses e gostos do usuário.

Os adultos são suscetíveis, observa ele, mas os jovens estão particularmente em risco, porque as regiões do cérebro envolvidas na resistência à tentação e na recompensa não estão tão desenvolvidas em crianças e adolescentes como em adultos. "Eles são totalmente impulsivos e têm pouco controle sobre esse impulso", diz Greenfield sobre os jovens consumidores.

Além disso, ele afirma que o cérebro adolescente está especialmente sintonizado com as conexões sociais, e "as redes sociais são uma oportunidade perfeita para se conectar com outras pessoas".

A Meta respondeu ao processo afirmando que tomou várias medidas para apoiar famílias e adolescentes. "Estamos desapontados que, em vez de trabalhar de forma produtiva com empresas de toda a indústria para criar padrões claros e adequados à idade para os muitos aplicativos que os adolescentes usam, os procuradores gerais escolheram esse caminho", diz a empresa em comunicado.

COMPULSÃO EQUIVALE A DEPENDÊNCIA?

Por muitos anos, a comunidade científica geralmente definiu a dependência em relação a substâncias, como drogas, e não a comportamentos, como jogos de azar ou uso da internet. Isso mudou gradualmente. Em 2013, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, referência oficial para condições de saúde mental, introduziu a ideia de dependência de jogos na internet, mas afirmou que mais estudos eram necessários antes que a condição pudesse ser formalmente declarada.

Um estudo subsequente explorou a ampliação da definição para "dependência da internet". O autor sugeriu explorar ainda mais os critérios diagnósticos e a linguagem, observando, por exemplo, que termos como "uso problemático" e até mesmo a palavra "internet" estavam abertos a interpretações amplas, dadas as muitas formas que as informações e sua entrega podem assumir.

Michael Rich, diretor do Laboratório de Bem-Estar Digital do Hospital Infantil de Boston, disse que desencorajava o uso da palavra "dependência" porque a internet, se usada de forma eficaz e com limites, não era apenas útil, mas também essencial para a vida cotidiana. "Prefiro o termo 'Uso Problemático de Mídias na Internet'", diz ele sobre um termo que ganhou destaque nos últimos anos.

Greenfield concorda que claramente existem usos valiosos para a internet e que a definição de quanto o uso é demais pode variar. Mas ele diz que também há casos claros em que o uso excessivo interfere na escola, no sono e em outros aspectos vitais de uma vida saudável. Muitos jovens consumidores "não conseguem largar", diz ele. "A internet é uma seringa gigante, e o conteúdo, incluindo as redes sociais como a Meta, são as drogas psicoativas."

Hélio Schwartsman - Boas intenções, FSP

 


Numa tentativa de generalizar as ideias de Darwin para a economia e a sociologia, Herbert Spencer cunhou a expressão "survival of the fittest" (sobrevivência dos mais aptos), que se tornou o lema do darwinismo social. Nunca houve muita base científica para esse movimento, mais bem descrito como uma ideologia que buscava legitimar diferenças sociais e raciais. Nos últimos anos, porém, vêm ganhando corpo hipóteses que afirmam o exato oposto do darwinismo social —e elas parecem estar calcadas em ciência de boa cepa. Para essa corrente, foi a cooperação e não a competição que deu o tom da evolução humana (e da canina e da dos bonobos).

A ilustração de Annette Schwartsman, publicada na Folha de São Paulo no dia 5 de novembro de 2023, mostra dois homens de Neandertal, usando peles e segurando lanças de pedra lascada e ossos de animais, que estão amistosamente abraçados
Ilustração Annette Schwartsman

"Survival of the Friendliest" (sobrevivência dos mais amigáveis), de Brian Hare e Vanessa Woods, é um ótimo livro que tenta demonstrar essa tese. O casal sustenta que o principal diferencial entre o Homo sapiens e outros hominínios que acabaram extintos foram a intencionalidade comunicativa e a atenção conjunta. Elas nos tornaram mais inventivos (melhores armas) e mais cooperativos, permitindo que vivêssemos em comunidades maiores do que as de algumas dezenas de membros de uma mesma família, que era provavelmente o tamanho dos grupos de neandertais.

A chave para a melhor comunicação foi, segundo Hare e Woods, a autodomesticação. É aí que o casal nos guia num fascinante passeio pela interface entre biologia e dinâmicas sociais em espécies tão distintas quanto humanos, cães e bonobos, à luz principalmente do célebre experimento de Dmitri Belyaev, que transformou raposas selvagens em animais dóceis e cooperativos. O segredo? Selecionar pela docilidade, o que produz uma cascata de características biológicas, incluindo a intencionalidade comunicativa e a atenção conjunta.

Ao contrário de outros primatas como o chimpanzé, humanos conseguimos ler não só as más intenções de nossos semelhantes mas também as boas. E isso faz toda a diferença.